Composta por oito episódios de uma hora de duração cada, a nova série de ‘Perry Mason’ – baseada nos livros de Erle Stanley Gardner, que já havia ganhado uma adaptação anteriormente, entre 1957 e 1966, em formato serial televisivo – atualiza os temas dos livros e eleva o nível do horário nobre da HBO.
Perry Mason (Matthew Rhys) é um exímio perdedor. Sem dinheiro, constantemente bêbado e sem família, Perry ganha a vida como um abutre papparazzi: bisbilhotando a vida dos famosos, atrás de flagrantes que possa vender para os tabloides. O ano é 1932, nos Estados Unidos que tentam se recuperar da Grande Depressão de 1929. Um dia, o advogado E.B. (John Lithgow) o procura e pede sua ajuda na investigação de um caso que aconteceu em Los Angeles, no qual trabalha na defesa: o terrível sequestro e assassinato do bebê Charlie, filho de Emily (Gayle Rankin) e Matthew Dodson (Nate Corddry). Em paralelo, cresce em Los Angeles o culto da igreja da Irmã Alice (Tatiana Maslany), e isso preocupa as autoridades.
Passada numa época um bocado diferente do mundo de hoje, o maior desafio do roteiro de Ron Fitzgerald foi tentar transpor as histórias de Perry Manson para cem anos depois de quando foram escritas, repaginando alguns conceitos e, ao mesmo tempo, mostrando o quanto certos comportamentos permanecem em nossa sociedade mesmo um século depois. Então, ao mesmo tempo em que a história aponta recortes xenofóbicos, racistas e chauvinistas, o roteiro os atualiza e insere diálogos nos quais os próprios personagens tentam combater, ainda que timidamente, essas construções sociais que permanecem ainda hoje na sociedade – o que é bastante válido, embora tenha pouco espaço no enredo dessa primeira temporada da série.
Dirigido por Timothy Van Patten e Deniz Gamze Ergüven, a série reconstrói uma Los Angeles dos anos 1930 com impecabilidade na direção de arte, que conciliou com minuciosidade o figurino, o cabelo, o cenário e a composição de cena, transpondo o espectador para aquela época. Porém, embora visualmente belo e convincente, a primeira temporada de ‘Perry Mason’ escorrega um pouco no ritmo (sempre um desafio grande para as narrativas policiais estilo noir), na barriga criada na história (até a metade da temporada há um aprofundamento das histórias pessoais dos personagens principais, o que faz pouco avançar a trama investigativa e dá uma cansada no espectador) e, a bem da verdade, o próprio protagonista, Perry Mason, é, no final das contas, um perdedor beberrão que, graças a outro homem, atravessa uma jornada pessoal para deixar de ser um zero à esquerda para se tornar um grande advogado – ou seja, é um protagonista pouco atraente. Perto dele, as histórias dos personagens secundários se tornam muito mais interessantes.
Já confirmada para uma segunda temporada, ‘Perry Mason’ tem um início morno, mas promete se tornar uma grande série investigativa que parece tentar fazer de seu ponto fraco uma ferramenta de debate para a interpretação crítica do espectador. Dentro do universo das séries policiais, a primeira temporada de ‘Perry Mason’ se mostrou uma grande superprodução do gênero noir.