Enquanto somos jovens, passamos um tanto ilesos ao teste do tempo. Como aqueles que continuam seguindo o timing da atualidade, lideramos, estamos à frente, somos tendência. A velhice muda essa chave e faz do que era atual um relicário. E raramente pensamos nisso: no tempo e todas as rugas físicas e emocionais que ele traz consigo. Sempre aliado às nossas escolhas, ele também é o compasso da vida que levamos na juventude. Em A Vida de Diane, a personagem homônima é vítima do tempo e vê seus dias passarem diante de si entre mortes de parentes, um filho viciado em drogas e uma vida monótona que lhe renderam uma solidão absoluta.
Pelas lentes de Kent Jones, Mary Kay Place é sublime como uma senhora que testemunha o tempo como alguém que não mais tem forças para correr atrás dele. Cansada de uma vida levada em virtude dos vícios de seu filho, ela sofre para recuperar o fôlego e vive um momento extremamente particular e peculiar – pelo qual todos passaremos: a velhice diante da morte. Mas não dela e sim a daqueles que o cercam. Entre horas gastas no hospital e uma adrenalina impulsiva natural de uma mãe cujo filho é dependente químico, ela administra seus dias também entre um trabalho voluntário, oferecendo refeições para pessoas pobres. Pacata até demais, sua vida hoje é também um reflexo de seus excessos de uma juventude instintiva demais.
E como um filme que quer ser desconfortável, A Vida de Diane trata o mórbido – essa fase horrorosa onde velórios são mais frequentes que aniversários – com uma leveza surpreendente, levando a audiência a refletir sobre esse temido momento natural da vida. E ao ponderarmos sobre a nossa protagonista, instintivamente nos questionamos sobre quando e como chegaremos a esse hiato final. Aterrorizante na medida, o drama produzido por Martin Scorsese é essa mistura antagônica de sentimentos. É um genuíno retrato da vida. Talvez diferente do que gostaríamos de ver nas telas, mas autêntico e realista como raramente se vê no cinema.
E aqui, a assinatura do aclamado Scorsese é honrada. O filme possui a mesma perspectiva um tanto depreciativa sobre certas coisas da vida, assim como sua grandiosa obra costuma trazer. Como um filme focado nos comportamentos humanos e – mais precisamente – nos dissabores de uma mãe sozinha e solitária, A Vida de Diane é cinema de qualidade, não é do tipo para desestressar e não te deixará a ver navios. Te entregando uma obra com começo, meio e fim (literalmente), o drama promove questionamentos, aborda a tortuosa dinâmica familiar de Diane com maestria, sempre mantendo a delicadeza que as circunstâncias da vida costumam trazer.
Com uma fotografia gélida que explora apenas o frio invernal, ao longo dos anos, de maneira simbólica – sempre o associando à solidão da protagonista, A Vida de Diane ainda conta com a boa atuação do pouco conhecido Jake Lacy, que explora seu tempo de tela com precisão, retratando os maneirismos que acompanham o vício com uma naturalidade certeira. Poderoso e bem dirigido, o longa é um canalizador de emoções, entregando todas elas para a audiência em uma bandeja de prata, promovendo um debate importante sobre o tempo que temos e a maneira como o honramos durante os anos que nos foram reservados.