Já se passaram 10 anos desde que o mundo conheceu a trama misteriosa de ‘Cloverfield’, filme de suspense estilo found footage que marcou uma geração de fãs apaixonados pelo gênero e estabeleceu um jogo virtual que manteve as pessoas vidradas até os dias de hoje.
Como tudo que faz sucesso sempre retorna, demorou alguns anos (mais precisamente oito anos) para que ‘Rua Cloverfield, 10’ chegasse de surpresa e junto trouxesse de volta um suspense visceral, com referencias ao filme original, mas que caminhava por si só e apresentava uma trama consistente. Tornando-o um dos melhores thrillers de 2016.
E como o fator surpresa é o carro chefe da franquia, eis que surge antes do previsto ‘The Cloverfield Paradox’, longa que serve como a terceira parte da história. Mas, como podemos ver, nem sempre surpresas são boas.
A trama, que já havia sido revelada há algum tempo, (algo que pesa negativamente comparado aos dois filmes anteriores, que mantiveram seu enredo em sigilo total até o seu lançamento) se passa em 2028, quando a falta de combustíveis fez com que a humanidade usasse um recurso radical, enviando uma estação batizada de Cloverfield para o espaço carregando um acelerador de partículas com a potencialidade de criar energia ilimitada, mas também o risco de criar um rasgo no tempo-espaço e trazer criaturas para o planeta Terra. E para a surpresa de todos (ou não), o filme não vai além disso.
Nada surpreende. O roteiro fraco, escrito pela dupla Oren Uziel e Doug Jung, tenta a todo custo encaixar a trama dentro da franquia, coisa que nunca havia sido uma preocupação anteriormente, tornando-o dependente de explicações e argumentações desnecessárias. Tudo é muito exagerado, mesmo que esteja lidando com múltiplos universos e realidades paralelas, a complexidade faz a trama se afastar do mistério primordial e cair em todos os clichês da ficção científica, perdendo assim a magia e o suspense.
E o que seria de ‘Cloverfield’ sem o fator mistério? É o suspense que marcou a franquia, e aqui ele existe apenas como pano de fundo. Os personagens rasos não emocionam e não nos cativam, com exceção da Gugu Mbatha-Raw, que possui um arco interessante e crescente, e isso para não falar do núcleo que se passa na Terra, onde o marido da protagonista precisa se salvar e ajudar uma menina em meio ao caos de uma possível “guerra”. Nem mesmo o alivio cômico vivido pelo talentoso Chris O’Dowd sustenta, muitas piadas em momentos inapropriados (como a infame cena do braço, que serve ridiculamente de deus ex machina!) tiram a tensão do filme quando, na verdade, ela deveria ser sustentada.
Outros pequenos detalhes do roteiro incomodam, como o fato de todos falarem o idioma inglês, exceto a personagem Tam, vivida pela atriz Ziyi Zhang, que fala chinês e todos parecem entender muito bem. Por que então não falar uma língua em comum?
Somos o tempo todo levados a expectativa de ver o famigerado monstro novamente ou de ver conexões com os filmes anteriores, porém nos frustramos com a ausência de significado em cenas que parecem ter sido inseridas apenas para justificar ‘Cloverfield’ no título. Brincar com a desejo do espectador é bom, mas precisa compensar, senão a sensação é de enganação no final.
Se por outro lado há pequenos easter eggs aqui e ali, uma trilha empolgante (feita pelo ótimo Bear McCreary), um cenário bem construído e uma preocupação da direção, comandada por Julius Onah, em fazer um grande filme, o projeto foi visivelmente afetado por inúmeros problemas, levando-o a ser comprado pela Netflix, cancelando assim sua estreia nos cinemas. São poucos os momentos memoráveis, como a cena em que uma estranha personagem aparece misteriosamente na estação espacial. Poucas pitadas de surpresa se perdendo em um turbilhão de acontecimentos desempolgantes e tentativas de assustar no melhor estilo ‘Alien’.
E como se não bastassem os furos de roteiro, que misturam dimensões diferentes em uma confusão de planetas, justificando a existência de duas Terras, monstros e “demônios”, na tentativa de encontrar uma origem para todos os acontecimentos anteriores, sendo que em nenhum momento da franquia ficamos cientes da tal crise de energia que colocou o planeta em colapso. Tudo é feito com certa grandiosidade, quando na verdade a simplicidade era o caminho mais lógico a ser seguido.
O resultado final de ‘The Cloverfield Paradox’ é uma desordem, mesmo que os últimos cinco segundos (literalmente!) mostrem o que todos gostaríamos de ver desde o início, o filme se perde dentro de sua própria complexidade e não faz nada de inovador, tanto para o gênero quanto para a franquia em si, afinal, outros filmes como ‘Vida’ (2017) já fizeram coisas muitos semelhantes.
Não chega a ser um filme ruim em sua maioria, mas é um desperdício, afinal a trama tem a supervisão do renomado J.J. Abrams, que retornou como produtor, o que faz questionar como deixou algo tão fraco levar o famoso nome de ‘Cloverfield’. Talvez o melhor seja colocar esse projeto em um universo paralelo, considerar apenas o que foi visto anteriormente e esperar que ‘Overlord’, o quarto filme dentro desse universo, volte às raízes.
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