quinta-feira , 21 novembro , 2024

Artigo | ‘Final Space’ é uma incrível animação sci-fi que você precisa conhecer

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Nos últimos anos, a Netflix vem investindo esforços em diversas produções de ficção científica, misturando o gênero com diversos outros espectros narrativos. Tivemos, por exemplo, a subestimada ‘Star Trek: Discovery’ e o thriller ‘Aniquilação’, bem como a recente produção ‘1899’ (que foi cancelada após uma temporada). E, em meio a um mar de títulos que chegam todos os dias à gigante do streaming, um deles provavelmente passou longe do seu radar: a animação Final Space. 

A princípio, é quase impossível delinear qualquer traço narrativo que faça sentido: a cena de abertura da temporada traz um astronauta vagando perdidamente pelo espaço, com apenas dez minutos restantes de oxigênio, já entregue ao seu fatal destino e tendo como única companhia a inteligência artificial de sua antiga nave, a Galaxy One. Momentos depois, somos transportados para um passado não tão distante no qual as coisas passam a ter uma estruturação mais compreensível: o astronauta, na verdade, se chama Gary Goodspeed (Olan Rogers) e cumpre pena como único tripulante da espaçonave em companhia de robôs. A cada dia, ele parece tentar se comunicar com uma espécie de amor perdido, mandando-lhe mensagens em vídeo sem qualquer resposta, mas que mantêm sua sanidade intacta. Ele é vigiado constantemente pelo computador de bordo HUE (Tom Kenny) e pelo irritante auxiliar KVN (Fred Armisen), os quais ama odiar. 



Já no episódio piloto percebemos a total irreverência construída por Rogers e David Sacks, ambos showrunners. Assim como recentes seriados da própria plataforma, a história não é para crianças e busca uma rebeldia transgressora que mantém paralelismos com Rick and Morty’ e BoJack Horseman’, trazendo certas críticas interessantes, mas que infelizmente se perdem ao longo do excesso de fantasia e impossibilidades. No geral, lidamos com uma jornada do herói que emula certos aspectos de famosas franquias de ficção científica (Star Wars’, por exemplo) e que não se preocupa com entregar-se a uma carga dramática catártica. Gary personifica um jovem galã afundado nas próprias metáforas vencidas e que carrega, ao mesmo tempo, uma necessidade de se provar útil para alguma coisa – afinal, seu coração ainda é puro e ele sempre se coloca na frente de todos, ainda que desajeitado. 

Tudo muda de perspectiva quando uma pequena criatura apelidada de Mooncake aparece na Galaxy e traz consigo uma horda de guerreiros malignos que tenta a todo custo sequestra-lo. Entretanto, os tripulantes conseguem vencê-los e mantém o gato humanoide Avocato (Coty Galloway) como refém, tentando arrancar algumas informações. Em meados da primeira parte, o antagonista se transforma em um aliado inesperado, revelando sua verdadeira história e convencendo o nosso herói a ajudá-lo a combater um inimigo muito mais poderoso para resgatar seu filho, Gatito (Steven Yeun). A partir disso, o time de roteiristas passa a fazer escolhas um tanto quanto interessantes para dar continuidade à trama principal e aumentar a complexidade dos arcos apresentados; entretanto, os eventos se desenrolam quase subjugados ao pano de fundo e não abrem brechas. 

Em se tratando de uma série de comédia, narrativas secundárias são importantes para a criação de um ritmo envolvente e frenético, impedindo que o público caia nas ruínas da monotonia. Em grande parte da temporada isso acontece, apesar de alguns deslizes que quebram uma estrutura sólida e nos desligam do universo ao qual somos apresentados. De qualquer modo, os irônicos e propositalmente autoexplicativos diálogos, combinado à química do elenco, conseguem varrer os claros equívocos para debaixo do tapete – e aqui abro um parênteses para uma performance incrível, ainda que um pouco over-the-top, de David Tennant como Lorde Commander, o principal obstáculo a ser enfrentado pelos protagonistas. Além da incrível versatilidade cênica, que compõe cliffhangers angustiantes, os clímaces e viradas são muito bem pontuados e chocantes, e brincam com todas as ideias já exploradas pelo gênero, desde as viagens no tempo até as fendas cósmicas. 

E é claro que o enlace romântico não poderia deixar de existir, e aqui ele insurge na figura da guerreira-cientista Quinn (Tika Sumpter), que parece brotar do nada, mas mantém relações inesperadas com Gary e até mesmo com sua família. Ela é a representação do arquétipo da inteligência e da proteção, que eventualmente entrega a própria vida por uma causa maior e representa um sacrifício não premeditado para a conclusão do arco do herói – o qual, com grande surpresa, não encontra seu fim, mas um gancho assustador para uma futura temporada. 

A animação não ousa mais do que deve e mistura elementos do 2D e do 3D, oscilando entre originalidade e nostalgia, reforçando laços dialógicos com obras clássicas e inclinando-se para a contemporaneidade e o futuro. Mesmo não explorando todo o potencial, a fluidez funciona, principalmente àqueles que procuram uma boa e divertida aventura que entrega o que quer. Os momentos introspectivos se afastam do melodrama desnecessário e preparam terreno para incríveis cenas de ação que satisfazem até os mais céticos espectadores. 

Final Space pode ter seus problemas, mas definitivamente cumpre o seu papel e não força algo além do que pode entregar. Sua premissa é simples, divertido, não se escorando em tramas pretensiosas e, ao mesmo tempo, conseguindo flutuar entre momentos trágicos, hilários, emocionantes e de tirar o fôlego. Uma sequência é mais que aguardada – e muito bem-vinda, ainda mais para fechar algumas pontas que ficaram soltas e nos deixaram bastante angustiados. 

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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A princípio, é quase impossível delinear qualquer traço narrativo que faça sentido: a cena de abertura da temporada traz um astronauta vagando perdidamente pelo espaço, com apenas dez minutos restantes de oxigênio, já entregue ao seu fatal destino e tendo como única companhia a inteligência artificial de sua antiga nave, a Galaxy One. Momentos depois, somos transportados para um passado não tão distante no qual as coisas passam a ter uma estruturação mais compreensível: o astronauta, na verdade, se chama Gary Goodspeed (Olan Rogers) e cumpre pena como único tripulante da espaçonave em companhia de robôs. A cada dia, ele parece tentar se comunicar com uma espécie de amor perdido, mandando-lhe mensagens em vídeo sem qualquer resposta, mas que mantêm sua sanidade intacta. Ele é vigiado constantemente pelo computador de bordo HUE (Tom Kenny) e pelo irritante auxiliar KVN (Fred Armisen), os quais ama odiar. 

Já no episódio piloto percebemos a total irreverência construída por Rogers e David Sacks, ambos showrunners. Assim como recentes seriados da própria plataforma, a história não é para crianças e busca uma rebeldia transgressora que mantém paralelismos com Rick and Morty’ e BoJack Horseman’, trazendo certas críticas interessantes, mas que infelizmente se perdem ao longo do excesso de fantasia e impossibilidades. No geral, lidamos com uma jornada do herói que emula certos aspectos de famosas franquias de ficção científica (Star Wars’, por exemplo) e que não se preocupa com entregar-se a uma carga dramática catártica. Gary personifica um jovem galã afundado nas próprias metáforas vencidas e que carrega, ao mesmo tempo, uma necessidade de se provar útil para alguma coisa – afinal, seu coração ainda é puro e ele sempre se coloca na frente de todos, ainda que desajeitado. 

Tudo muda de perspectiva quando uma pequena criatura apelidada de Mooncake aparece na Galaxy e traz consigo uma horda de guerreiros malignos que tenta a todo custo sequestra-lo. Entretanto, os tripulantes conseguem vencê-los e mantém o gato humanoide Avocato (Coty Galloway) como refém, tentando arrancar algumas informações. Em meados da primeira parte, o antagonista se transforma em um aliado inesperado, revelando sua verdadeira história e convencendo o nosso herói a ajudá-lo a combater um inimigo muito mais poderoso para resgatar seu filho, Gatito (Steven Yeun). A partir disso, o time de roteiristas passa a fazer escolhas um tanto quanto interessantes para dar continuidade à trama principal e aumentar a complexidade dos arcos apresentados; entretanto, os eventos se desenrolam quase subjugados ao pano de fundo e não abrem brechas. 

Em se tratando de uma série de comédia, narrativas secundárias são importantes para a criação de um ritmo envolvente e frenético, impedindo que o público caia nas ruínas da monotonia. Em grande parte da temporada isso acontece, apesar de alguns deslizes que quebram uma estrutura sólida e nos desligam do universo ao qual somos apresentados. De qualquer modo, os irônicos e propositalmente autoexplicativos diálogos, combinado à química do elenco, conseguem varrer os claros equívocos para debaixo do tapete – e aqui abro um parênteses para uma performance incrível, ainda que um pouco over-the-top, de David Tennant como Lorde Commander, o principal obstáculo a ser enfrentado pelos protagonistas. Além da incrível versatilidade cênica, que compõe cliffhangers angustiantes, os clímaces e viradas são muito bem pontuados e chocantes, e brincam com todas as ideias já exploradas pelo gênero, desde as viagens no tempo até as fendas cósmicas. 

E é claro que o enlace romântico não poderia deixar de existir, e aqui ele insurge na figura da guerreira-cientista Quinn (Tika Sumpter), que parece brotar do nada, mas mantém relações inesperadas com Gary e até mesmo com sua família. Ela é a representação do arquétipo da inteligência e da proteção, que eventualmente entrega a própria vida por uma causa maior e representa um sacrifício não premeditado para a conclusão do arco do herói – o qual, com grande surpresa, não encontra seu fim, mas um gancho assustador para uma futura temporada. 

A animação não ousa mais do que deve e mistura elementos do 2D e do 3D, oscilando entre originalidade e nostalgia, reforçando laços dialógicos com obras clássicas e inclinando-se para a contemporaneidade e o futuro. Mesmo não explorando todo o potencial, a fluidez funciona, principalmente àqueles que procuram uma boa e divertida aventura que entrega o que quer. Os momentos introspectivos se afastam do melodrama desnecessário e preparam terreno para incríveis cenas de ação que satisfazem até os mais céticos espectadores. 

Final Space pode ter seus problemas, mas definitivamente cumpre o seu papel e não força algo além do que pode entregar. Sua premissa é simples, divertido, não se escorando em tramas pretensiosas e, ao mesmo tempo, conseguindo flutuar entre momentos trágicos, hilários, emocionantes e de tirar o fôlego. Uma sequência é mais que aguardada – e muito bem-vinda, ainda mais para fechar algumas pontas que ficaram soltas e nos deixaram bastante angustiados. 

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