quarta-feira , 20 novembro , 2024

Crítica | ‘A Primeira Tentação de Cristo’ é um divertido, mas esquecível especial de Natal

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No ano passado, o conhecido grupo de comédia Porta dos Fundos lançou através da Netflix um deliciosamente blasfemo especial de Natal intitulado ‘Se Beber Não Ceie’. Apesar da controvérsia temática e da alvoroçada recepção por parte do público católico-evangélico, o episódio foi aclamado pela crítica especializada e inclusive levou o Emmy Internacional em 2019, fazendo jus ao seu talento e à sua satírica abordagem cômica. Logo, não foi nenhuma surpresa que a trupe voltaria para a plataforma de streaming na mesma época com mais uma chamativa produção chamada A Primeira Tentação de Cristo (uma releitura do clássico épico dramático A Última Tentação de Cristo). Entretanto, diferente das conquistas anteriores, o novo especial, apesar de acertar mais do que falhar, não tem o mesmo cuidado que o anterior e falha em concluir a si mesmo.

Mais uma vez, Rodrigo Van Der Put retorna à cadeira de direção e toma as rédeas desse capítulo “não autorizado” da Bíblia Sagrada, acrescentando elementos de pura descontração e proposital ironia de alguns dos momentos mais memoráveis da mitologia católica – dessa vez, girando em torno da volta de Jesus Cristo (Gregório Duvivier) de sua viagem de quarenta dias pelo deserto para casa. Quando chega lá, ele se depara com uma festa em celebração aos seus trinta anos e, inesperadamente, descobre segredos sobre sua verdadeira herança e que sua família não é quem diz ser.



Como já poderíamos esperar, o breve média-metragem não se poupa de incrustar essa narrativa de época com elementos da cultura pop contemporânea – fazendo uma perceptível e engraçada menção aos erros cenográficos de Game of Thrones (sim, estou falando do copo de café Starbucks esquecido em cima de uma tábula medieval) -, mas falha em encontrar um ritmo que se mantenha sólido até o final. De fato, os dois primeiros atos estruturam-se mais uma construção de causa e consequência crível que se inicia com uma breve esquete envolvendo os três Reis Magos e termina com a transcendental jornada psíquica que o protagonista faz para compreender sua missão na Terra. Porém, a produção em momento algum prenuncia a risível “batalha final” que se estende entre o que podemos apenas compreender como a forças do Bem e do Mal, deixando um rastro agridoce de pura ocasionalidade.

Entre os excessos e os deslizes, são José (Rafael Portugal) e Maria (Evelyn Castro). A conhecida personalidade de ambos os personagens é posta em xeque em prol de resumir aquilo que esperaríamos de um casal “interiorano”, marcado por uma dura criação: de um lado, Castro entrega-se a um desmedido retrato de Maria, tentando manter-se sã para contar ao filho que José não é seu pai, e que o anjo Gabriel foi enviado pelos céus para lhe presentear com o próximo messias da humanidade; do outro, José se recusa a aceitar a onipotência presunçosa de Deus (Antonio Tabet) e faz de tudo para mostrar que é o real pai de Jesus.

Dentre os múltiplos personagens apresentados, o roteiro abre espaço para convergi-los em uma única cronologia com começo, meio e fim; mesmo assim, as tentativas não alcançam completamente o que esperavam e acabam colocando de lado certas figuras apresentadas com grande potencialidade no começo, mas que são esquecidos em prol de uma “metáfora” entregue às pressas e trazido à tona com a chegada de Fábio Porchat como Orlando, um amigo e parceiro sexual que Jesus encontrou em suas andanças. Apesar do imediatismo dessa presença ser hilário, Porchat mais uma vez se vale de qualquer outra performance que já fez em sua carreira e rende-se a mais um pouco do mesmo – seja em seus maneirismos vocais, seja em sua aglutinação nada irrisória de praticamente todas as palavras de um diálogo.

Nenhum dos personagens traz consigo um arco consistente o bastante para que nos envolva (nem mesmo dentro dos espectros sarcásticos que sondam a produção). Jesus acaba tomando uma infusão de ervas alucinógenas que o leva numa viagem de autorreflexão ao lado de seres como Shiva, Buda e Jah, apenas para compreender o papel que seu pai “biológico” lhe deu; Orlando, após se aproximar dos membros daquela família, anuncia que é o novo filho de Deus e aproveita para se revelar como Lúcifer (o anjo que se rebelou contra os céus e caiu nas profundezas do Inferno). É a partir daí que uma pífia e incompreensível luta se trava entre os dois e termina do modo mais inacreditável – no pior sentido que se possa imaginar – possível.

Apesar de cumprir em partes com o que se compromete a entregar, A Primeira Tentação de Cristo não chega aos pés da iteração predecessora e acaba se valendo muito do choque narrativo para garantir o envolvimento do público. As falas não tão bem pensadas trazem um leve apreço por interessantes quebras de expectativa, mas não se sustentam por muito tempo e optam por uma resolução apressada, incabível e, ademais, esquecível.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Mais uma vez, Rodrigo Van Der Put retorna à cadeira de direção e toma as rédeas desse capítulo “não autorizado” da Bíblia Sagrada, acrescentando elementos de pura descontração e proposital ironia de alguns dos momentos mais memoráveis da mitologia católica – dessa vez, girando em torno da volta de Jesus Cristo (Gregório Duvivier) de sua viagem de quarenta dias pelo deserto para casa. Quando chega lá, ele se depara com uma festa em celebração aos seus trinta anos e, inesperadamente, descobre segredos sobre sua verdadeira herança e que sua família não é quem diz ser.

Como já poderíamos esperar, o breve média-metragem não se poupa de incrustar essa narrativa de época com elementos da cultura pop contemporânea – fazendo uma perceptível e engraçada menção aos erros cenográficos de Game of Thrones (sim, estou falando do copo de café Starbucks esquecido em cima de uma tábula medieval) -, mas falha em encontrar um ritmo que se mantenha sólido até o final. De fato, os dois primeiros atos estruturam-se mais uma construção de causa e consequência crível que se inicia com uma breve esquete envolvendo os três Reis Magos e termina com a transcendental jornada psíquica que o protagonista faz para compreender sua missão na Terra. Porém, a produção em momento algum prenuncia a risível “batalha final” que se estende entre o que podemos apenas compreender como a forças do Bem e do Mal, deixando um rastro agridoce de pura ocasionalidade.

Entre os excessos e os deslizes, são José (Rafael Portugal) e Maria (Evelyn Castro). A conhecida personalidade de ambos os personagens é posta em xeque em prol de resumir aquilo que esperaríamos de um casal “interiorano”, marcado por uma dura criação: de um lado, Castro entrega-se a um desmedido retrato de Maria, tentando manter-se sã para contar ao filho que José não é seu pai, e que o anjo Gabriel foi enviado pelos céus para lhe presentear com o próximo messias da humanidade; do outro, José se recusa a aceitar a onipotência presunçosa de Deus (Antonio Tabet) e faz de tudo para mostrar que é o real pai de Jesus.

Dentre os múltiplos personagens apresentados, o roteiro abre espaço para convergi-los em uma única cronologia com começo, meio e fim; mesmo assim, as tentativas não alcançam completamente o que esperavam e acabam colocando de lado certas figuras apresentadas com grande potencialidade no começo, mas que são esquecidos em prol de uma “metáfora” entregue às pressas e trazido à tona com a chegada de Fábio Porchat como Orlando, um amigo e parceiro sexual que Jesus encontrou em suas andanças. Apesar do imediatismo dessa presença ser hilário, Porchat mais uma vez se vale de qualquer outra performance que já fez em sua carreira e rende-se a mais um pouco do mesmo – seja em seus maneirismos vocais, seja em sua aglutinação nada irrisória de praticamente todas as palavras de um diálogo.

Nenhum dos personagens traz consigo um arco consistente o bastante para que nos envolva (nem mesmo dentro dos espectros sarcásticos que sondam a produção). Jesus acaba tomando uma infusão de ervas alucinógenas que o leva numa viagem de autorreflexão ao lado de seres como Shiva, Buda e Jah, apenas para compreender o papel que seu pai “biológico” lhe deu; Orlando, após se aproximar dos membros daquela família, anuncia que é o novo filho de Deus e aproveita para se revelar como Lúcifer (o anjo que se rebelou contra os céus e caiu nas profundezas do Inferno). É a partir daí que uma pífia e incompreensível luta se trava entre os dois e termina do modo mais inacreditável – no pior sentido que se possa imaginar – possível.

Apesar de cumprir em partes com o que se compromete a entregar, A Primeira Tentação de Cristo não chega aos pés da iteração predecessora e acaba se valendo muito do choque narrativo para garantir o envolvimento do público. As falas não tão bem pensadas trazem um leve apreço por interessantes quebras de expectativa, mas não se sustentam por muito tempo e optam por uma resolução apressada, incabível e, ademais, esquecível.

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Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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