O que faz de um filme ruim? Embora ruim e fracasso sejam conceitos diferentes, podemos apontar três condições aplicáveis em tais casos. A primeira é nosso gosto particular, que verdadeiramente independe de qualquer outro fator externo. Num aspecto menos pessoal, existe a avaliação crítica, realizada pela imprensa. Este conceito é mutável de época em época, já que a história nos apresentou fracassos de crítica que adquiriram status de cult, ganhando ao longo dos anos seus apreciadores. Tudo que necessita é um argumento forte o suficiente que convença e se sustente.
Mas o que não muda é o que usaremos como base para esta matéria – assim como temos feito com todas os itens desta coluna. E ele é o fracasso de bilheteria. Tudo bem que o mercado de vídeo impulsionou certos filmes que haviam passado batido nas salas de cinema, em especial durante os anos 1980, e hoje em dia temos a Netflix, que vive nos surpreendendo com seus filmes do top 10 – dentre os quais em tempos recentes apareceram obras como Férias Frustradas (2015), por exemplo, que nas telonas não venderam ingressos suficientes. Tal sobrevida, no entanto, não desfaz seu fiasco inicial – já que em sua estreia, que é o que importa para os realizadores, não atingiu o esperado.
Pensando nisso, e como forma de promover uma segunda chance a tais filmes (alguns esquecidos, outros odiados), o CinePOP resolve dar uma nova olhada em mais um grupo de dez filmes, que não tiveram sorte ao serem lançados nas telonas. Estes, completando agora 13 anos de sua estreia. Veja abaixo e não esqueça de comentar.
O Turista
Considerado um dos pontos baixos do cinema no início da década passada, o filme que reuniu os astros Johnny Depp e Angelina Jolie (então no auge de sua popularidade) consta com 20% de aprovação no Rotten Tomatoes. Apesar do pouco apreço angariado pelo filme desde seu lançamento, curiosamente ele não foi indicado para o prêmio Framboesa de Ouro, e ainda levou indicações em uma boa premiação, o Globo de Ouro, com nomeações para Depp, Jolie e o filme – é claro que o fato virou motivo de piada na época. Sorte igual não teve o diretor alemão Florian Henckel von Donnersmarck que, saído do sucesso A Vida dos Outros (2006), só voltaria a filmar oito anos depois de O Turista. Algumas feridas demoram a sarar.
Depp. Jolie. Veneza. Uma trama de espionagem. O que poderia dar errado? Uma das acusações foi a falta de química entre os protagonistas. Seja como for, O Turista exigiu da Sony/Columbia o absurdo orçamento de US$100 milhões, recuperando em bilheteria somente um pouco mais da metade disso, com US$67 milhões em caixa nos EUA. Novamente, o mercado internacional teve que sair ao resgate, equilibrando um pouco as coisas para o filme. Mas o estrago já estava feito.
O Último Mestre do Ar
Começamos enfiando o dedo na ferida. Ah, M. Night Shyamalan, gostamos tanto de você e de seus filmes iniciais. Travar uma guerra com os críticos pode ser uma batalha perdida – e é o que tem feito gente como Adam Sandler, por exemplo. Desde a recepção morna de A Vila (o filme mais subestimado de sua carreira), Shyamalan iniciou uma batalha com os avaliadores, inclusive “matando-os” de forma cruel em A Dama na Água (2006) – um conto de ninar que contava para os filhos. E por falar neles, eles foram a razão do envolvimento do diretor com esta adaptação de um desenho de sucesso em versão live action. Os filhos do cineasta eram fãs do material, e assim o paizão decidiu presenteá-los. A pergunta que fica é: será que eles gostaram?
A principal diferença que os fãs notaram foi a exclusão de qualquer humor. O filme de Shyamalan é sisudo, sombrio e excessivamente dramático – sem qualquer alegria, uma das qualidades da série animada. Porém, ao contrário do que se possa imaginar, O Último Mestre do Ar não foi um fracasso retumbante, muito devido ao mercado internacional sólido que temos hoje – que impede muitos fiascos de se tornarem um rombo financeiro para o estúdio. Assim, a Paramount e a Nickelodeon não ficaram totalmente no prejuízo. Com um orçamento inflado de US$150 milhões, a produção não chegou a se pagar nos EUA, arrecadando US$130 milhões por lá. O que salvou foram os US$188 milhões arrecadados ao redor do mundo. No entanto, ainda ficando bem longe do planejado.
Zona Verde
Como no item acima, muitas vezes os executivos de estúdios partem do pensamento de repetir o “time que está ganhando”. Foi assim com a citada parceria entre Nicolas Cage, a Disney e Jon Turteltaub, e foi assim também aqui, com Matt Damon, o diretor Paul Greengrass e a Universal Pictures, responsáveis pelo sucesso da franquia Bourne. Tais elementos eram reprisados neste Zona Verde, visando guardar na garrafa um segundo raio como sua fórmula de sucesso. Nem mesmo do gênero a obra saiu, já que este é igualmente um thriller de espionagem político, com Damon batendo de frente com seus superiores de agência. E você, já tinha ouvido falar sobre o filme?
O que não conseguiram fazer igual foi o desempenho do longa, que logo caiu no esquecimento – e talvez tenha sido mesmo essa a vontade dos envolvidos. Porém, apesar do público não ter comparecido, Zona Verde não é um filme ruim, e tem uma avaliação mediana dos críticos. Mas, como dito, o que conta aqui é seu desempenho financeiro. Assim, com um orçamento de impactantes US$100 milhões, Zona Verde passou em branco nos cinemas dos EUA, fazendo uma bilheteria de US$35 milhões. Pelo mundo arrecadou quase US$120 milhões, o que foi melhor, mas o filme mal conseguiu se pagar.
O Aprendiz de Feiticeiro
A Disney também quer vir brincar e entrar na nossa lista dos fracassos de bilheteria. Como sempre dizemos aqui, nenhum estúdio é à prova de falhas, nem mesmo a toda poderosa casa do Mickey. É mais do que normal as famosas escorregadas. E aqui foi justamente o que ocorreu com esta reunião de elenco e equipe do sucesso A Lenda do Tesouro Perdido (2004). O “Código Da Vinci” da Disney trouxe Nicolas Cage e o diretor Jon Turteltaub colaborando e o sucesso foi tanto que reprisaram a dobradinha na continuação de 2007. Porém, quando foi a vez da trifeta, algo saiu do trilho.
O filme é uma espécie de adaptação de um dos segmentos do clássico Fantasia (1940) no qual Mickey veste as roupas de mago, com direito até mesmo às vassouras no cômodo inundado. O “Mickey” da vez é Jay Baruchel e Nicolas Cage é o mestre feiticeiro. Para a “brincadeira”, o estúdio desembolsou extasiantes US$150 milhões de orçamento e viu de volta nos EUA, apenas US$63 milhões. Com a bilheteria internacional, o longa conseguiu ao menos se pagar – mas se mantendo bem longe do planejado.
Jonah Hex – Caçador de Recompensas
O que, você pergunta? Sim, este filme caiu no anonimato, mas ele era uma grande aposta de uma adaptação de quadrinhos da DC Comics (sim!) e, foi lançado nos cinemas. Ao menos nos EUA. Na lista, já falamos de produções da Paramount, Sony, Disney e Universal. Quem está faltando? Ah sim, a Warner, que recentemente anunciou todo seu acervo de filmes de 2021 diretamente no streaming de sua propriedade, a HBO Max. Bem, se pudessem voltar no tempo, certamente iriam querer lançar este Jonah Hex direto na plataforma, assim talvez o estrago fosse menor.
Como dito, adaptação dos quadrinhos de faroeste e fantasia da DC, Jonah Hex conta a história de um pistoleiro voltando dos mortos com o rosto deformado para se vingar de seus desafetos. E não pense você que esta é uma produção B do cinema, já que protagonizando temos ninguém menos que o Thanos da Marvel em pessoa, Josh Brolin. Ao seu lado, a então musa mais “baixada” da internet, Megan Fox – você lembra dela? Jonah Hex teve um orçamento de US$50 milhões, mas só rendeu em bilheteria um quinto disso, com US$10 milhões, sequer conseguindo se pagar e entrando no hall das “bombas” homéricas de Hollywood.
As Viagens de Gulliver
E pensar que a atriz Emily Blunt deixou de participar como a Viúva Negra em Homem de Ferro 2, cedendo seu lugar para Scarlett Johansson, devido ao compromisso com este filme. Bem, se o mundo não é justo, a indústria do cinema apenas reflete isso. Entre mortos e feridos, Blunt sacudiu a poeira e deu a volta por cima, conseguindo firmar sua carreira e se tornar uma estrela de muito prestígio. Mas sim, ainda a queremos em algum filme de heróis, de preferência da Marvel. Aqui, ela estrela para a Fox – um estúdio que ainda não havia sido mencionado -, neste veículo infantil para o humorista Jack Black.
Uma reimaginação do clássico literário de Jonathan Swift, o filme traz Black como um canastrão perdedor, se tornando náufrago e descobrindo uma civilização monárquica, onde todos os cidadãos são minúsculos como polegares. No meio deles, está a princesa vivida por Emily Blunt. As Viagens de Gulliver é inofensivo, bem, menos em seu orçamento, já que custou ao estúdio a “bagatela” de US$112 milhões – um dos mais inflados do ano. Como resposta, o público nos EUA virou as costas, rendendo em bilheteria apenas US$42 milhões. Novamente aqui, o longa era salvo pelo mercado internacional, que dobrou seu valor de produção.
Zé Colmeia – O Filme
Por falar em filmes infantis, esta foi uma produção que caiu rapidamente no esquecimento, sendo pouco comentada hoje em dia – com muitos sequer sabendo de sua existência. Tentando recriar o sucesso de adaptações da Hanna-Barbera como Os Flintstones (1994) e Scooby-Doo (2002), chegava há dez anos o primeiro (e último) live action do urso comedor de cestas de piquenique e seu fiel escudeiro baixinho: Zé Colmeia e Catatau. Para dublar as animações criadas em CGI, Dan Aykroyd e Justin Timberlake cediam as vozes dos ursos grande e pequeno respectivamente.
Com produção da Warner, Zé Colmeia almejava um sucesso no feriado de fim de ano, mas logo viveu para ser massacrado pela crítica, com irrisórios 13% de aprovação da imprensa especializada. Em termos de bilheteria, seu destino não foi muito diferente, não emplacando como deveria com a criançada. Porém, dentre os itens desta lista, Zé Colmeia é um dos mais “bem sucedidos”, já que ao menos conseguiu se pagar e se saiu relativamente bem no mercado internacional. Mesmo assim, não foi o suficiente para receber sinal verde em uma continuação. Com um orçamento de US$80 milhões, o filme rendeu US$100 milhões nos EUA, ficando quites com o gasto.
Os Perdedores
Agora temos um título que condiz com o tema desta lista e com o conteúdo de seu longa. Aqui, voltamos ao tópico das adaptações de quadrinhos, e novamente nos deparamos com um selo da DC Comics. Com o cacife de ter roteiristas do porte de Peter Berg e James Vanderbilt, Os Perdedores fala sobre uma equipe especial do governo, tipicamente envolvida em “missões suicidas”, que são traídos por seus superiores, se tornando renegados e agindo por conta própria. Ou seja, uma mistura de quadrinhos com o seriado Esquadrão Classe A – que no mesmo ano ganhava adaptação para as telonas também.
E sendo esta uma adaptação da DC, é claro que por trás bancando teríamos a Warner, que desembolsou US$25 milhões (um valor até modesto) e escalou gente como Zoe Saldana, Chris Evans e Idris Elba (que depois se bandearam para a Marvel) para protagonizar. Mesmo contando com um valor de produção de pequeno porte, Os Perdedores não teve força suficiente para sequer se bancar, arrecadando nos EUA US$23 milhões, e apenas mais US$6 milhões mundiais. No Brasil, sendo lançado direto em vídeo. Você conhecia?
Burlesque
Com minguados 37% de aprovação da imprensa, este musical tem a pecha de juntar em tela duas divas de gerações distintas: Christina Aguilera (em seu primeiro trabalho no cinema) e a veterana Cher – ambas donas de vozeirões graves. Apesar do pouco apreço da crítica e fãs (com Cher sendo inclusive indicada para pior atriz no Framboesa de Ouro), o longa conseguiu emplacar no Globo de Ouro, com três indicações, incluindo melhor filme. A Verdade é que Burlesque não tem nada de Burlesco, sendo um musical bem comportado e beirando o juvenil.
Produção da Sony/Columbia, Burlesque contou com um orçamento avantajado de US$55 milhões, para o padrão do gênero. Assim, o público não ligou muito de ver as musas nas telonas – já que Aguilera havia feito sucesso mesmo dez anos antes. O filme terminou sua carreira nos cinemas dos EUA com um total de US$39 milhões em bilheteria. O que salvou, por pouco, foi o mercado internacional – que ajudou com pouquinho mais da metade deste valor.
Como Você Sabe
Hoje, Reese Witherspoon se reinventou como estrela irretocável, empoderando e inspirando mulheres no cinema e no mercado do audiovisual em si. Vendo que não haviam bons papeis sendo oferecidos, ela fundou sua própria produtora e emplacou um sucesso atrás do outro na TV com programas como Big Little Lies, Pequenos Incêndios e Morning Show. Antes, no entanto, Reese passou por uma epopeia e talvez tenha sido filmes como este Como Você Sabe que a fizeram correr atrás e pegar as rédeas da própria carreira. E para completar, o longa ainda foi o responsável por “aposentar” o monstro Jack Nicholson, sendo o último de sua carreira, até o momento.
Quando acerta, o cineasta James L. Brooks, diretor do filme, entrega obras como Melhor é Impossível (1997). Mas quando erra, pode realizar produções melancólicas e enfadonhas, como é o caso deste filme, mais doloroso do que topada na unha. Dono de 31% de aprovação da imprensa, essa “ida ao dentista” contou com um embasbacante orçamento de US$120 milhões (aonde o dinheiro foi?), pagos pela Columbia/Sony. É claro que essa brincadeira não iria dar certo, e como resultado, Como Você Sabe retornou somente US$30 milhões nos EUA e mais US$18 milhões ao redor do mundo. Chegando em nosso país direto em vídeo. No filme, Reese vive uma mulher dividida entre um sujeito egocêntrico e insuportável (Owen Wilson) e um perdedor azarado compulsivo (Paul Rudd). Um verdadeiro achado, certo, meninas? Só não temos mais pena dela, porque acabamos sofrendo mais ao assistir este longa.