Antes de se tornar uma das atrizes mais aclamadas de sua geração – o que é reiterado por suas duas vitórias como Melhor Atriz no Oscar -, Emma Stone foi protagonista de uma das melhores comédias românticas do século: ‘A Mentira’.
Dirigido por Will Gluck (mesmo nome por trás da adorada comédia ‘Todos Menos Você’), a narrativa é livremente baseada no clássico romance ‘A Letra Escarlate’, de Nathaniel Hawthorne, e acompanha Olive Penderghast (Stone), uma jovem garota que está no último ano do Ensino Médio e que ainda não perdeu a virgindade. Porém, após um fim de semana passado em casa ao lado dos pais, ela retorna para a escola e mente para sua melhor amiga, Rhiannon (Aly Michalka), sobre ter se envolvido com um rapaz mais velho e ter transado pela primeira vez. O que ela não imaginava é que uma mentira inocente se transformaria em um dos maiores escândalos da escola – manchando sua reputação impecável e transformando-a na “prostituta” do colégio.
Após se tornar alvo de Marianne (Amanda Bynes), líder do grupo cristão da escola, e ser taxada como uma vagabunda, Olive resolve fazer valer a pena a mentira e passa a mentir sobre ter relações sexuais com inúmeros caras, mudando por completo seu visual apenas para sustentar uma fachada de pertencimento que, uma hora ou outra, irá se desmoronar bem à sua frente. Navegando pelas tribulações da adolescência e apenas desejando ter alguém que realmente queira ao seu lado – neste caso, Todd (Penn Badgley), o mascote do time de basquete -, a protagonista vê seu cotidiano virar de cabeça para baixo até compreender o que deve fazer para retornar a uma suposta normalidade.
Dizer que ‘A Mentira’ é uma das melhores rom-com adolescentes do século, como mencionado no primeiro parágrafo, não é um exagero – e isso é comprovado por uma série de fatores. A princípio, temos o trabalho espetacular feito por Gluck e pelo roteirista Bert V. Royal em trazer um dos clássicos da literatura à contemporaneidade, abrindo espaço para uma história extremamente relacionável com a geração millenial em uma narrativa simples e funcional. Porém, a dupla não faz isso de forma apenas a copiar o livro de Hawthorne, mas sim mantendo os importantes temas à medida que os pincela com uma roupagem atualizada – e sabendo dosar a comédia, o drama e o romance de maneira aplaudível. Como se não bastasse, é clara a bagagem cultural que Gluck e Royal carregam, prestando homenagens a títulos como ‘As Patricinhas de Beverly Hills’, ‘Meninas Malvadas’ e ‘10 Coisas que eu Odeio em Você’, mas sem perder a própria originalidade.
Se o time criativo investe esforço e comprometimento nessa produção, ousando sair das fórmulas do gênero sem renegá-las por completo, é o elenco quem surge como a cereja do bolo. Badgley, Michalka e Bynes rendem-se de corpo e alma aos personagens que interpretam, divertindo à medida que seus arcos se desenrolam, enquanto a presença bem-vinda de nomes como Thomas Haden Church, Lisa Kudrow, Patricia Clarkson e Stanley Tucci enfeitam as telas com performances apaixonantes e que servem de guia para os atores mais jovens. Porém, a verdadeira estrela do filme é Stone: seja na icônica cena em que se vê engolfada pela música “Pocketful of Sunshine”, seja nos momentos em desata a falar tudo o que deseja após ficar quieta, seja quando resolve ajudar seu melhor amigo gay a parar de sofrer bullying na escola, a atriz é um deleite em cada uma das sequências e, na opinião deste que vos escreve, merecia uma indicação ao Oscar por uma entrega nada mais que irretocável.
Um dos aspectos mais emblemáticos que o filme carrega é seu legado e de que forma mudou o cenário do gênero que explora. É óbvio que, como supracitado, o projeto bebe de títulos que vieram antes – mas também é claro como, anos depois, diversas produções apostaram em uma irreverência estética e narrativa de modo similar. Tivemos, por exemplo, ‘Quase 18’, estrelado por Hailee Steinfeld; ‘Com Amor, Simon’, protagonizado por Nick Robinson; e ‘D.U.F.F.’, que trouxe Mae Whitman às telonas – apenas para citar alguns que aproveitaram essa “rebeldia” cênica para conquistarem o público.
Catorze anos depois de sua estreia, ‘A Mentira’ permanece como uma ótima escolha para assistir a qualquer momento – seja em um âmbito mais nostálgico, seja para conhecer títulos que mereciam mais reconhecimento do que tem. Todas as engrenagens desse impecável longa funcionam do começo ao fim e nos levam a refletir conforme navegamos por uma jornada de amadurecimento e de autoconhecimento que, mesmo em 2024, mostra-se indispensável.