sábado , 28 dezembro , 2024

Crítica | 2020 Nunca Mais – Netflix faz uma retrospectiva irônica em documentário ficcional engraçado

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O único consenso que podemos tirar desse ano é que ninguém previu tudo que aconteceu. 2020 foi o ano em que tudo saiu dos eixos no mundo inteiro, por isso, pela primeira vez, a Netflix resolveu criar uma retrospectiva reflexiva sobre os 365 dias que passaram, que chega agora à plataforma com o nome ‘2020 Nunca Mais’ – ou, no original, ‘Death to 2020’.



Com pouco mais de uma hora de duração, o documentário ficcional baseado em fatos reais é intercalado entre imagens de eventos que ocorreram no ano de 2020 e depoimentos de convidados, que dão suas impressões e opiniões sobre os fatos. Só que esses convidados – alguns “especialistas nos temas” – são totalmente ficcionais, ainda que seus relatos sejam beeeem parecidos com muita coisa que a gente andou ouvindo esse ano. Dentre eles destacam-se o professor de História Tennyson Foss (Hugh Grant), e a sutil maneira com que mistura a História real (com H maiúsculo) e sagas de ficção, como ‘Game of Thrones’ e ‘Star Wars’; a assessora da Casa Branca Jeanetta Grace Susan (Lisa Kudrow), uma negacionista cujo discurso se distorce de acordo com o que favorece aos conservadores; a Dra. Maggie Gravel (Leslie Jones), cujos comentários cansados são super lúcidos (até demais); o influencer Duke (Joe Keery), um alienado oportunista que ganhou milhões de seguidores e likes por “reagir” aos acontecimentos do ano em vídeos; e a superracista dona de casa e cidadã do bem Kathy Flowers (Cristin Milioti), que se acha uma mulher empática desde que os pretos e imigrantes se mantenham longe dela – sendo ela mesma uma mulher latina. Tudo isso conduzido pelas reflexões de Dash Bracket (Samuel L. Jackson), cujos diálogos parecem refletir a opinião do próprio ator.

A ver pelo perfil desses personagens, o roteiro de ‘2020 Nunca Mais’ – escrito por dezoito pessoas! – teve um apurado trabalho em traçar a narrativa de cada um deles, representando os tipos de pessoas que todos nós tivemos que lidar ao longo desse ano. E, embora todos sejam ficcionais, as respostas que esses personagens dão são tão reais, que incomodam – e talvez esse seja um dos principais pontos negativos do filme. É claro que o propósito geral é ser um irônico e debochado retrato resumido do que rolou nesse ano de 2020 (bem resumido mesmo, restringindo-se apenas aos acontecimentos dos Estados Unidos e da Inglaterra, e, neste universo, abordando apenas os assuntos da pandemia, das eleições nos EUA e os protestos raciais), mas o tom utilizado para a produção deixa um sabor amargo na boca, indo rapidamente das risadas nos primeiros minutos ao incômodo que faz fervilhar a raiva – afinal, todo esse negacionismo, relativismo, egoísmo e individualismo é que nos levaram ao ponto que estamos nesse 31 de dezembro.

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Apesar disso, a direção de Al Campbell e Alice Mathias consegue fazer uma interessante retrospectiva, bem ácida e mordaz, diferente da proposta inocente de ‘Borat 2’, mas que constrói uma linha expositiva interessante, coerente à assinatura Netflix. E, se tudo der certo (ou errado), podemos nos preparar, que no final de 2021 é bem capaz de termos um ‘2021 Nunca Mais’.

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Janda Montenegrohttp://cinepop.com.br
Escritora, autora de 6 livros, roteirista, assistente de direção. Doutora em Literatura Brasileira Indígena UFRJ.

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O único consenso que podemos tirar desse ano é que ninguém previu tudo que aconteceu. 2020 foi o ano em que tudo saiu dos eixos no mundo inteiro, por isso, pela primeira vez, a Netflix resolveu criar uma retrospectiva reflexiva sobre os 365 dias que passaram, que chega agora à plataforma com o nome ‘2020 Nunca Mais’ – ou, no original, ‘Death to 2020’.

Com pouco mais de uma hora de duração, o documentário ficcional baseado em fatos reais é intercalado entre imagens de eventos que ocorreram no ano de 2020 e depoimentos de convidados, que dão suas impressões e opiniões sobre os fatos. Só que esses convidados – alguns “especialistas nos temas” – são totalmente ficcionais, ainda que seus relatos sejam beeeem parecidos com muita coisa que a gente andou ouvindo esse ano. Dentre eles destacam-se o professor de História Tennyson Foss (Hugh Grant), e a sutil maneira com que mistura a História real (com H maiúsculo) e sagas de ficção, como ‘Game of Thrones’ e ‘Star Wars’; a assessora da Casa Branca Jeanetta Grace Susan (Lisa Kudrow), uma negacionista cujo discurso se distorce de acordo com o que favorece aos conservadores; a Dra. Maggie Gravel (Leslie Jones), cujos comentários cansados são super lúcidos (até demais); o influencer Duke (Joe Keery), um alienado oportunista que ganhou milhões de seguidores e likes por “reagir” aos acontecimentos do ano em vídeos; e a superracista dona de casa e cidadã do bem Kathy Flowers (Cristin Milioti), que se acha uma mulher empática desde que os pretos e imigrantes se mantenham longe dela – sendo ela mesma uma mulher latina. Tudo isso conduzido pelas reflexões de Dash Bracket (Samuel L. Jackson), cujos diálogos parecem refletir a opinião do próprio ator.

A ver pelo perfil desses personagens, o roteiro de ‘2020 Nunca Mais’ – escrito por dezoito pessoas! – teve um apurado trabalho em traçar a narrativa de cada um deles, representando os tipos de pessoas que todos nós tivemos que lidar ao longo desse ano. E, embora todos sejam ficcionais, as respostas que esses personagens dão são tão reais, que incomodam – e talvez esse seja um dos principais pontos negativos do filme. É claro que o propósito geral é ser um irônico e debochado retrato resumido do que rolou nesse ano de 2020 (bem resumido mesmo, restringindo-se apenas aos acontecimentos dos Estados Unidos e da Inglaterra, e, neste universo, abordando apenas os assuntos da pandemia, das eleições nos EUA e os protestos raciais), mas o tom utilizado para a produção deixa um sabor amargo na boca, indo rapidamente das risadas nos primeiros minutos ao incômodo que faz fervilhar a raiva – afinal, todo esse negacionismo, relativismo, egoísmo e individualismo é que nos levaram ao ponto que estamos nesse 31 de dezembro.

Apesar disso, a direção de Al Campbell e Alice Mathias consegue fazer uma interessante retrospectiva, bem ácida e mordaz, diferente da proposta inocente de ‘Borat 2’, mas que constrói uma linha expositiva interessante, coerente à assinatura Netflix. E, se tudo der certo (ou errado), podemos nos preparar, que no final de 2021 é bem capaz de termos um ‘2021 Nunca Mais’.

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