O primeiro Street Fighter e o cenário da época
Algumas obras surgem e marcam para sempre as mídias em que foram lançadas, a exemplo de Star Wars que solidificou nos cinemas o que chamamos de blockbuster, retrabalhando o gênero da ficção cientifica e dando um tom mais pop e pulsante ao estilo, vide os efeitos a frente do seu tempo e personagens marcantes como Luke Skywalker e Darth Vader; ou propriamente os Beatles, a lendária banda inglesa que redefiniu a história da música fazendo diversas experimentações e explorando conceitos pouco vistos antes.
Da mesma maneira, Street Fighter II chacoalhou a indústria dos games e foi o principal fator para que a vertente dos jogos eletrônicos virasse de vez a mais lucrativa entre todas as outras quando falamos de entretenimento. Especialmente quando reparamos as infindáveis ramificações que o petardo da Capcom foi capaz de gerar, tanto de forma direta quanto indireta.
Mas até chegarmos em 1991, época que o jogo foi lançado, alguns pontos foram fundamentais para que a Capcom aprendesse o caminho das pedras. A experimentação do gênero dos jogos de luta foi se transformando até que essas características e conceitos conhecidos fossem estabelecidos pelo próprio Street Fighter II.
Muitos consideram o primeiro Street Fighter, lançado em 1987, o primeiro jogo de luta como conhecemos, mas é preciso olhar um pouquinho para trás e observar que títulos como Heavyweight Champ, lançado pela Sega em 1976 para os arcades e trazia um lutador de boxe de forma top Dawn e muito rudimentar, todo em preto e branco; ou até melhor, o caso de Karate Champ ou Karate Dō que saiu nos arcades do Japão em 1984, já era colorido e trazia a perspectiva lateral de dois lutadores se enfrentando.
Já Yie-Ar Kung Fu, que a Konami lançou um ano depois, já traziam conceitos que viraram pilares no gênero: como poder enfrentar outro jogador desafiante, pular, diversificar golpes e, até mesmo, lançar projéteis. Inegavelmente, todos obtusos, pouco intuitivos e ainda tentando desvendar o que estavam fazendo. Pegando muito daquela dinâmica de combate que víamos nos jogos brigas de rua, com perspectivas de tela mais simples.
Foi aí que um sujeito chamado Takashi Nishiyama criou em 1987 um ainda tímido jogo de luta chamado Street Fighter, com a batuta da própria Capcom e a ajuda do parceiro Hiroshi Matsumoto que tinha feito com ele mesmo um ano antes Avengers, que é conhecido no Japão como Hissatsu Buraiken “Deadly Ruffian Fist“, um beat’em up clássico, porém com sua exploração e rolagem vertical.
O primeiro Street Fighter surgiu de uma ideia que Nishiyama teve ao ver as lutas dos chefes no beat em up Kong Fu Master, no qual produziu em 1984, onde além de trazer exploração para vários lados do cenário, diferentes de coisas como Renegade e Double Dragon, os verdadeiros pais dos jogos de briga de rua, Kong Fu Master trazia também duelos especiais com confrontos diretos. Além é claro do já citado Karate Champ e muitos filmes de Bruce Lee que ele via.
Street Fighter até que “refinava” mecânicas antigas e incluía diversas particularidades que se tornariam primordiais no estilo, como as barras de energia para cada personagem, personalidade nas figuras destacadas com um rápido background e golpes especiais que funcionariam através de comandos, que à primeira vista era uma ideia de combate absolutamente inovadora.
Só que cru é a palavra que melhor define o primeiro Street Fighter. Utilizando uma linha de comando muito mais complexa que os concorrentes da época, com dois botões de chute e soco, que funcionava de acordo com a pressão exercida em cima deles, e uma alavanca que combinadas com os botões disparavam os já clássicos hadouken, shoryuken e tatsumaki senpuu kyaku.
Porém tudo isso acontecia na teoria, já que na prática a jogabilidade era de uma precariedade assustadora e exigia muito mais da persistência do jogador que propriamente conhecimento e habilidade para que um daqueles movimentos saíssem. Hoje Street Fighter já pode entrar na escala das produções injogáveis. No entanto é bom lembrar que lá estavam presentes personagens lendários como Ryu, Ken (no qual só poderia ser escolhido através do player 2) e Sagat (o chefão desse jogo). Além daquela velha máxima presente em toda história da franquia de ir ao encontro do mais forte. E obviamente toda trama se passar no torneio Street Fighter.
Apesar de ser considerado um fracasso pela própria Capcom e de terem basicamente abandonado qualquer projeto futuro de Takashi Nishiyama – atitude que fez ele e sua equipe saírem da empresa e migrar para a concorrente SNK, onde lá criariam outra obra singular dos jogos de luta chamada Fatal Fury e futuramente The King of Fighters, podendo assim pôr em prática tudo que planejava para a continuação que faria – Street Fighter trouxe alguns aspectos que interessaram a gigante japonesa, que rapidamente encomendou a sequência da franquia, só que em forma de beat em up, levando o nome de Street Fighter 89’.
Uma vez que naquela época o estilo era febre e não tinha como dar errado. Porém, quando o setor de marketing teve acesso a essa tal nova proposta, viram que aquilo não tina nada a ver com o jogo anterior e mudaram o nome para uma coisinha à toa aí chamada Final Fight. É, quem diria que o maior nome dos ‘briga de rua’ de todos os tempos surgiu meio que sem querer. E com o sucesso instantâneo do Final Fight e as artes marciais bombando nos games, quadrinhos e cinemas, a Capcom decidiu dar mais uma chance a Street Fighter e fazer enfim sua aguardada continuação, agora com novas mentes que iriam repensar as ideias anteriores que eram boas, mas foram mal executadas.
A produção, a trilha sonora e seus personagens
Partindo justamente da premissa de pegar os conceitos do primeiro Street Fighter e torna-los mais agradáveis para um jogo de árcade, além do diretor Yoshiki Okamoto e a dupla designers Akira Nishitani e Akira Yasuda, a Capcom reuniu cerca de 40 pessoas para trabalhar nesse projeto, que teve como produtor o já experiente Noritaka Funamizu, que vinha do sucesso de Mega Man. Para Funamizu, o grande impacto e sucesso imediato de Street Fighter II se deve primeiramente as animações. De fato, sem precedentes para a época.
Onde ele afirma que os desenvolvedores focavam bem mais nesse aspecto do que propriamente no balanceamento dos personagens ou no combate. Muito disso se deve a placa CPS-1, desenvolvida pela Capcom, que permitia armazenar dados com o máximo de volumes naquele momento. Onde, por exemplo, só o personagem Zangief ocuparia 12Mbits, quase o tamanho de todos os personagens juntos do jogo anterior. E ainda trazia a função de incluir diversos lutadores com volumes de dados diferentes, diminuindo e aumentando a hit box, o caso de Ryu que tinha 8Mbits. Naquele tempo se lançava vários jogos por ano, só que Street Fighter II levou cerca de dois anos para ser entregue, era mesmo algo especial.
E aqui a gente abre um adendo sobre mais histórias que o produtor Noritaka Funamizu conta, pois há muitas lendas envolvendo a produção de Street Fighter II, uma delas é que os combos ali não foram criados intencionalmente, que tudo na verdade não passou de um bug que ocorreu sem querer e a Capcom aproveitou o ensejo. No entanto, não é exatamente isso, pois o próprio Funamizu fala que quando revisava o projeto notou que os golpes se conectavam de maneira rápida. E a equipe tentou potencializar os combos em até 6 movimentos, onde no fim das contas os jogadores conseguiram tirar até 8 movimentos. Uma mecânica que acabou virando um dos conceitos centrais nos demais jogos da franquia.
Além disso, um dos elementos mais importantes e emblemáticos de Street Figter II, que se equivale inclusive ao próprio visual, é tudo que compõe o design de som do jogo. A máquina de fliperama que a Capcom lançou, além de ser lindíssima visualmente, com aquele aspecto de painel da NASA, devido a enorme quantidade de botões, a máquina de arcade possuía um som alto e potente.
Em qualquer lugar que você estivesse havia um arcade de Street Fighter II explodindo tudo com sua trilha pulsante e os golpes sendo gritados a cada disparo. Era uma sensação indescritível, quem sentiu isso na época se arrepia quando lembra desses momentos. Não à toa, a genial compositora Yoko Shimomura, criadora de temas musicais como Kingdom Hearts, Super Mario RPG e Parasite Eve, assina a trilha sonora de Street Fighter II e o resultado sabemos hoje. Basta tocar uma canção, seja de qualquer estágio, para ser reconhecida.
E voltando para a comunicação visual do jogo, vamos então embarcar no elenco de personagens. Pode soar como presunção, pedantismo ou qualquer outro adjetivo que você queira colocar, mas, a essa altura do campeonato, podemos dizer que a Capcom atingiu a perfeição na escolha de absolutamente todos os seus 12 lutadores.
Cada um deles acabou se tornando um símbolo, principalmente pelas nações que representam. Não é só o conceito visual que é inspirado, apesar de isso ser extremamente singular, mas os golpes, os movimentos, os estilos de luta e a forma que se movem em tela torna cada uma daquelas figuras únicas. E de maneira absolutamente inédita, a Capcom criou uma lore aprofundada para todos esses lutadores. O que fazia com que as pessoas ficassem curiosas em ver a história de cada um deles após terminar ou zerar o jogo, já que o desfecho trazia mais sobre os competidores do torneio. Algo usado até hoje em diversos jogos.
E já falando desses personagens, ou melhor, desses símbolos, começamos então pelo japonês Ryu, que se por acaso fizessem uma lista dos personagens mais importantes da indústria dos games, ele entraria num Top 5 facilmente. Ryu que foi o campeão no torneio anterior, derrotando Sagat, continua aí sua busca por alguém mais forte do que ele. Ele aparece como o protagonista e possui apenas um ideal: ficar cada vez mais poderoso.
O que nos liga imediatamente a Ken, um amigo de treino que entra pro torneio justamente por Ryu sugerir sua presença. Simbolizando as forças armadas, temos o coronel americano Guile, que trabalha nas forças aéreas dos Estados Unidos e quer derrotar o sujeito que assassinou seu melhor amigo, Charlie (esse que ganha mais espaço no jogo Street Figher Alpha, um prequel que saiu anos depois). Assim como Chun-Li, uma oficial chinesa que é especialista em artes marciais que entra pro torneio a mando da Interpol para descobrir quem matou o seu pai.
Partindo então pro lado mais simbólico de culturas e estilos de luta, temos logo de cara Edmund Honda, um lutador de sumo que chega no torneio para provar que sua modalidade deve ser respeitada como qualquer outra arte marcial. Algo parecido com Zangief, um brutamontes que aparece na competição pra representar seu país de origem, a Rússia.
Já o caso do Dhalsin é diferente, pois, apesar de ser um excelente lutador e mestre de ioga na Índia, quer o dinheiro do prêmio para ajudar sua aldeia que é muito pobre. Ele que carrega caveiras de crianças que morreram de fome por lá e usa isso como uma lembrança dolorida. Já Blanka não se sabe ao certo se o monstro verde que caiu na mata amazônica brasileira quer apenas mostrar seu estilo de luta curioso ou procurar sua mãe, como vemos em seu desfecho no jogo. Sendo esses então os oito primeiros personagens jogáveis.
E o único lamento da época, foi o fato de os jogadores não poderem jogar com o quarteto de chefões que completa a lista de personagens do game, algo rapidamente corrigido em 1992 com a versão já clássica, refinada e muito conhecida Street Fighter II Champion Edition. Além da correção de bugs e outras melhorias de cores, estavam disponíveis agora o pugilista afro-americano Balrog, muito semelhante ao lutador Mike Tyson, fenômeno da época – e aqui cabe outro adendo para aquela velha história, que se você ainda não conhece, saiba que os nomes desses chefes no ocidente foram trocados temendo a produção sofrer qualquer problema de processo judicial envolvendo o próprio Tyson. Porém vale lembrar que ainda hoje o personagem no oriente é chamado de Bison.
Tivemos também o ninja/toureiro/lutador de jaula espanhol Vega (que, nesse caso, seria o nome verdadeiro do chefão Bison, que foi alterado devido o problema do Balrog); temos a volta do tailandês Sagat (dos três chefes, o único que não sofreu alteração em seu nome) que veio pra esse torneio para se vingar de Ryu, responsável pela enorme cicatriz em seu peito. Por fim, o próprio Mister Bison, que no oriente ainda é chamado de Vega. O grande vilão da trama, quer dizer, o maior vilão da saga até hoje e o homem que está por trás da organização Shadaloo e por assim dos assassinatos e os muitos crimes cometidos pela gangue.
Vemos também que, de maneira muito natural, algumas das principais características dos competidores profissionais dos jogos de luta nasceram aí, como, por exemplo, exemplo: os lançadores de projeteis, os mais defensivos, os mais lentos e com maiores danos, os personagens de agarrar, o mais veloz, entre outros tipos. É impressionante como até hoje quase tudo desse jogo é ainda utilizado.
As novidades das mecânicas, conceitos do gênero e suas versões
Nesse ensejo já podemos falar das novidades e os verdadeiros refinamentos das mecânicas. Os golpes outrora quase impossíveis de serem executados foram corrigidos seguindo uma lógica de margem de erros. Onde o jogador não precisava executar com perfeição cada movimento, mas o computador entendia automaticamente através de uma tentativa semelhante qual era o golpe que o player pretendia executar. Além de que os dois botões que definiam a execução do soco e chute fraco, médio e forte, através de pressão, foram substituídos por seis botões, onde cada um teria as finalidades em questão. É preciso destacar também a fluidez de pulos e movimentos que davam ao jogador um melhor aproveitamento de onde levar o seu bonequinho. Todas essas particularidades fizeram com que de fato os jogadores tivessem a sensação de controle total dos lutadores. De novo, algo sem precedentes naquele tempo.
E quando juntamos esses novos artifícios e possibilidades às dinâmicas dos combos já comentados aqui, temos a reunião de basicamente os principais conceitos que dignificam qualquer jogo de luta. A partir desse conjunto de fatores, a versatilidade do gênero só cresceu ao longo do tempo. Você define o que é um fighting game basicamente por ter lá as duas barras de energia, golpes especiais, combos, os botões dos movimentos e os direcionais. É quando o simples se torna acontecimento e tendência.
E se vamos falar de mecânicas, é preciso comentar a respeito das famigeradas versões de Street Fighter II. Como comentado, única crítica que tinham a respeito da primeira versão era o fato do jogador não poder escolher os chefes, algo que foi solucionado no ano seguinte com a versão Street Fighter II Champion Edition, que permitia ter acesso aos quarteto de vilões Balrog, Vega, Sagat e Bison.
O jogo era um sucesso em tudo que era lugar, assim vários donos de fliperamas e curiosos metidos a técnicos mexiam nas configurações dos cartuchos e alteravam das formas mais inusitadas possíveis. Às vezes com alterações mais simples como aumentar a velocidade e dificuldades para que as fichas fossem consumidas rapidamente, ou mesmo criando a possibilidade de soltar magias consecutivamente de uma só vez, surgindo daí os chamados Street Fighter de rodoviária. Isso acontecia não apenas aqui, mas em vários lugares do mundo. O que fez a Capcom rapidamente entrar na disputa e meses depois lançar Street Figther II Turbo, que aumentou a velocidade do jogo e permitiu que alguns golpes pudessem ser executados no ar.
Em 1993, a Capcom lançou mais uma versão chamada Super Street Fighter II, que não apenas aperfeiçoava o sistema de pontuação, dando uma camada a mais em cima dos combos, mas trazia também quatro novos personagens: o ator Fei Long, o índio Thunder Hawk, o carateca jamaicano Dee Jay e a musa Cammy, uma assassina altamente treinada da Shadaloo – e desses quatro, a que mais apareceu nos títulos posteriores. Só que essa versão, apesar de ter trazido essas adições, deixou o jogo mais lento que o da versão anterior, já que exigia mais recursos técnicos. Então, como resolver o problema? Lançando Super Street Fighter II Turbo, claro, a dita versão definitiva Street Fighter II – por sinal, essa versão foi de fato a definitiva, pois a partir dela fizeram várias outras ao longo dos anos como a Hyper, HD Mix e remakes do tipo.
Essa variante, além de dar o dinamismo de antes, trouxe os chamados Super Combos, que podiam ser executados quando a barra de poder, presente no canto inferior do personagem, estava no máximo. Essa mecânica ocorreu devido aos jogos da SNK como Fatal Fury e Art of Fight já possuírem os chamados Desperations Moves ou os Especiais – e vocês lembram do Nishiyama, o criador do primeiro Street Fighter? Pois é, ele já havia dado a volta por cima e começado o seu império, sendo depois influência para a própria Capcom.
Super Street Fighter II Turbo trouxe também a chegada do chefão secreto Akuma, um personagem que nasceu de uma piada de primeiro de abril, ganhou vida própria e não parou mais. Isso aconteceu devido a um erro de tradução entre os ideogramas “sho ryu”, de “shoryuken”, que são os mesmos usados nos kanjis de “Sheng Long” em chinês, o que acabou causando uma confusão entre o pessoal que traduziu o jogo. Eles transformaram a frase de vitória do Ryu que era “Se você não puder superar o shoryuken, você não pode vencer!” em “Você deve derrotar Sheng Long para ter alguma chance”.
Os jogadores ficaram malucos e disseram que o Sheng Long então era um personagem. E vendo o furdunço que isso virou, a revista americana EGM resolveu trollar seus leitores na edição de abril de 1992 e disse que o Sheng Long era sim real e que havia um método para enfrentá-lo no Street Fighter II. Só que era preciso usar o Ryu, chegar à luta final contra Bison sem tomar nenhum dano e deixar a batalha terminar em um empate por 10 rounds seguidos, que aí então Sheng Long, mestre de Ryu e Ken, iria aparecer e sacudir o Bison para fora da tela, começando assim um duelo contra o jogador.
Só que as pessoas fora dali e até mesmo parte da imprensa em outros países não entenderam a piada e saíram republicando a coisa como se fosse verdade. E somente em dezembro daquele ano que os lazarentos da EGM esclareceram a situação. E apesar da brincadeira e do tal Sheng Long ter aparecido no manual do port pra Super Nintendo como mestre da dupla Ryu e Ken, a pegadinha em questão acabou gerando o tal Akuma no Super Street Fighter II Turbo. Lembrando que anos depois, o tal Sheng Long, agora chamado de Gouken, o verdadeiro mestre de Ryu e Ken, apareceu em Street Fighter IV. Isso que é dar asas à imaginação.
A consolidação da franquia no mercado e seu legado
Levando em conta todos aspectos técnicos e artísticos, além do excelente marketing, não demorou muito para que Street Fighter II se tornasse um fenômeno em escala mundial. Se fossemos citar aqui as vendas de todas as versões de arcade e consoles, talvez esse seria o maior vídeo da história do YouTube. Porém dois exemplos imprimem o que esse jogo simbolizou quando falamos de mercado: o primeiro ponto é que na época do seu lançamento, a revista Gameset, em 1992, lançou uma matéria falando que as vendas do jogo no Japão estavam tão sem freio que a escassez dos cartuchos das máquinas fez com que os vendedores chegassem ao ponto colocar o valor sete vezes mais caro que o original, cerca de 120,00 dólares na época. Imagina só, pagar quase mil dólares num cartucho de videogame ali no início dos anos de 1990? Só lembrando que o salário mínimo do brasileiro em 1994 quase não chegava nem a R$ 70,00.
Então, os países emergentes, principalmente os da América do Sul, e os donos de fliperamas deram um jeito de pegar qualquer versão duvidosa, ou basicamente tinham que financiar o troço como se fosse um carro. Mas acreditem, isso valia a pena, visto que num rápido recorte no Reino Unido, território que na Europa detinha 60% do mercado dos jogos operados por moedas, as máquinas de fliperama individualmente arrecadavam mais de 1000 libras por semana, chegando a cerca de 260 milhões de libras por ano, o que convertendo e corrigindo pra inflação atual chegamos a soma de quase 800 milhões de dólares.
Tem também uma nota muito interessante da revista GameFan, na edição de março de 1995, onde é visto que as vendas combinadas de Street Fighter II e Street Fighter II: Champion Edition já excediam 2,3 bilhões de dólares em receita bruta, equivalente hoje a quase 5 bilhões de dólares, corrigindo a inflação. Assim como num artigo do site USGamer intitulado ‘Os Dez Jogos Arcade Mais Vendidos de Todos os Tempos’, as vendas combinadas das máquinas Street Fighter II e Champion Edition ficaram somente atrás de Space Invaders e Pac-Man. Dado esse que segue inabalável. Ou seja, desde seu lançamento, nenhum outro jogo chegou perto de atingir essa marca nos arcades.
E quando vamos falar de consoles, as chamadas versões caseiras do jogo, a coisa é igualmente impressionante. Até onde foi registrado na sétima geração, se tivessem juntado todas as grandes plataformas no que se refere a consoles de mesa de Nintendo, Sega, Playstation e Xbox, Street Fighter II já passaria dos 20 milhões de unidades. Sendo listado novamente entre os games mais vendidos de todos os tempos nos consoles.
Só que Street Fighter II conseguiu um feito que quase não há parâmetro de comparação com outro título dos games quando falamos de transmídia. Talvez Pokémon seja o comparativo mais próximo. Além das inúmeras versões e dezenas de continuações dentro da mídia videogames, e por assim inspirar ou influenciar outras incontáveis franquias do gênero, é realmente impossível conseguir registrar quantos quadrinhos, livros, rpg’s, animações, filmes, roupas, sapatos, brinquedos, comidas, cosméticos, produtos escolares, de cama, mesa, banho foram feitas com o selo da franquia… De verdade, não dá pra elencar aqui nem em quais áreas Street Fighter II foi parar.
Contudo, dá pra citar aqui duas obras fora dos games que chamaram mais atenção naquele período: querendo ou não, o involuntariamente cômico Street Fighter – O Filme, estrelado por Van Damme e cia – e não vamos esquecer do Honda havaiano – conseguiu arrecadar quase 100 milhões de dólares, triplicando assim o seu valor de orçamento.
Pois é, aquela tranqueira deu uma grana dessa, imagina se fosse realmente legal? Mas falando em coisa boa, Street Fighter Victory II é uma das melhores adaptações que já fizeram de um jogo pra uma produção audiovisual de anime. Primeiro porque não seguiram exatamente à risca o game sem precisar colocar os personagens vestidos com aqueles uniformes exagerados – vide a animação americana que segue essa linha. Pelo contrário, construíram uma história interessante e deram contexto a cada um dos personagens, ainda que toda essência dos jogos na série permanecesse viva.
Legado eterno
Por fim, Street Fighter II acabou gerando também em paralelo o prequel Street Fighter Alpha ou Street Fighter Zero no Japão, que se passa entre o primeiro e o segundo jogo da série principal. E aprofundava mais ainda a história de cada personagem e a trama central envolvendo Bison e a Shadaloo. Foram um total de três jogos de grande sucesso que acabou resgatando antigos personagens da Capcom do título original de Street Fighter como Adom, Gen e Birdie, além de criar outros mais novos envolvendo os personagens do segundo como Charlie, o amigo de Guile que havia sido assassinado.
Fora a introdução de Guy e Cody em Street Fighter, personagens esses do já falado aqui Final Fight. Prática que apenas se expandiu nas demais continuações numeradas e spinf offs da série. O que nos faz lembrar da tamanha importância que Street Fighter II teve e toda sua história. É incrível perceber que vidas de milhares de pessoas mudaram direta ou indiretamente por causa deste que é mais que um jogo, é na verdade uma espécie de religião que uniu as mais variadas raças e tribos pelo mundo a fora e jamais será esquecido por nós.