terça-feira, setembro 17, 2024

Crítica 2 | Não Fale o Mal: James McAvoy faz seu próprio espetáculo em boa versão pasteurizada de aclamado terror dinamarquês

Na inquietude dos olhares de canto, das diferenças culturais que cruzam os limites e no fator ensurdecedor de uma trilha sonora pulsante, enérgica e caótica, Não Fale o Mal passeou pelo Festival de Sundance 2022 como uma das produções mais chocantes daquela edição. Alvo das principais conversas entre uma sessão e outra, do intervalo de espera nos pontos de ônibus e das pequenas pausas nas cafeterias locais da pequena cidade de Park City, o longa dinamarquês permaneceu latente e emblemático até hoje por sua urgência. Os questionamentos jamais respondidos e as dúvidas que pairam tanto na audiência, bem como nos personagens, fazem do terror slasher o epicentro da originalidade do cinema mundial. Sem rompantes de heroísmo e fugindo das fórmulas padronizadas tão desgastadas de Hollywood, o filme de Christian Tafdrup e Mads Tafdrup é um vigoroso e assustador sopro de autenticidade.

não fale o mal 13
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Mas Não Fale o Mal, EUA – 2024, não é exatamente esse filme. E tudo bem. Se embriagando da fonte original dos irmãos Tafdrup, o cineasta James Watkins absorve a essência do sucesso dinamarquês, optando por jogar em um campo seguro. Obedecendo as diretrizes de uma Blumhouse que mais foca no cinema comercial e vez outra torce o nariz para o autoral, o remake americano segue a mesma cartilha de uma coletânea infindável de filmes de terror, onde as excessivas explicações e justificativas tentam encorpar as motivações dos vilões, mas apenas diluem o sombrio poder de suas atitudes perversas. Ainda assim, mesmo em um playground repleto de contenções, o diretor e roteirista se sai bem, usufrui do enorme entusiasmo de um James McAvoy absolutamente imerso em seu personagem e faz dessa versão mais “água com açúcar” um ótimo e divertido blockbuster.

Deixando de lado todas as nuances e sutilezas que tornam o original impregnante em nossas mentes e tão avassalador e único, Watkins se preocupa menos em impressionar e surpreender as audiências e se satisfaz com um terror mais pasteurizado, que parece ter saído de uma linha de produção. Mas ainda assim, trabalhar dentro do comum e da zona de conforto lhe cai bem. Aqui, ele entrega seu roteiro nas mãos de McAvoy, que cria um sensual e viril vilão fruto de uma amalgama de personagens populares da cultura online. Com traços de Andrew Tate na composição de Paddy, o talentoso ator escocês abusa de seu sotaque, é pedante em seus discursos e sabe criar a atmosfera mais desconfortável possível ao longo das quase duas horas de filme.

não fale o mal 2
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Tomando a trama inteiramente para si, sua presença inevitavelmente ofusca todas as demais, fazendo dos outros protagonistas meros espectadores do espetáculo que é James McAvoy. Uma força da natureza, ele nos arrebata em sua desconcertante hipersexualidade e constrói a tensão a seu redor a todo momento, sempre nos tragando para o seu doentio – e exageradamente óbvio – comportamento. Aisling Franciosi, Mackenzie Davis e Scoot McNairy completam o elenco com performances sólidas, mas é o pequeno Dan Hough que brilha ao lado do vilão, como um garotinho aflito que vive em constante estado de alerta. Juntos, eles são os responsáveis pela sombria atmosfera do terror, que faz de sua fotografia idílica e bucólica uma contraposição aos horrores que aguardam os fãs do gênero.

Com uma trilha sonora de menor impacto e algumas cenas desnecessárias que apenas reforçam a escassa habilidade de Hollywood em sair de sua zona de conforto, Não Fale o Mal pode não ser o melhor filme de gênero que se esperaria, mas é válido como uma aposta segura da Blumhouse. Aproveitando boa parte dos elementos do original, mas descartando a maior riqueza que poderia fazer da nova versão um hercúleo fôlego no cinema comercial, o longa de Watkins é mais um programa pipoca do que uma genuína e arrebatadora experiência cinematográfica. Mas trabalhando muito bem um vasto leque de jumpscares, com takes que exploram a dinâmica gato e rato tão popular do subgênero slasher, ele sabe extrair os sustos de seu público, com impulsos de violência que nos capturam. Tentando criar seu próprio final ousado, o cineasta acena uma vez mais para o material fonte, mas eventualmente recua, opta pelo caminho mais seguro e entrega uma versão americana que pode render boas bilheterias, mas facilmente será esquecida com o tempo.

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