quinta-feira , 19 dezembro , 2024

Crítica | A Costureira de Sonhos – Uma singela mensagem de liberdade

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A possibilidade de investigar novos olhares e perspectivas é um dos primores do cinema, assim como redescobrir diferentes culturas. Em A Costureira de Sonhos (Sir), a diretora e roteirista Rohena Gera apresenta uma visão feminina da opressão patriarcal na sociedade indiana e como uma mulher simples pode romper barreiras por meio da sua perseverança e esforço para concretizar seus desejos.

Através da protagonista Ratna (Tillotama Shome), o roteiro nos envolve em uma dinâmica simples, mas conflituosa, ao deixar resplandecer a pureza dos anseios da personagem e as suas abnegações por conta dessa construção social. Para entendermos o cenário, vale lembrar que o casamento ainda é tratado como uma negociação na Índia, assim como em outros países do sul asiático, e a reputação da família é o bem mais precioso. Além disso, apenas em 2018, o adultério deixou de ser considerado crime na Índia.



Dados estes destaques, a sociedade em que Ratna está inserida é fundamental para entendê-la e admirar a sua benevolência diante das dificuldades. Ela trabalha como empregada doméstica na casa de Ashwin (Vivek Gomber), membro de uma rica família. Ele passa por um período depressivo após o fim de um relacionamento, enquanto Ratna batalha para pagar os estudos da irmã mais nova e aprender a costurar com o objetivo de tornar-se design de moda.

ACostureiraDeSonhos2

Ao longo da dinâmica patrão e empregada, vamos conhecendo pouco a pouco a personalidade de ambos. Conforme o tempo passa, é natural crescer uma afeição entre os dois. Ela tenta motivá-lo a não se deixar abater pela solidão e ele a apoia a encontrar um caminho para sua profissão. A beleza e a assertividade do filme estão exatamente nos detalhes do dia a dia, como observar Ratna executar o seu trabalho com humildade e lidar de forma resoluta com a opressão de sua posição.

Aos arredores desse processo, vemos a pobreza e riqueza da cidade de Mumbai misturar-se, tal como o relacionamento entre os protagonistas. Apesar da pouca idade, Ratna é determinada a encontrar soluções para seus problemas e não reclama do que não cabe a ela mudar. Seus diálogos com outra empregada nos transmite uma visão mais próxima de suas experiências e seus infortúnios no trabalho.

Quando tudo parece entrar nos eixos, um relacionamento amigável com o patrão e a possibilidade de fazer aulas de corte e costura, Ratna recebe a notícia de que sua irmã mais nova vai se casar e mudar para Mumbai, antes de terminar os estudos. A diretora evidencia que depois do casamento é uma decisão do marido deixar a mulher estudar ou trabalhar.

ACostureiraDeSonhos1

Pequenas questões do cotidiano de Ratna vão nos mostrando sua combalida liberdade. Por ser viúva, por exemplo, ela não pode estar presente na cerimônia de casamento da própria irmã, muito menos aparecer nas fotos. Por conta de sua vestimenta pobre, sua presença em uma loja de roupas é impugnada. Ela come sempre sentada no chão e com as mãos em razão de sua posição na pirâmide social. São vários singelos exemplos que recobrem essa mensagem e nos fazem admirar a personagem por lutar ao invés de ressentir-se.

Como uma mulher indiana, a diretora faz um ótimo trabalho sobre as perspectivas femininas inseridas nessa cultura. A Costureira de Sonhos tinha tudo para ser um romance com resquícios de novelas latino-americanas ou as comédias românticas de Hollywood, em que o patrão se apaixona pela empregada, ultrapassam as barreiras sociais e promovem de forma idiotizante um final feliz.

Graças ao talento de Rohena Gera, entretanto, A Costureira de Sonhos não segue por essa falácia de história. Embora Ashwin apaixone-se por Ratna, a resolução do embate entre o desejo e a perspectiva futura de vida, encontra uma saída real. Apesar de destacar a carência de ambos, o filme faz soar mais estridente o desejo de vida que ecoa dentro deles. A cena final é a concretização de que Ratna galgou algumas escadas, mas sem seguir por um atalho.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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A possibilidade de investigar novos olhares e perspectivas é um dos primores do cinema, assim como redescobrir diferentes culturas. Em A Costureira de Sonhos (Sir), a diretora e roteirista Rohena Gera apresenta uma visão feminina da opressão patriarcal na sociedade indiana e como uma mulher simples pode romper barreiras por meio da sua perseverança e esforço para concretizar seus desejos.

Através da protagonista Ratna (Tillotama Shome), o roteiro nos envolve em uma dinâmica simples, mas conflituosa, ao deixar resplandecer a pureza dos anseios da personagem e as suas abnegações por conta dessa construção social. Para entendermos o cenário, vale lembrar que o casamento ainda é tratado como uma negociação na Índia, assim como em outros países do sul asiático, e a reputação da família é o bem mais precioso. Além disso, apenas em 2018, o adultério deixou de ser considerado crime na Índia.

Dados estes destaques, a sociedade em que Ratna está inserida é fundamental para entendê-la e admirar a sua benevolência diante das dificuldades. Ela trabalha como empregada doméstica na casa de Ashwin (Vivek Gomber), membro de uma rica família. Ele passa por um período depressivo após o fim de um relacionamento, enquanto Ratna batalha para pagar os estudos da irmã mais nova e aprender a costurar com o objetivo de tornar-se design de moda.

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Ao longo da dinâmica patrão e empregada, vamos conhecendo pouco a pouco a personalidade de ambos. Conforme o tempo passa, é natural crescer uma afeição entre os dois. Ela tenta motivá-lo a não se deixar abater pela solidão e ele a apoia a encontrar um caminho para sua profissão. A beleza e a assertividade do filme estão exatamente nos detalhes do dia a dia, como observar Ratna executar o seu trabalho com humildade e lidar de forma resoluta com a opressão de sua posição.

Aos arredores desse processo, vemos a pobreza e riqueza da cidade de Mumbai misturar-se, tal como o relacionamento entre os protagonistas. Apesar da pouca idade, Ratna é determinada a encontrar soluções para seus problemas e não reclama do que não cabe a ela mudar. Seus diálogos com outra empregada nos transmite uma visão mais próxima de suas experiências e seus infortúnios no trabalho.

Quando tudo parece entrar nos eixos, um relacionamento amigável com o patrão e a possibilidade de fazer aulas de corte e costura, Ratna recebe a notícia de que sua irmã mais nova vai se casar e mudar para Mumbai, antes de terminar os estudos. A diretora evidencia que depois do casamento é uma decisão do marido deixar a mulher estudar ou trabalhar.

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Pequenas questões do cotidiano de Ratna vão nos mostrando sua combalida liberdade. Por ser viúva, por exemplo, ela não pode estar presente na cerimônia de casamento da própria irmã, muito menos aparecer nas fotos. Por conta de sua vestimenta pobre, sua presença em uma loja de roupas é impugnada. Ela come sempre sentada no chão e com as mãos em razão de sua posição na pirâmide social. São vários singelos exemplos que recobrem essa mensagem e nos fazem admirar a personagem por lutar ao invés de ressentir-se.

Como uma mulher indiana, a diretora faz um ótimo trabalho sobre as perspectivas femininas inseridas nessa cultura. A Costureira de Sonhos tinha tudo para ser um romance com resquícios de novelas latino-americanas ou as comédias românticas de Hollywood, em que o patrão se apaixona pela empregada, ultrapassam as barreiras sociais e promovem de forma idiotizante um final feliz.

Graças ao talento de Rohena Gera, entretanto, A Costureira de Sonhos não segue por essa falácia de história. Embora Ashwin apaixone-se por Ratna, a resolução do embate entre o desejo e a perspectiva futura de vida, encontra uma saída real. Apesar de destacar a carência de ambos, o filme faz soar mais estridente o desejo de vida que ecoa dentro deles. A cena final é a concretização de que Ratna galgou algumas escadas, mas sem seguir por um atalho.

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Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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