quarta-feira , 18 dezembro , 2024

Crítica 2 | Demônio de Neon

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QUEM É MAIS SUPERFICIAL, O FILME OU A MODA?

 

Demônio de Neon (The Neon Demon) suscitou algumas questões. Não posso dizer que isto seja bem mérito do direito Nicolas Winding Refn. Fato que algumas questões sobre estética ficaram na minha cabeça. Não sobre o mundo da moda. O filme é por demais autoindulgente e estetizante para ser uma crítica consistente sobre a superficialidade do mundo da moda.



O roteiro tem o mérito de não seguir o óbvio arco da garota inocente que é triturada pelos tubarões da indústria da moda. Mesmo na primeira hora do filme, na qual Jesse (Elle Fanning) realmente aparenta ser uma criatura frágil, já notamos um jeito meio malando meio inocente. Refn cria nela uma razoável ambiguidade, conseguindo uma lufada de dúvida sobre quem é mais mortal, se Jesse ou as pessoas que a cercam.

the neon demon

Em termos narrativos, a segunda parte certamente será a mais desagradável para o público. Não, não são as escatologias dessa parte que incomodarão (ao menos não aos acostumada aos filmes mais chocantes), pois o filme busca tanto ser sublimemente belo em cada quadro, que a repulsa fica apenas na ideia – claro, as almas demasiadas sensíveis ficarão chocadas, mas estas ficam até com beijo entre idosos na novela das nove. Ademais, a vontade tão ostensiva de chocar reduz o impacto.

O que desagrada nessa parte é ver como o filme se perde na sua narrativa. Misturando alguns subgêneros, o filme não chega a abraçar nem o horror nem o suspense de forma plena. E o pior, o que já era etéreo no começo, alcança um vazio que deixa a narrativa solta no ar. Se na primeira hora a questão fica em saber se Jesse será devorada ou devorará o sistema, na segunda parte, o conflito fica difuso, ora focando na oscilação da psique da protagonista (com uma ridícula verbalização do quanto ela é perigosa), ora tentando ser um horror estilizado, ora ameaçando adentrar o thriller, em outros momentos abraçando o grotesco, e assim por diante.

Não se enganem, isto não é incompetência de Refn; o caso parece ser de autoindulgência mesmo. O diretor parece estar tão certo da genialidade de seu trabalho que acha bom ir aparando todos os fios que permitiriam ao espectador destrinchar o filme. Claro, isto vai de pessoa para pessoa; pessoalmente, no meu atual estágio de desenvolvimento mental, não consegui captar grandes coisas dessa história. Brincadeiras à parte, é um troço complicado para criador avaliar o quanto pode deixar no subentendido. O criador vai tirando elementos, deixando ambiguidades, criando metáforas, cifrando sinais. Contudo, é preciso deixar o mínimo para o público desfiar os significados. Se a coisa fica tão sem aparas e a obra deixa de ter sentido, a culpa é do criador. Pode ser falta de repertório do espectador? Pode, mas na dúvida, a culpa é do criador. Parece-me que esse é o caso de Demônio de Neon. Especialmente na segunda parte, os sentidos são tão variados que fica a pergunta se o diretor não exagerou na dose.

the neon demon

Até a sua face mais evidente é frágil: a tal crítica ao mundo da moda é tão vazia quanto seu objeto de ataque. Primeiro, a crítica em si é superficial. Segundo, o principal contraponto, Dean (Karl Glusman), namorado de Jesse, não ganha o devido destaque. Terceiro, a dúvida sobre a natureza de Jesse dificulta que a coloquemos como vítima desse universo fútil – ora, como vamos criticar a indústria da moda, se o elemento novo já estava podre?!

O maior problema do filme está, justamente, em sua grande qualidade: a plasticidade. Demônio de Neon é belo. É sufocantemente belo. Tão belo, que suas cenas escatológicas perdem a força do choque. É tudo desenhado com esmero que deixa a trama em segundo plano. Cada imagem é tão elaborada que reforça a sensação de fragmentariedade da obra.

Refn faz aqui seu filme mais estético. É um esmero tamanho com a beleza da obra, que fica difícil aceitar que o diretor está criticando a superficialidade da moda. Como efeito colateral, a sua estética parece deixar seus personagens sem alma. Se a intenção de Refn era usar a estética para fazer o público sentir o vazio das personagens, parabéns, conseguiu. Tão bem sucedido, que ficamos com a sensação de estarmos transando com uma boneca inflável.

the neon demon

O leitor já deve estar se questionando qual era, afinal, o questionamento que o filme provocou em mim. Em resenha do UOL, Isabela Boscov alertou que os elementos mais criticados em Demônio de Neon são os mesmo que deram ao diretor a palma de ouro em Cannes por Drive. O incomodo de boa parte da crítica está na dosagem.

Refn é um esteta, isto qualquer crítico nota. Sua fotografia em tons elétricos e as composições das cenas provocam repulsa pela estranheza e atração por sua beleza, seus personagens parecem etéreos, como se vivessem em um mundo de pura beleza, em uma realidade toda peculiar. Pela reação da crítica, o diretor aplicou superdosagem.

Até que ponto aceitamos um filme de pura estética? A crítica empolga-se com sequências maneiristas, com a inovação técnica, com um plano composto com esmero. Crítica e público, em graus distintos, sentem um prazer com a estética do filme, até mesmo no grotesco. Mas, até onde aceitamos um filme que menospreza o conteúdo e foca na forma?

the neon demon

Por mais conteúdo que tenha, todas as artes são formas. O que diferencia um poema de uma divagação filosofia é, basicamente, a forma. No cinema não é diferente. Acontece que o cinema é mais “superficial” do que a literatura. Se a imagem tem a vantagem de não precisar de um tradutor, ela paga o preço da ambiguidade e, em certos momentos, da platitude. Por causa disto, é difícil fazer um bom filme que critique a superficialidade do mundo das coisas.

E aí vem meu questionamento: será que Refn, com seu Demônio de Neon, estaria querendo questionar a superficialidade do mundo da moda ou a do cinema? Ou talvez eu só esteja tentando salvar uma obra visualmente deslumbrante, cujos erros não permitem considerá-la sequer um bom filme?!

E, aí, o que achou do filme? Ele é ruim ou um bom filme? Foi o maior erro ou a maior obra de Refn? Vamos, comente, compartilhe e curta nossas redes sociais:

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Demônio de Neon (The Neon Demon) suscitou algumas questões. Não posso dizer que isto seja bem mérito do direito Nicolas Winding Refn. Fato que algumas questões sobre estética ficaram na minha cabeça. Não sobre o mundo da moda. O filme é por demais autoindulgente e estetizante para ser uma crítica consistente sobre a superficialidade do mundo da moda.

O roteiro tem o mérito de não seguir o óbvio arco da garota inocente que é triturada pelos tubarões da indústria da moda. Mesmo na primeira hora do filme, na qual Jesse (Elle Fanning) realmente aparenta ser uma criatura frágil, já notamos um jeito meio malando meio inocente. Refn cria nela uma razoável ambiguidade, conseguindo uma lufada de dúvida sobre quem é mais mortal, se Jesse ou as pessoas que a cercam.

the neon demon

Em termos narrativos, a segunda parte certamente será a mais desagradável para o público. Não, não são as escatologias dessa parte que incomodarão (ao menos não aos acostumada aos filmes mais chocantes), pois o filme busca tanto ser sublimemente belo em cada quadro, que a repulsa fica apenas na ideia – claro, as almas demasiadas sensíveis ficarão chocadas, mas estas ficam até com beijo entre idosos na novela das nove. Ademais, a vontade tão ostensiva de chocar reduz o impacto.

O que desagrada nessa parte é ver como o filme se perde na sua narrativa. Misturando alguns subgêneros, o filme não chega a abraçar nem o horror nem o suspense de forma plena. E o pior, o que já era etéreo no começo, alcança um vazio que deixa a narrativa solta no ar. Se na primeira hora a questão fica em saber se Jesse será devorada ou devorará o sistema, na segunda parte, o conflito fica difuso, ora focando na oscilação da psique da protagonista (com uma ridícula verbalização do quanto ela é perigosa), ora tentando ser um horror estilizado, ora ameaçando adentrar o thriller, em outros momentos abraçando o grotesco, e assim por diante.

Não se enganem, isto não é incompetência de Refn; o caso parece ser de autoindulgência mesmo. O diretor parece estar tão certo da genialidade de seu trabalho que acha bom ir aparando todos os fios que permitiriam ao espectador destrinchar o filme. Claro, isto vai de pessoa para pessoa; pessoalmente, no meu atual estágio de desenvolvimento mental, não consegui captar grandes coisas dessa história. Brincadeiras à parte, é um troço complicado para criador avaliar o quanto pode deixar no subentendido. O criador vai tirando elementos, deixando ambiguidades, criando metáforas, cifrando sinais. Contudo, é preciso deixar o mínimo para o público desfiar os significados. Se a coisa fica tão sem aparas e a obra deixa de ter sentido, a culpa é do criador. Pode ser falta de repertório do espectador? Pode, mas na dúvida, a culpa é do criador. Parece-me que esse é o caso de Demônio de Neon. Especialmente na segunda parte, os sentidos são tão variados que fica a pergunta se o diretor não exagerou na dose.

the neon demon

Até a sua face mais evidente é frágil: a tal crítica ao mundo da moda é tão vazia quanto seu objeto de ataque. Primeiro, a crítica em si é superficial. Segundo, o principal contraponto, Dean (Karl Glusman), namorado de Jesse, não ganha o devido destaque. Terceiro, a dúvida sobre a natureza de Jesse dificulta que a coloquemos como vítima desse universo fútil – ora, como vamos criticar a indústria da moda, se o elemento novo já estava podre?!

O maior problema do filme está, justamente, em sua grande qualidade: a plasticidade. Demônio de Neon é belo. É sufocantemente belo. Tão belo, que suas cenas escatológicas perdem a força do choque. É tudo desenhado com esmero que deixa a trama em segundo plano. Cada imagem é tão elaborada que reforça a sensação de fragmentariedade da obra.

Refn faz aqui seu filme mais estético. É um esmero tamanho com a beleza da obra, que fica difícil aceitar que o diretor está criticando a superficialidade da moda. Como efeito colateral, a sua estética parece deixar seus personagens sem alma. Se a intenção de Refn era usar a estética para fazer o público sentir o vazio das personagens, parabéns, conseguiu. Tão bem sucedido, que ficamos com a sensação de estarmos transando com uma boneca inflável.

the neon demon

O leitor já deve estar se questionando qual era, afinal, o questionamento que o filme provocou em mim. Em resenha do UOL, Isabela Boscov alertou que os elementos mais criticados em Demônio de Neon são os mesmo que deram ao diretor a palma de ouro em Cannes por Drive. O incomodo de boa parte da crítica está na dosagem.

Refn é um esteta, isto qualquer crítico nota. Sua fotografia em tons elétricos e as composições das cenas provocam repulsa pela estranheza e atração por sua beleza, seus personagens parecem etéreos, como se vivessem em um mundo de pura beleza, em uma realidade toda peculiar. Pela reação da crítica, o diretor aplicou superdosagem.

Até que ponto aceitamos um filme de pura estética? A crítica empolga-se com sequências maneiristas, com a inovação técnica, com um plano composto com esmero. Crítica e público, em graus distintos, sentem um prazer com a estética do filme, até mesmo no grotesco. Mas, até onde aceitamos um filme que menospreza o conteúdo e foca na forma?

the neon demon

Por mais conteúdo que tenha, todas as artes são formas. O que diferencia um poema de uma divagação filosofia é, basicamente, a forma. No cinema não é diferente. Acontece que o cinema é mais “superficial” do que a literatura. Se a imagem tem a vantagem de não precisar de um tradutor, ela paga o preço da ambiguidade e, em certos momentos, da platitude. Por causa disto, é difícil fazer um bom filme que critique a superficialidade do mundo das coisas.

E aí vem meu questionamento: será que Refn, com seu Demônio de Neon, estaria querendo questionar a superficialidade do mundo da moda ou a do cinema? Ou talvez eu só esteja tentando salvar uma obra visualmente deslumbrante, cujos erros não permitem considerá-la sequer um bom filme?!

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