Na última quinta-feira (5), durante Rio2C (Rio Creative Conference), na Cidade das Artes, localizada na Barra da Tijuca (RJ), a Elo Company, empresa de conteúdo brasileiro de desenvolvimento, distribuição em salas de cinema e digital, e vendas nacionais e internacionais, com filmes como O Menino e o Mundo (concorrente do Oscar de Melhor Animação, em 2016) no catálogo, lançou o selo ELAS.
Tendo em vista a defasagem que existe entre a porcentagem de homens e mulheres com filmes sendo lançados no mercado audiovisual do Brasil, o selo tem o intuito de equilibrar os números e aceitará somente projetos de diretoras mulheres. Com nove obras em diversos estágios de produção, sendo seis ficções e três documentários, a empresa já está convidando nomes do mercado brasileiro, de diversas profissões como atrizes, diretoras, produtoras, roteiristas, advogadas, que irão doar horas de trabalho para os projetos.
A jornalista Karolen Passos conversou com Barbara Sturm, diretora de conteúdo da Elo Company, durante a Rio2C, para entender um pouco melhor como funcionará o selo ELAS, qual a diferença que isto pode trazer para o audiovisual no Brasil, entre outras coisas. Acompanhe:
Karolen Passos: Como surgiu a ideia de criação do selo ELAS dentro da Elo Company? Foi uma ideia que vocês já tinham pensado anteriormente ou ela apareceu devido as conquistas mundiais de produções lideradas por mulheres?
Barbara Sturm: Dentro da nossa área de projetos a gente foi percebendo que tinha muito menos projetos que chegavam dirigidos por mulheres. Isso foi uma coisa. A outra coisa foi que a gente participou de diversos eventos, o primeiro foi há um ano do dia de ontem, que foi o foro da Ancine de Mulheres do Audiovisual, em São Paulo, onde divulgaram pesquisas de que apenas 17% dos filmes lançados em 2016 (brasileiros) eram dirigidos por mulheres. A partir disso, a gente foi acompanhando, durante o ano, a tendência e o interesse do público por essas histórias como The Handmaid’s Tale, Big Little Lies, Lady Bird, Mulher-Maravilha. Realmente entendemos que do começo do ano passado até agora, é uma demanda consolidada. Portanto, com todas essas questões juntas justificamos ter a criação deste selo, pelo acesso direto, por mostrar que a gente se interessa por esses projetos. Então, uma pessoa que está fazendo produção executiva, que com a gente é mais de 50% feito por mulheres, ou escrevendo, vê que sim, existem empresas que são interessadas em distribuir e comercializar conteúdos dirigidos por mulheres. Dois, percebe que existe uma demanda de mercado. E três, por ver que existe uma defasagem de um nicho que tem grande potencial.
KP: Por qual razão você acredita que o público esteja mais engajado em conferir produções lideradas por mulheres?
BS: Acho que não é uma escolha entre um e outro. Na verdade, acredito que as pessoas estão cansadas de ver os mesmos pontos de vista que são poucos, são pontuais. Acho que, com o on demand, a gente tem mais opções, a gente consome mais audiovisual e vem um espaço para novas narrativas e novos pontos de vista. E com certeza existe uma mudança mundial, pelo menos no Ocidente, do lugar da mulher como num todo. Desde o corpo, desde a gravidez, da igualdade de salários e etc.. Vejo que é uma questão social. Mas acho que existe uma potência nessas histórias que citamos (The Handmaid’s Tale, Big Little Lies, Lady Bird, Mulher-Maravilha) que são conteúdos incríveis e este é o nosso foco, achar projetos incríveis dirigidos por mulheres. Então o ELAS é uma parte da nossa área de projeto inteira.
KP: No ano passado e ainda este ano, nos Estados Unidos, diversos movimentos como o #MeToo e o #TimesUP tem falado não somente de assédio dentro da indústria cinematográfica, como também, em todas as áreas, e além disso, sobre pagamento igualitário entre mulheres e homens. Com o selo ELAS, além de dar oportunidades para que mulheres possam apresentar seus projetos e ser financiadas por tais, pretende estabelecer uma política para que estas mulheres recebam pagamentos iguais aos dos homens?
BS: Não. A gente acredita nisso (o selo) e entendemos que tendo um selo que joga luz sobre projetos dirigidos por mulheres, nós trazemos, confirmamos e aceitamos estar junto com todas essas iniciativas relacionadas à mulher e à igualdade de gênero, em qualquer nível profissional dentro da indústria. Mas não teremos nenhum tipo de regra, assim como, não vamos selecionar um projeto por caridade porque ele é dirigido por mulher, os critérios são os mesmos. O nível da qualidade artística, executiva, da produtora em si que vai apontar, seja homem ou mulher, o currículo de quem vai dirigir.
KP: Como diretora de conteúdo, qual o critério que você utiliza na hora de divulgar um filme nas redes sociais? O que é mais levado em conta já que nos tempos atuais vivemos uma era de convergência midiática?
BS: Tanto para os projetos que a gente recebe e financia, quanto os filmes prontos que recebemos só para distribuir e não participamos conceitualmente dele, sempre falo que não tem modelo, a gente não trabalha com modelo pré-estabelecido. Analisamos cada produto, criamos uma estratégia e um posicionamento para ele (o produto) de acordo com o mundo em que vivemos naquele momento. O grande segredo, além de estar numa empresa que trabalha dessa forma, sem modelos pré-estabelecidos, priorizando o produto; “que história é essa? Falada por quem? De que forma? Qual o tom? Vamos pensar nisso”. Eu tenho um ponto de vista que é um filme que é lançado hoje, sexta-feira, 6 de abril, com o que está na capa de todos os jornais, com o que nós todos estamos pensando, é completamente diferente de lançar em 6 de agosto.
Por fim, perguntei para a Barbara sobre os projetos que estão em andamento no selo ELAS e ela me disse que Amores de Chumbo, de Tuca Siqueira, será lançado em junho. A Chave de Casa, que leva o nome de Simone Elias na direção, é protagonizado pela Camila Pitanga, a madrinha da iniciativa, e será filmado na Turquia. O Rir Para Não Chorar, de Cibele Amaral, entra em filmagem agora e será protagonizado pelo Rafael Cortez (CQC). Já sobre os documentários, a diretora me contou que Soldado Sem Arma, de Maria Carolina Telles, contará a história do André Liohn, fotógrafo de guerra brasileiro, pela perspectiva de uma mulher. E Torre das Donzelas, de Susanna Lira (Rotas do Ódio), contará sobre as mulheres que foram presas na ditadura.
Os outros longas-metragens que estão em processo de produção são Aos Olhos de Ernesto, de Ana Luiza Azevedo; É Tempo de Amoras, de Anahí Borges; Fairplay, de Malu Schroeder; e Meu Querido Supermercado, de Tali Yankelevich. A expectativa é que todos esses filmes cheguem ao público até 2020. E se você é uma diretora mulher, com um bom projeto e gostaria de enviar para a Elo Company, só anotar o e-mail: [email protected].