quinta-feira, março 28, 2024

Crítica | Malasartes e o Duelo com a Morte – superprodução nacional

Senhor dos Anéis Tupiniquim

Baseado em obras do folclore brasileiro, embora seja um personagem tradicional de toda a Península Ibérica, Pedro Malasartes tem uma origem tão antiga que se torna quase impossível recapitula-la. É dito que suas primeiras menções foram nos séculos XIII e XIV, não em literatura, mas na cantiga 9418, do Cancioneiro da Vaticana. Ao longo dos anos, o personagem foi sendo adaptado para a literatura, em obras de diversos autores.

É de se estranhar, no entanto, que um personagem tão famoso historicamente nunca tenha feito a transição para a mídia do cinema, até agora. Aparentemente, o motivo foi o uso de efeitos, já que somente agora o Brasil tem um departamento técnico avançado o suficiente para tirar das páginas a parte de fantasia que envolve esta história de Malasartes. O fato deixou o roteiro engavetado, desde meados da década de 1980. De acordo com informações da própria distribuidora, mais de 50% das cenas utilizaram efeitos visuais.

Por falar em roteiro, Paulo Morelli (também o diretor do longa) confecciona uma história inédita envolvendo o personagem, pelo qual se apaixonou ao pesquisar sobre figuras do folclore brasileiro. Esse universo pelo qual Morelli se diz apaixonado, o mundo rural que vai desaparecendo em prol da urbanidade, a figura do caipira ingênuo, mas malicioso e esperto o suficiente, é justamente o que o autor entrega em seu filme.

Malasartes e o Duelo com a Morte se divide em dois filmes que tentam intensamente conversar entre si. Seguindo de perto a cartilha de obras clássicas que misturam realidade e fantasia, cujo maior exemplo é O Auto da Compadecida (1955), de Ariano Suassuna, o primeiro filme de Malasartes bebe desta fórmula, a chamada literatura de cordel. Temos como protagonista, um homem humilde, que vive de golpes e faz muito bem às vezes de ambos João Grilo e Chicó. E temos também personagens sobrenaturais, como a Morte em pessoa.

Na trama, Pedro Malasartes (Jesuíta Barbosa), escapa de uma situação atrás da outra, conhecido como trapaceiro em sua pequena cidade. Um de seus mais ferrenhos cobradores é Próspero (Milhem Cortaz), o valentão local, cuja irmã Áurea (Isis Valverde) está, secretamente, enamorada pelo protagonista. A história toma contornos fantásticos quando a Morte em pessoa (Júlio Andrade) pretende enganar Malasartes, para que este assuma seu lugar – já que o sujeito é considerado o único capaz de derrota-la em um duelo de esperteza.

Malasartes é um filme doce e inocente, que parece realmente não ter sido afetado pelas mazelas do mundo. Parece existir num universo à parte, sem mesmo fazer uso do teor mais ácido presente, por exemplo, na citada obra de Suassuna ou nos filmes iniciais dos Trapalhões (que somente com o tempo começaram a ficar mais politicamente corretos). Malasartes é ingenuidade pura, um filme mirado para toda a família, beirando o gênero infantil. Um filme para os tempos de hoje, no qual tranquilamente pode-se levar os filhos menores, sem restrições de idade. Os únicos trechos mais maliciosos presentes na persona do protagonista são as olhadas e a paquera que tenta com a morena que passa sempre nas horas erradas.

Não deixe de assistir:

Os efeitos especiais são um chamariz e parecem ser o carro chefe do filme. Sem dúvidas é uma conquista para o cinema nacional, poder criar pela primeira vez algo dentro dos moldes e impulsionar o cinema de gênero – com a possibilidade de algo assim ser utilizado em outros tipos de filme. Realmente impressiona, em especial a forma como o além mundo é retratado, com as velas que contam os anos de vida de cada pessoa na Terra.

Curioso notar também o peso do elenco renomado, assim como o diretor aqui, mais acostumados a trabalhar em dramas intensos do cinema independente. Jesuíta Barbosa (Praia do Futuro), Milhem Cortaz (O Lobo Atrás da Porta), Júlio Andrade (A Estrada 47) e até mesmo Luciana Paes (Sinfonia da Necrópole), que interpreta uma das três entidades trapaceadas pela Morte, demonstram grande abrangência de atuação, lidando aqui com caricaturas e situações teatrais. Morelli, que levou o prêmio no Festival do Rio 2013 pelo drama Entre Nós, o qual dirigiu ao lado do filho Pedro Morelli (Zoom), se sai bem no comando de uma superprodução, conseguindo atingir a nota desejada, e entregando um produto extremamente vendável.

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