Há tempos fala-se muito da falta de criatividade em Hollywood. Mas pudera, em uma indústria onde fabrica-se milhares de produções cinematográficas por ano, é natural que muitas delas sejam ideias recicladas. O mais curioso, no entanto, é reparar que algumas destas obras sequer escondem o fato de terem tido o mesmo ponto de partida, o mesmo tema ou utilizar a mesma história.
Este é o conceito dos filmes “gêmeos” de Hollywood, produções de grandes estúdios, ou obras com artistas conceituados, que de forma desavergonhada entregaram basicamente o mesmo material em pouquíssimo tempo de intervalo. Então, prepare-se para nossa nova lista, que usa como lema o famoso “pode copiar, mas tenta fazer diferente”.
Christopher Robin X Adeus Christopher Robin
O filão do momento é o universo mágico de Christopher Robin, o ursinho Pooh, seus amigos, e o criador de tudo, o autor A.A. Milne. Christopher Robin: Um Reencontro Inesquecível, da Disney, está atualmente em cartaz nos cinemas fazendo sucesso, protagonizado por Ewan McGregor na pele do crescido menino Christopher Robin. O filme é uma espécie de reedição de Hook: A Volta do Capitão Gancho (1991) e chamou atenção por apelar às crianças com a turminha animada de Pooh dando as caras pela primeira vez em live action. Ano passado, o tema já havia sido abordado com Adeus Christopher Robin, biografia do criador dos bichinhos, mais no estilo de Em Busca da Terra do Nunca (2004). Apesar da presença da musa Margot Robbie no elenco, este segundo saiu perdendo e por aqui foi lançado direto em vídeo.
O Inferno de Dante X Volcano: A Fúria
Em 1997, as coisas ficaram quentes em Hollywood. Esse foi o ano que dois vulcões entraram em erupção no cinema entretenimento. Impulsionados pelo sucesso da onda recém-inaugurada dos filmes catástrofe, servida por Twister (1996), superprodução da Universal, os estúdios corriam para a chance de uma nova obra no estilo. Tornados já haviam sido feitos, assim como terremotos. Então, que tal vulcões? O primeiro a chegar foi justamente uma nova produção da própria Universal. O Inferno de Dante (título brasileiro mequetrefe, que usa como “trocadalho do carilho” parte do clássico A Divina Comédia, de Dante Alighieri) trazia o 007 da época Pierce Brosnan e a ex-Sarah Connor, Linda Hamilton, combatendo o vulcão de uma cidadezinha. Mais ambiciosa, a FOX não perdeu tempo e elevou o jogo colocando um vulcão para entrar em erupção no meio de Los Angeles, com Tommy Lee Jones e Anne Heche para o resgate.
Formiguinhaz X Vida de Inseto
Nem mesmo as animações escapam da “clonagem”. E em 1998, foi a vez dos insetos ganharem as telonas em versões animadas. A primeira a chegar foi Formiguinhaz, que marcava não só a estreia da primeira animação gerada por computador da Dreamworks Animation (e a segunda de Hollywood) para o recém-criado estúdio Dreamworks (com os primeiros lançamentos no ano anterior, em 1997), como também a primeira animação de forma geral para a casa. Com a voz de Woody Allen e grande elenco, o filme é quase uma versão animada de algum trabalho do diretor, sendo quase mais recomendado para os adultos. A Disney/Pixar reverteu esse quadro com Vida de Inseto, sua segunda animação no estilo, depois de Toy Story (1995), com um apelo bem maior para a criançada.
Impacto Profundo X Armageddon
Calma, não se trata de um filme pornô. No ano seguinte da briga de vulcões, Hollywood voltou a focar no muito lucrativo (para a época) cinema catástrofe, precisando tirar da cartola um novo desastre natural. E se meteoros gigantes chegassem para colidir com nosso planeta? Estava feita a festa. Até hoje só peço para que a sátira que o comediante Mike Myers fez em um MTV Movie Awards da época se torne realidade e tenhamos duas produções Hollywoodianas sobre geadas mortais. Enquanto isso não ocorre, 1998 ficava conhecido como o ano dos meteoros (que tinham muito de paixão envoldida). O primeiro a chegar foi Impacto Profundo, justamente da Dreamworks, que trazia Robert Duvall, Téa Leoni e Morgan Freeman como o presidente dos EUA, numa trama mais plausível e dramática. Já voltado para a ação ininterrupta, Michael Bay dava demonstrações de sua megalomania muitos anos antes de Transformers, aqui com Armageddon. Uma epopeia espacial com adrenalina demais e neurônios de menos, capitaneada por Bruce Wilis, Ben Affleck, Liv Tyler e uma canção chiclete da banda Aerosmith.
O Resgate do Soldado Ryan X Além da Linha Vermelha
Tudo bem que comparar o cinema de Steven Spielberg com o de Terrence Malick não tem muito cabimento. Mas o fato é que em 1998 (o ano mais “copiado”) essas duas produções de grande relevância e abrangência resolveram abordar a Segunda Guerra Mundial sob suas óticas particulares, através da visão dos soldados que nelas lutaram, nos jogando em meio ao conflito. As coincidências não param por aí, e o prestígio de ambas as levaram até o Oscar. O primeiro, O Resgate do Soldado Ryan, de Spielberg, é uma experiência virtuosa que funciona quase como um simulador. O filme foi indicado para 11 Oscar e venceu 5, incluindo melhor diretor, além de ser o número 28 de todos os tempos na preferência do grande público. Além da Linha Vermelha, de Malick, bem, é um filme de Malick. Poético, dando preferência a sensações e imagens, o longa foi indicado a 7 Oscar e saiu de mãos abanando.
O Show de Truman X Ed TV
Sim, é até meio injusto comparar estas duas obras. A ligação aqui é somente o boom que ocorria dos reality shows. Nos primórdios de tais programas que virariam febre e que consistem em uma olhada contínua de bastidores nas vidas de pessoas comuns, dois filmes chamaram atenção com tais premissas – bem, um muito mais do que o outro. O criativo O Show de Truman foi escrito por Andrew Niccol e dirigido por Peter Weir. Indicado para 3 prêmios no Oscar, muitos ainda afirmam ser um dos filmes mais injustiçados da história da Academia. Já Ed TV, embora aborde um tema parecido – o de um homem seguido por câmeras 24 horas por dia – é baseado numa produção francesa chamada Louis 19, le roi des ondes. Ed TV, lançado no ano seguinte e dirigido por Ron Howard (o mesmo de Han Solo), apesar de ter como protagonista um Matthew McConaughey em ascensão, não deu muito certo.
Capote X Confidencial
O escritor Truman Capote, autor do clássico Bonequinha de Luxo, foi alvo de duas produções na década passada. No entanto, o livro que deu origem ao filme imortalizado pela musa Audrey Hepburn não é o foco destas adaptações. E sim a pesquisa feita pelo escritor para confeccionar seu livro criminal À Sangue Frio. O primeiro, com o singelo título Capote (2005), foi o mais prestigiado. Protagonizado pelo saudoso Philip Seymour Hoffman na pele de Truman e dirigido por Bennett Miller, o longa foi indicado para 5 Oscar, incluindo melhor filme e diretor, e levou o de ator para Hoffman. No ano seguinte, foi a vez de uma versão B marcar presença. Bem, ao menos nos cinemas internacionais, já que no Brasil aportou direto no mercado de vídeo. Protagonizado por Toby Jones na pele de Capote, Confidencial (2006) conta basicamente a mesma história, fazendo uso de um elenco estelar – em tela desfilam Sandra Bullock, Gwyneth Paltrow, Daniel Craig, Sigourney Weaver, Jeff Daniels, Isabella Rossellini e o diretor Peter Bogdanovich. O curioso é que ambos foram baseados em livros, mas de autores diferentes.
O Grande Truque X O Ilusionista
Em 2006, Hollywood despertou para mágicos e seus truques. Ah sim, como se isso não fosse coincidência suficiente, vale enfatizar que ambas são histórias passadas no fim do século XIX, época em que tais tipos de artistas geravam grande fascínio. O mais “prestigiado” (com o perdão do trocadilho com seu título original) é O Grande Truque, filme que trazia o duelo de titãs entre Christian “Batman” Bale e Hugh “Wolverine” Jackman. Como se não bastasse, o verdadeiro chamariz era a direção do mago do cinema, Christopher Nolan, saído do sucesso de Batman Begins (2005). Michael Caine e Scarlett Johansson completam este time estelar. O “primo” pobre, mas igualmente elogiado, trazia uma história de amor proibido e suspense entre um ilusionista e uma sofrida mulher casada. Edward Norton e Jessica Biel são os protagonistas de O Ilusionista.
Hitchcock X A Garota
Alguns anos depois de Truman Capote, uma outra figura rotunda e peculiar gerava grande interesse em Hollywood. Este, no entanto, com tudo a ver com o mundo da sétima arte. Estamos falando sobre o mestre Alfred Hitchcock – que merece todas as biografias possíveis e imagináveis. Nem precisa dizer que estas duas foi pouco. A primeira e mais renomada atende pela simples alcunha de Hitchcock (2012). Lançado nos cinemas, o longa causou rebuliço e trouxe um transformado Anthony Hopkins, cuja maquiagem incrível foi indicada ao Oscar. Helen Mirren, Scarlett Johansson e Jessica Biel completam o elenco principal. O filme relata os bastidores de Psicose (1960), um dos maiores desafios da carreira do diretor. Já em A Garota (2012), o mestre do suspense foi interpretado por Toby Jones (ele de novo!) e teve lançamento direto no canal a cabo HBO. Ao contrário da produção cinematográfica, o telefilme focou no relacionamento do cineasta com uma de suas musas, Tippi Hedren, protagonista de filmes como Os Pássaros (1963) e Marnie (1964). No filme, Hedren, que na vida real é mãe da atriz Melanie Griffith, foi vivida por Sienna Miller.
Invasão a Casa Branca X O Ataque
O presidente dos EUA sempre esteve em perigo quando se trata de filmes de ação. Vira e mexe temos o chefe do país mais poderoso do mundo no meio de conspirações que colocam sua vida em risco. Porém, nunca anteriormente a Casa Branca se viu como maior alvo do que em 2013. Na verdade, estes dois filmes são crias de Duro de Matar e muito bem poderiam servir como roteiro para um próximo filme da franquia. O primeiro a chegar foi justamente Invasão a Casa Branca, uma divertida e violenta incursão neste subgênero, que trazia Gerard Butler como o melhor homem para defender o presidente de Aaron Eckhart. Meses depois, foi a vez de Channing Tatum se mostrar apto a ir até as últimas consequências para salvar a vida de Jamie Foxx, um presidente mais antenado com a modernidade da era Obama. Ah sim , dois grandes diretores foram os responsáveis pelas assinaturas de tais projetos. O primeiro é cria de Antoine Fuqua e o segundo, de Roland Emmerich. Curiosamente, o primeiro foi o que ganhou sequência, o bem abaixo da média Invasão a Londres (2016). Uma terceira parte desta franquia, inclusive, se encontra em fase de pós-produção para o lançamento em 2019.
De Volta ao Jogo X O Protetor
Tudo bem, aqui é apenas a premissa a similaridade, já que o tom, estilo e narrativa entre eles difere bastante. Mas o fato é: em ambos os filmes temos um exímio matador (seja um ex-agente ou um ex-assassino profissional) tragado de volta à sua velha vida, a qual desejava esquecer, para mais uma vez realizar sua própria justiça com as mãos. Ambos lançados em 2014, o mais famoso e segundo a chegar foi De Volta ao Jogo, popularmente conhecido como John Wick (título original). Cheio de estilo, Keanu Reeves protagonizou e vingou seu cachorrinho. O filme recebeu uma continuação em 2017 e uma nova chega em 2019. Já O Protetor, com Denzel Washington, é baseado numa série de TV antiga e traz o sujeito buscando vingança pela amiga, uma jovem prostituta. Demorou um pouquinho mais, porém, finalmente teve sua sequência lançada este ano.
Festa no Céu X Viva: A Vida é uma Festa
Aqui, os holofotes recaem sobre a cultura mexicana e a tão celebrada festa do dia dos mortos. Apesar das inúmeras similaridades, há uma diferença de três anos entre as produções. A primeira a chegar, usa um estilo de animação bem peculiar, bem parecido com bonecos de titereiros feitos de madeira. Produzido por Guillermo del Toro, Festa no Céu (2014) é uma história de romance e música, trazendo um triângulo amoroso entre os personagens dublados por Channing Tatum, Zoe Saldana e Diego Luna. Com bem mais prestígio – também pudera -, Viva: A Vida é uma Festa (Coco), filme da Disney/Pixar, foi lançado no fim do ano passado, chegando aos cinemas brasileiros no início de 2018. O longa emplacou no Oscar, levando os prêmios de animação e canção. Além disso, já se encontra em número 63 na lista dos melhores de todos os tempos na opinião do grande público. O filme igualmente possui uma forte veia musical e fala sobre família.
Mogli: O Menino Lobo X Mogli: O Livro da Selva
Mogli é um menino lobo ou é um livro da selva? Seja como for, todos acharam cedo demais para uma nova superprodução, feita nos mesmos moldes, abordar a criação de Rudyard Kipling. O primeiro, dirigido por Jon Favreau, seguiu a leva das adaptações em live action das clássicas animações da Disney, que já teve em seu repertório Cinderela (2015) e A Bela e a Fera (2017), por exemplo. Molgi: O Menino Lobo (2016) é um encantador relato da animação de 1967 e conta com as vozes de gente como Bill Murray, Scarlett Johnasson e Idris Elba dublando os animais. Três anos depois, com lançamento previsto para 2019, chega a versão dirigida por Andy Serkis da mesma história, desta vez bancada pela Warner. Aqui em Mogli: O Livro da Selva, mais realista e sujo, Christian Bale, Cate Blanchett e Benedict Cumberbatch são as principais vozes. Curiosamente, foi divulgado que o segundo terá lançamento direto na plataforma Netflix, ao invés dos cinemas mundiais. Mau sinal.