Nunca falamos tanto sobre a importância da representação e da representatividade quanto nesta última década. As atuais gerações estão completamente antenadas nestas pautas e reivindicando ver-se representados em todos os campos de atuação, inclusive na política. Porém, quando o recorte da pauta é o gênero, o número de representantes da comunidade LGBTQIAP+ cai drasticamente quando levamos em consideração o espaço da política brasileira. Numa tentativa de registrar o momento social com o maior número de candidates LGBTQIAP+, durante as eleições de 2020, surge o documentário ‘Corpolítica’, vencedor em sua categoria no Festival do Rio de 2022 e que estreia a partir deste feriado de Corpus Christi nas salas de cinema do país – às vésperas da Parada do Orgulho em São Paulo, a maior da América Latina.
Partindo da contradição entre duas constatações – o Brasil ser o país que mais mata LGBTs no mundo e o ano de 2020 ter registrado o maior número de candidates que se reconhecem publicamente como pessoas pertencentes ao grupo de alguma letra dessa sigla – o documentário busca acompanhar a tensão dessas duas polaridades dentro de um cenário em que ainda vivíamos o contexto da pandemia do coronavírus e os primeiros estudos sobre uma vacina ainda estavam começando a ser divulgados.
É relevante considerar este ponto para entender as inúmeras superações que a produção teve que fazer para registrar o momento, apesar dos impedimentos. Talvez isso tenha prejudicado a captação de som devido ao uso de máscara, o distanciamento para as gravações e uma aparente economia de microfone, que, quando havia mais de uma pessoa em cena, captava melhor o som de um entrevistade em detrimento do outre.
Escrito e dirigido pelo ótimo Pedro Henrique França e com produção do ator Marco Pigossi (o protagonista de ‘Cidade Invisível’) a junção dessas duas forças de vontade encaminha o desenrolar das entrevistas alinhado bem o objetivo da produção: retratar candidates que estavam surgindo naquele momento, especialmente no eixo Rio-São Paulo, mas sem deixar de observar nomes que estavam e ainda estão fazendo suas vozes serem ouvidas nas outras regiões do país. Como personagens fixos, acompanhamos a campanha dele Mônica Benicio, Erika Hilton, De Lucca e Andréa Bak, os quatro com investimentos financeiros e estratégias diferentes para tentar alcançar o eleitor.
Ao longo de 1 hora e 40 o espectador acompanha os diferentes esforços desses personagens, intercalados por depoimentos de outros candidatos de outras instâncias do governo, já em seus mandatos, como Jean Wyllys e Thammy Miranda, mostrando discursos que se inclinam tanto para a esquerda quanto para a direita conservadora. Como contraste a produção sinaliza como há muito tempo políticos como Jair Bolsonaro e Marco Siciliano vêm cerceando o direito de fala e os direitos como um todo das populações LGBTQIA+ de serem representadas nos 3 poderes, ao mesmo tempo que toleraram com mais parcimônia a presença de políticos como Clodovil no mesmo ambiente que eles.
É importante que ‘Corpolítica’ seja lançado no circuito, especialmente neste mês de junho, o mês do orgulho, para que se estimulem debates sobre a importância de eleger políticos que representem que defendem as pautas particulares de cada um desses grupos, pois somente assim o coletivo conseguirá avançar na luta por direitos. ‘Corpolítica’ é, também um filme para rever em 2024.