Na última quinta-feira (5), o novo projeto de Ari Aster, diretor consagrado por Hereditário (2018) e Midsommar – O Mal Não Espera a Noite (2019), ganhou um novo e controverso pôster, além de ganhar oficialmente uma distribuidora no Brasil, a Diamond Films.
Você esteve esperando a vida toda por esse momento.
Com Joaquin Phoenix, o novo longa de Ari Aster pela @A24 #BeauIsAfraid chega em breve aos cinemas brasileiros com minha distribuição. pic.twitter.com/y9q6grfwWe— Diamond Films Brasil (@DiamondFilmsBR) January 5, 2023
Lançado com a campanha “Você esteve esperando a vida toda por esse momento”, o pôster de ‘Beau Is Afraid‘ é bem mais poluído do esteticamente incômodo do que as imagens e fotos de bastidores relacionadas ao projeto, mesmo que praticamente tudo sobre ele fosse guardado a sete chaves. E esse tanto de segredo meio que ajudou a compor o clima de mistério e a curiosidade acerca desse vindouro longa, que já teve sua estreia adiada algumas vezes.
Anunciado originalmente como Disappointment Blvd., o longa foi descrito como uma comédia de terror sobre um dos maiores empresários de todos os tempos. Quem é o empresário? Ninguém sabe. As únicas confirmações eram que Ari Aster escreveria, produziria e dirigiria o filme, e que seria protagonizado pelo talentosíssimo Joaquin Phoenix (pronto para passar por mais uma transformação física impressionante para trabalhar no papel). Além disso, o elenco de apoio também foi anunciado, com alguns nomes de peso, como Patti LuPone e Amy Ryan.
Diante dessas limitadas, porém interessantes informações, os fãs do diretor – e de terror em geral – já se animaram com o projeto, ainda mais tendo o selo da queridinha A24, que tem investido em alguns dos melhores filmes da última década, incluindo alguns clássicos modernos do terror. E como esse meio empresarial é cheio de exageros e maldades, tudo indicava ser um terreno muito fértil a ser explorado nesse formato de terror com momentos cômicos.
Fora isso, o próprio nome “Disappointment Blvd.”, algo como “Avenida das Decepções”, em tradução livre, era muito bom e parecia combinar bastante com a proposta revelada até o momento. No entanto, em dezembro de 2022, o título foi oficialmente alterado e um pôster – esquisito – foi lançado confirmando a mudança. Na época, esse novo nome causou uma certa confusão em parte do público, que não entendeu se era um outro filme de Ari Aster ou se apenas haviam mudado o título de Disappointment Blvd., que era um excelente nome para o longa.
Com a confirmação da mudança de título, a imagem do pôster, por mais estranha que seja, também casou com a proposta de um filme que acompanha a vida de um empresário e suas decepções. Afinal, o longa deve acompanhar a trajetória de Beau Wilmington (Phoenix) desde a infância até a vida adulta.
E com o pôster lançado nesta quinta (5), o que era apenas uma suposição virou fato. O longa seguirá Beau em quatro momentos de sua vida: infância, juventude, vida adulta e terceira idade. Tomando pelo título anterior, podemos esperar a famosa angústia dos projetos Ari Aster causadas pelas decepções da vida de um homem comum, o que por si só já seria bastante interessante, e o suficiente para fazer com que os fãs comprassem a ideia do projeto. Só que o nome do personagem principal e supostas novas informações do filme fizeram com que os fãs lembrassem de outro trabalho do diretor: seu terceiro curta da carreira, chamado Beau.
De acordo com essa suposta notícia, o longa acompanhará Beau Wilmington como um homem neurótico que nunca conheceu o pai e teve uma relação conturbada com a mãe. Então, quando ela morre, ele faz uma viagem de volta para a casa onde cresceu, onde alguns demônios interiores serão despertados. E isso parece dialogar perfeitamente com o curta “Beau”.
[ALERTA DE SPOILERS DO CURTA ‘BEAU’]
Lançado em 2011, esse curta acompanha Beau, um homem de meia idade que conversa com sua mãe e combina de visitá-la. Então, ele arruma suas malas e se prepara para sair, mas percebe que esqueceu o fio dental e volta para buscá-lo no banheiro, deixando a porta entreaberta com as chaves e a mala para fora.
Quando ele retorna do banheiro, fica chocado que alguém pegou não apenas sua mala, mas também as chaves da porta. Temendo ser vítima de uma invasão domiciliar, Beau vai para o corredor, onde um vizinho o ofende de forma gratuita, o que aumenta a paranoia do protagonista.
Sem ter as chaves para trancar e abrir a porta, ele volta para casa e adia a ida para a casa da mãe. Sua meta agora é descobrir quem ou o quê roubou suas chaves. Assim, o homem prende um sino na entrada e tenta dormir, mas ouve brigas, discussões e barulhos suspeitos do lado de fora. Ele ouve o sino tocando, desce com uma tesoura de jardineiro, mas vê um animal peludo e esquisito passando porta afora. Acreditando ser um rato, Beau deita no chão em frente à porta e contorna seu corpo com ratoeiras, o que não dá certo.
Na noite seguinte, ele ouve mais discussões no corredor e sai para ver o que é. O rapaz observa um casal brincando, que prontamente xinga Beau. Neurótico, o homem liga para a polícia, que também o ofende ao ouvir sua voz. Sem saber o que fazer, ele vai tomar um café e derruba o líquido quente em seu pé. Com tudo dando errado, Beau monta uma armadilha apontada para a porta, enquanto faz palavras cruzadas. Mas vale reparar que ele não está escrevendo as palavras certas. O tempo passa e alguém tenta abrir a porta. Só que, para o desespero do protagonista, um ladrão invade sua casa pela janela e tenta golpeá-lo com um canivete, que bate no corpo de Beau, fecha e corta um dedo do bandido, que vai embora correndo, gritando e chorando.
A cena corta para Beau falando com sua mãe, que profere as únicas palavras de conforto para o rapaz, que pede ajuda para a matriarca enquanto pede para que ela o busque em casa. Então, o curta revela uma criatura peluda com dedos pretos do outro lado da linha. Ele está comendo eucalipto e está com as chaves roubadas de Beau.
O curta é bastante confuso, mas já traz algumas das características que o consagraram em Hereditário. A mais forte delas é o flerte com a dúvida se o protagonista está afetado por uma dose própria de insanidade ou se há alguma coisa sobrenatural acontecendo. Conforme o curta se desenrola, é possível ver alguns elementos que apontam para alguns possíveis transtornos de Beau, como a presença de remédios controlados nos ambientes que ele frequenta, ele ter uma tesoura de jardineiro em um apartamento sem jardim, sua única relação saudável ser com sua mãe, além da própria canequinha de café, que é bastante infantilizada. Sua última frase, inclusive, remete a uma criança que teve pesadelos quando foi dormir na casa de um coleguinha: “Mamãe, você pode vir me buscar?”.
Na verdade, a própria existência do curta já aponta para uma infantilidade desproporcional do protagonista. Afinal, quais as primeiras coisas que se faz quando roubam sua chave de casa e você acredita que possa estar em perigo? A primeira é ligar para a polícia, a segunda é trocar a fechadura. Já Beau prefere esperar e colocar um sininho, tal qual Kevin McAllister, em Esqueceram de Mim (1990).
Mas não dá para ignorar também as sugestões de algo sobrenatural acontecendo ali. Será mesmo que Beau estaria enlouquecendo ao ouvir todos ao seu redor, com exceção de sua mãe, o ofenderem gratuitamente ou tem algo a mais acontecendo?
O primeiro indício de algo sobrenatural é a criatura que passa pela porta. Ela não se parece com um rato ou qualquer outro animal conhecido, por mais que o protagonista interprete que era um roedor. O segundo sinal de uma presença vil por lá é justamente quando Beau monta a armadilha em frente à porta. Ele está jogando palavras cruzadas, mas não está preenchendo as lacunas com as palavras corretas. É possível ver que o homem está escrevendo repetidamente a mesma palavra em latim pelas folhas, o que costuma ser sinal de rituais demoníacos e situações obscuras. Por fim, o assaltante deveria ter ferido Beau com o canivete, mas acabou que foi o próprio bandido quem se deu mal. A cena é bem similar com a da morte do pai em “Hereditário”, que começa a pegar fogo em um momento tenso, causando dor e desespero em todos.
Tudo isso para terminar em uma presença sinistra que podia estar se passando pela mãe, que pode ter matado a mãe ou poderia ser a própria mãe desde sempre. Nos créditos, é revelado que a criatura é um demônio chamado Kolgaan, o Colecionador de Chaves. E ainda assim a situação toda é meio confusa. O esclarecimento desse curta se dá apenas com a leitura do roteiro, que revela que Beau havia jogado em um tabuleiro de Ouija em um momento de sua vida, libertando essa criatura maligna.
[FIM DOS SPOILERS DO CURTA ‘BEAU’]
Caso o boato de que o curta serviu de inspiração para Beau Is Afraid se confirme, as expectativas para o filme são altíssimas, porque esse flerte da insanidade com o sobrenatural mediado por uma relação conturbada com a própria mãe já mostrou ser uma narrativa que Ari Aster domina como poucos. Sobretudo quando ele tem atores expressivos sob seu comando, o que é o caso aqui, já que poucos vêm trabalhando tão bem quanto Joaquin Phoenix nos últimos anos.
Além disso, se a premissa do conflito do curta já foi bem trabalhada em menos de 10 minutos, imagina o que pode ser feito em horas? O potencial de trabalhar essa pegada de pesadelo acordado é gigantesco. Ainda mais se as falas de bastidores, que sugeriram um terror de comédia, forem confirmadas. Tem tudo para mexer com aquele humor de situação, que causa riso, mas também angústia por somente o perseguido estar vendo as coisas, enquanto os outros acham que ele está louco. Segundo as primeiras entrevistas, o corte inicial do longa tinha cerca de quatro horas de duração, mas é bem provável que haja mais cortes e o filme termine com cerca de 2h30, o que é tempo o bastante para desenvolver um clássico.
Beau Is Afraid ainda não tem data de estreia marcada, mas está previsto para chegar aos cinemas brasileiros em algum momento de 2023. Ansiosos?