terça-feira , 5 novembro , 2024

Crítica | ‘Bonnie e Clyde’ encerra sua temporada em São Paulo com espetáculo memorável

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São poucas as pessoas que nunca ouviram falar da história de Bonnie Parker e Clyde Barrow. A dupla improvável se tornou extremamente conhecida nos anos 1920, à época da Grande Depressão, em que conquistaram um status controverso de heróis por fazerem o necessário para sobreviverem em meio a um cenário de devastação e fome. Não é surpresa que, depois de terem sua história levada aos cinemas e à televisão, ganhariam uma adaptação teatral na Broadway que se tornaria um sucesso de público. E, quase uma década e meia depois de sua estreia nos Estados Unidos, o musical Bonnie & Clyde chegou ao São Paulo e encerrou uma ótima temporada neste último domingo, 14 de maio.

A trama acompanha os personagens titulares, interpretados por Eline Porto e Beto Sargentelli, apresentando ao público dois jovens com sonhos que, eventualmente, não se realizam. Bonnie quer ser famosa, uma estrela de cinema e uma poeta, e sonha com o momento em que sua foto estará estampada em revistas e enfeitando outdoors; Clyde, por sua vez, tem uma propensão ao errado e carrega como ídolos o pistoleiro Billy the Kid e o mafioso Al Capone. Ambos têm um desejo em comum: a fama. E, de certa forma, a peça discorre sobre o assunto tendo como máscara uma história de amor que atravessou gerações. Afinal, em um lugar como o subúrbio industrial de West Dallas, as coisas não parecem muito prósperas – e os dois se veem em um beco sem saída, mergulhados em frustrantes esperanças que nunca se concretizam.

Porém, depois que se conhecem por um acaso, Bonnie e Clyde começam a desfrutar de um apreço pela vida que foi acendido de forma quase simbiótica. Apesar da vida criminal de Clyde ao lado do irmão, Buck (Claudio Lins), Bonnie se sente atraída de forma inexplicável – e a recíproca também é verdadeira. Não é surpresa que, pouco antes do encerramento do primeiro ato, ambos unem forças para partir em uma aventura inenarrável, movida a roubos e ao enfrentamento de uma justiça que insistia em deixá-los estagnados. E a jornada é apenas um dos muitos pontos altos dessa versão que não deve nada à original.

É quase óbvio falar que o elenco é o principal elemento: Porto e Sargentelli, que são um casal na vida real, desfrutam de uma química apaixonante, que oscila entre o amor, a sedução e a luxúria de modo envolvente e que nos leva em uma insana valsa regada a balas e a revólveres; Lins insurge como o bem-vindo escape cômico da narrativa como Buck, dividindo boa parte das cenas com a irretocável Mariana Gallindo como Blanche (originalmente interpretada por Adriana Del Claro), que nos arremessa de volta para os anos 1920 no momento em que solta a voz na canção “Você Volta pra Prisão”. Como se não bastasse, o quarteto supracitado abraça com tanta vontade os personagens que torna o trabalho de espectador muito mais fácil e divertido – nos convidando a uma montanha-russa de sentimentos que perdura muito depois da peça terminar.

A adaptação brasileira tem um quê de diferencial, principalmente por arquitetar uma experiência bastante imersiva que funde o público com o palco em um único organismo vivo. A própria ambientação, feita no 033 Rooftop, nos remete ao Oeste dos Estados Unidos, enclausurada em uma espécie de cabaré western e pincelada com tons de vermelho e de azul que se transmutam à medida que os arcos se desenrolam – e, ainda que as duas horas demorem a passar pelos assentos poucos confortáveis, conseguimos até esquecer um pouco a dor na lombar para apreciar a atuação e o cuidado com o cenário.

Devo também mencionar o trabalho exímio da banda que acompanha as canções, contribuindo novamente para a atmosfera à medida que recupera o bluegrass, o blue e o gospel das canções originais, incrementando-as com sutis brasilidades – como é de costume quando musicais da Broadway vêm para cá. É quase impossível não começar a se remexer na cadeira quando o violoncelo, o clarinete e a bateria se fundem em um só em uma explosão de narcóticas sensações.

Bonnie & Clyde vai deixar saudades – mas isso não quer dizer que não tenha terminado numa nota agridoce. Pelo contrário, as apresentações finais da produção entregaram a mesma paixão de antes e trouxeram uma experiência não muito usual no circuito teatral nacional. Agora, podemos reviver as memórias dia após dia e esperar que, caso tudo dê certo, a temporada se estenda por mais algum tempo.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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A trama acompanha os personagens titulares, interpretados por Eline Porto e Beto Sargentelli, apresentando ao público dois jovens com sonhos que, eventualmente, não se realizam. Bonnie quer ser famosa, uma estrela de cinema e uma poeta, e sonha com o momento em que sua foto estará estampada em revistas e enfeitando outdoors; Clyde, por sua vez, tem uma propensão ao errado e carrega como ídolos o pistoleiro Billy the Kid e o mafioso Al Capone. Ambos têm um desejo em comum: a fama. E, de certa forma, a peça discorre sobre o assunto tendo como máscara uma história de amor que atravessou gerações. Afinal, em um lugar como o subúrbio industrial de West Dallas, as coisas não parecem muito prósperas – e os dois se veem em um beco sem saída, mergulhados em frustrantes esperanças que nunca se concretizam.

Porém, depois que se conhecem por um acaso, Bonnie e Clyde começam a desfrutar de um apreço pela vida que foi acendido de forma quase simbiótica. Apesar da vida criminal de Clyde ao lado do irmão, Buck (Claudio Lins), Bonnie se sente atraída de forma inexplicável – e a recíproca também é verdadeira. Não é surpresa que, pouco antes do encerramento do primeiro ato, ambos unem forças para partir em uma aventura inenarrável, movida a roubos e ao enfrentamento de uma justiça que insistia em deixá-los estagnados. E a jornada é apenas um dos muitos pontos altos dessa versão que não deve nada à original.

É quase óbvio falar que o elenco é o principal elemento: Porto e Sargentelli, que são um casal na vida real, desfrutam de uma química apaixonante, que oscila entre o amor, a sedução e a luxúria de modo envolvente e que nos leva em uma insana valsa regada a balas e a revólveres; Lins insurge como o bem-vindo escape cômico da narrativa como Buck, dividindo boa parte das cenas com a irretocável Mariana Gallindo como Blanche (originalmente interpretada por Adriana Del Claro), que nos arremessa de volta para os anos 1920 no momento em que solta a voz na canção “Você Volta pra Prisão”. Como se não bastasse, o quarteto supracitado abraça com tanta vontade os personagens que torna o trabalho de espectador muito mais fácil e divertido – nos convidando a uma montanha-russa de sentimentos que perdura muito depois da peça terminar.

A adaptação brasileira tem um quê de diferencial, principalmente por arquitetar uma experiência bastante imersiva que funde o público com o palco em um único organismo vivo. A própria ambientação, feita no 033 Rooftop, nos remete ao Oeste dos Estados Unidos, enclausurada em uma espécie de cabaré western e pincelada com tons de vermelho e de azul que se transmutam à medida que os arcos se desenrolam – e, ainda que as duas horas demorem a passar pelos assentos poucos confortáveis, conseguimos até esquecer um pouco a dor na lombar para apreciar a atuação e o cuidado com o cenário.

Devo também mencionar o trabalho exímio da banda que acompanha as canções, contribuindo novamente para a atmosfera à medida que recupera o bluegrass, o blue e o gospel das canções originais, incrementando-as com sutis brasilidades – como é de costume quando musicais da Broadway vêm para cá. É quase impossível não começar a se remexer na cadeira quando o violoncelo, o clarinete e a bateria se fundem em um só em uma explosão de narcóticas sensações.

Bonnie & Clyde vai deixar saudades – mas isso não quer dizer que não tenha terminado numa nota agridoce. Pelo contrário, as apresentações finais da produção entregaram a mesma paixão de antes e trouxeram uma experiência não muito usual no circuito teatral nacional. Agora, podemos reviver as memórias dia após dia e esperar que, caso tudo dê certo, a temporada se estenda por mais algum tempo.

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Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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