HUMANIZAR SEM VITIMIZAR
O terceiro filme da argentina Lucía Puenzo possui narrativa ágil e enxuta. Wakolda enfoca o período no qual o médico Josef Mengele (Alex Brendemühl) esteve refugiado na Argentina. Com identidade falsa, ele conseguiu fugir para o Paraguai até morrer em Bertioga, Brasil…
Wakolda (nome de uma boneca) narra a relação de Mengele com a família da pequena Lilith. Filha de mãe alemã e pai argentino, Lilith é a narradora. Por seus olhos inocentes, vemos Megele usando os membros dessa família como cobaias em sua busca pela pureza e perfeição.
Falar de um sujeito que praticou experiências com seres humanos nos campos de concentração é um duplo desafio. Primeiro, para não recair na caricatura. O caminho simples é tratar figuras do naipe de Mengele como um demônio. O outro desafio é não vitimizar uma figura como ele. Em se tratando de nazismo, esse último desafia é mais tranquilo, afinal, não é fácil tornar vítima um grupo que cometeu algumas das maiores atrocidades da história humana.
Assim, Lucía Puenzo consegue criar um Mengele esférico, que realmente parece um ser humano real, com defeitos e qualidades. É possível reconhecê-lo como uma figura verossímil sem esquecermos de seu lado cruel. Ganhamos duplamente com isso. Primeiro, porque nos lembramos da banalidade do mal. A maldade não nasce de monstros, mas de sujeitos normais. A segunda vantagem, lembrar aos cineastas brasileiros de que, para humanizar um criminoso, não é preciso transformá-lo em vítima.
Nota: Nesta quinta, dia 07 de novembro, é o último dia da Repescagem da Mostra de São Paulo.