Park Chan-wook já pode ser considerado um diretor consagrado no circuito. Muito antes de ‘Parasita’, ‘BTS’ e outros elementos mais pop da cultura sul-coreana explodirem em sucesso mundial nos últimos anos, Park Chan-wook já vinha despertando os olhos do ocidente para o que vinha sendo produzido artisticamente na parte sul da ilha da Coreia. Sua carreira teve grande popularização mundial no princípio dos anos 2000 (muito graças aos festivais de cinema mundiais, como o Festival do Rio, que ajudou a trazer seus filmes para o Brasil) com os bombásticos ‘Oldboy’ (2003) e ‘Lady Vingança’ (2005). Agora, depois de um hiato de oito anos desde seu último filme, ‘A Criada’ (2016), Park Chan-wook volta a abrilhantar os cinemas mundiais com seu novo thriller policial ‘Decisão de Partir’, que está na lista dos 15 pré-selecionados ao Oscar 2023 de Melhor Filme Internacional.
Jang Hae-joon (Park Hae-il) é um ótimo investigador policial, mas sofre de insônia por conta dos múltiplos casos sem solução que enfrenta em sua carreira. Com um casamento feliz e estável com Jeong-ahn (Lee Jung-hyun), sua vida é uma rotina sem fim entre os dias afastados na cidade por conta das investigações e os dias que passa com sua esposa no interior. Tudo muda quando, certo dia, é chamado para apurar o suposto acidente de um homem, que teria caído do alto de uma montanha após se desequilibrar fazendo alpinismo. É aí que ele conhece a viúva Song Seo-rae (Tang Wei), uma misteriosíssima imigrante chinesa que, logo de cara, desperta a atenção e a curiosidade do investigador. O problema é que quanto mais Jang Hae-joon busca a verdade, mais parece que ela escapa por entre seus dedos… ela e a viúva Song Seo-rae…
Ao contrário dos vingativos filmes que o tornaram popular no início do milênio, em ‘Decisão de Partir’ o diretor Park Chan-wook explora muito mais as possibilidades da verdade, sem se preocupar em definir apenas uma vertente para seu filme. De certa forma, é isso que alimenta sua produção por mais de duas horas e vinte de duração – e, vamos lá, dava para fazer em menos tempo, dava para abrir mão de algumas cenas. Para construir essa história cheia de possibilidades o roteiro escrito por ele e Jeong Seo-kyeong parte de um protagonista masculino comum que, diante do mistério da vida, passa a questionar suas próprias convicções, retratando a viúva Song Seo-rae como uma enigmática Monalisa (não à toa, um dos pôsteres do filme traz a personagem tal qual a pintura de Da Vinci).
O ritmo do filme acompanha o desenrolar dos acontecimentos, ou seja, tudo vai se construindo a seu tempo, indo e vindo muitas vezes na linha temporal para preencher lacunas do enredo que o roteiro vai disponibilizando ao espectador à medida que o protagonista avança em sua investigação obcecada – o que nos remete a uma narrativa bastante Brian de Palma e ao suspense argentino ‘O Segredo dos seus Olhos’, vencedor do Oscar de filme internacional em 2010.
Na incógnita que ronda o mistério do acidente/suicídio/homicídio, o filme se desenrola para além do thriller policial (afinal, o protagonista é policial) e do romance, partindo desse mote para, na real, investigar as relações humanas, os mistérios que envolvem nossas tomadas de decisão, o impulso que direciona boa parte das nossas ações e os julgamentos consequentes, mesmo considerando-nos bons cidadãos. Através de uma fotografia belíssima que sempre favorece as emoções de seus personagens, ‘Decisão de Partir’ é um filme obra-de-arte, em todos os sentidos, e justifica estar entre os melhores do ano para a estatueta dourada. Felizmente chega aos cinemas brasileiros já na primeira semana de 2023.