Todo ator quer uma oportunidade de mostrar todo o seu potencial. Às vezes é preciso aceitar papéis com os quais não se identifique, em prol de construir um nome, uma carreira, mas, invariavelmente, todo ator ou atriz quer uma oportunidade de mostrar que consegue decorar textos imensos, que topa produção de baixo orçamento, que protagoniza filmes ou peças em que toda a história se debruça sobre sua capacidade de atuação. Esse é mais ou menos o estímulo em ‘Daddio’, filme estadunidense que já estreou lá fora e teve exibições especiais durante o Festival do Rio 2024, mas que, por enquanto, não tem previsão de estreia nos cinemas ou nos streamings no Brasil.
Uma jovem mulher (Dakota Johnson, de ‘Madame Teia’) desembarca no aeroporto JFK em Nova York e pede um táxi. Após embarcar, ela contempla a paisagem da cidade enquanto reflete sobre sua vida e as decisões que precisa tomar. Ao longo do trajeto, o motorista do táxi vai puxando assunto, e ela vai conversando com ele até descobrir que seu nome é Clark (Sean Penn, vencedor do Oscar por ‘Sobre Meninos e Lobos’). Enquanto atravessam a longa distância entre o aeroporto e Manhattan, os dois conversam sobre diversos assuntos, inclusive sobre questões pessoais as quais nunca falaram para nenhuma outra pessoa.
Escrito e dirigido por Christy Hall (que também compôs roteiros de ‘I’m Not Okay With This’, da Netflix, e ‘É Assim Que Acaba’), a diretora parte do encontro da casualidade para tecer uma profunda análise social e comportamental do cidadão comum. Nesse sentido, retira tudo que é excesso em uma produção (locações, cenários, efeitos especiais, figuração) e elabora uma história que se confia basicamente no diálogo e na capacidade de atuação do elenco escolhido, e esse é o grande apoio que o longa recebe.
Se é no potencial interpretativo que o filme se debruça, fica também, evidente, o abismo que existe entre Dakota Johnson e Sean Penn. Dakota, uma vez mais, faz o papel de uma jovem mulher tímida, que pouco fala (e quando o faz, fala baixo), uma presa fácil nesse mundão selvagem da cidade grande; Sean, por sua vez, constrói um motorista de táxi chatinho no início, uma vez que fica puxando assunto, mas aos poucos vai se mostrando aquele canastrão sedutor que no fundo, no fundo, sabemos que é mau caráter, mas a forma simpática com que ele fala simplesmente atrai qualquer olhar. Nesse abismo, perto de Sean Penn Dakota Johnson, através de sua personagem sem nome, parece uma bobinha frágil prestes a ser engolida (como a Anastacia de ‘Cinquenta Tons de Cinza’), com muitos closes e cujas características são tão envolvidas nos clichês, que o espectador consegue adivinhar e antecipar o background dessa personagem. E, aí, facilita o carisma de Penn em conquistar o espectador em favor do seu Clark.
‘Daddio’ tem aquela vibe de teatro off-Broadway, em que os atores estão ali pelo texto, pela arte, e não pelo glamour. O filme poderia ser uma longa sessão de terapia um consultório, mas faz uma boa escolha em trocar o profissional da saúde mental por um motorista de táxi, que é o psicólogo da prática. Um road trip com cara de festival mesmo, e que vale por mais uma ótima atuação de Sean Penn.