sexta-feira , 22 novembro , 2024

Crítica | Demi Lovato entrega um íntimo e tocante álbum com ‘Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’

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A última aventura musical de Demi Lovato aconteceu há quatro anos, com o lançamento do bem recebido e amadurecido Tell Me You Love Me. Trazendo temáticas como empoderamento, amor e decepção para os ouvidos de seus fãs, Demi parecia prever que algo adverso estava para acontecer em sua vida – que se concretizou com sua recaída às drogas e uma perigosa overdose que quase tirou sua vida. Após criar a tocante “Sober”, a artista, outrora parte da imensa família do Disney Channel, abriu-se acerca de assédio sexual e de depressão, construindo a propositalmente sombria “Anyone” e apresentando-a numa aplaudível rendição na cerimônia do 62º Grammy Awards.

Agora, em 2021, Lovato mostrou-se pronta para compartilhar com o mundo a jornada mais íntima de sua carreira, cujos capítulos foram pacientemente escritos para realizar uma autocrítica e convidar o público a conhecer a própria aventura na qual se lançou. O resultado, acompanhado de um aclamado documentário seriado homônimo, tomou forma em Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’, literalmente mergulhando num fenício renascimento não só de sua carreira, mas de como enxerga a si mesma. E é nessa nova empreitada que a performer reencontra a voz que, anteriormente, havia lhe dado voz para entender o que de errado existia no mundo e de que forma ela se deixou levar por presenças tóxicas que a impediam de ser quem realmente é.



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Além da já mencionada canção, dois outros singles se originaram para dar início ao álbum. Temos, de um lado, a profunda colaboração entre Demi e Sam Fischer, “What Other People Say”: a faixa havia sido escrita por Fischer há bastante tempo e, segundo ele mesmo, sempre soube que estava destinada a uma rendição em dueto. Tal foi sua sorte quando Lovato, uma das grandes cantoras de sua geração, cruzou com ele e resolveu emprestar seus belíssimos vocais a um enredo que fala, essencialmente, sobre ressentimento. “Pensei que, quando crescesse, seria igual àqueles que me deram meu sobrenome” é apenas o prólogo de uma reflexão sobre fazer escolhas erradas e deixar que outras pessoas te moldem, fazendo com se esqueça daqueles que sempre te apoiaram e abandonando uma personalidade que não tinha nada de errado para início de conversa.

A produção ganha força exponencial quando aliada a outras incursões elegíacas da década passada, nutrindo de similaridades com as faixas de Lucas Graham e Hozier enquanto marcha a um som único e acolhedor, dizendo, com todas as palavras, que não estamos sozinhos. E o mesmo estende-se para Dancing with the Devil, um soul-rock à la James Bond que mistura sensualidade e acidez em um único lugar. Flertando com o perigo narcótico daquilo que nos dá um pouco de tranquilidade, Demi pede desculpas da forma mais indesculpável possível por ter dançado com o diabo e ter se deixado levar pelo que lhe dava prazer.

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Antes de dar início oficial à trama que promove no breve prólogo, a cantora e compositora deixa claro que não trata de impessoalidade: em um processo de cura existencialista e bastante cautelosa, ela tem todas as cartas na mão para decidir como, quando e onde contar sua história, sem influências externas e sem cair nas armadilhas do sensacionalismo midiático. “ICU (Madison’s Lullabye)”, nesse contexto, transforma-se em um poderoso pedido de desculpas à meia irmã, Madison De La Garza, a qual não conseguiu reconhecer depois de acordar na cama do hospital – não chegando nem mesmo a compreender de quem era a voz que a acompanhava. Fazendo as pazes consigo mesma e deixando que os demônios de um passado não muito distante, ela agora pode contar aos fãs tudo que querem saber.

Mais incisivamente do que nunca, Demi une-se a diversas powerhouses da indústria musical para auxiliarem nesse heroico arco – acertando em grande parte, apesar de certos equívocos cometidos pelo caminho. Temos o supracitado dueto com Fischer; a elegíaca e evocativa “Easy”, dramatizada ao lado de Noah Cyrus em um turbilhão orquestral de piano e violinos; “My Girlfriends Are My Boyfriend”, que a une com a rapper Saweetie e dá espaço para construções feministas movidas pelo pop-noir e pelo rap; e a aguardada “Met Him Last Night” – aliando-se à Ariana Grande e aproveitando as conhecidas incursões da artista para arquitetar uma sólida, ainda que dissonante estrutura future-trap, que falha em encaixar-se com perfeição espontânea ao restante do álbum.

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É inegável dizer que a obra esbarra em alguns deslizes, principalmente pela exorbitante quantidade de faixas. “15 Minutes” se dispersa em uma zona de conforto repetitiva e levemente reciclada, como se tivesse sido aproveitada rapidamente das tracks antecessoras – e o mesmo ocorre com “California Sober” (uma canção que poderia ter sido retirada sem quaisquer perdas grandes). “Butterfly”, terminando um épico conto que começou ainda em suas primeiras inflexões, também falha ao esquecer-se de um crescendo catártico e se render à frustração comedida das obviedades instrumentais.

Felizmente, Lovato mostra que tem controle criativo, estético e crítico sobre as mensagens que deseja entregar a quem estiver disposto a ouvir. Suas obrigatoriedades passadas dão lugar a uma conhecida ironia que é traduzida na divertida “Melon Cake”, que retoma um infausto episódio de aniversário, enquanto o country-pop dá as caras na belíssima “The Way You Don’t Look At Me”. Apostando fichas no indie pop-rock e na folktronica, Demi nos presenteia com “Carefully” e “The Kind Of Lover I Am”, bem como uma coesa e mais teatral interpretação da clássica “Mad World”.

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Dizer que Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’ é o amadurecimento de Demi Lovato é criar um eufemismo barato que não explana a importância do álbum para sua própria vida. A cantora, entrando em consenso com todos os momentos pelos quais passou, abre-se como um livro, estampando cada página com uma frase avassaladora e humilde: “esta sou eu, nua e crua”.

Nota por faixa:

1. Anyone – 4,5/5
2. Dancing with the Devil – 5/5
3. ICU (Madison’s Lullabye) –  4,5/5
4. Intro – 5/5
5. The Art of Starting Over – 4,5/5
6. Lonely People – 4/5
7. The Way You Don’t Look at Me – 5/5
8. Melon Cake – 4,5/5
9. Met Him Last Night (com Ariana Grande) – 3,5/5
10. What Other People Say (com Sam Fischer) – 4,5/5
11. Carefully – 4,5/5
12. The Kind of Lover I Am – 4,5/5
13. Easy (feat. Noah Cyrus) – 5/5
14. 15 minutes – 3/5
15. Girlfriends Are My Boyfriends (feat. Saweetie) – 5/5
16. California Sober – 2/5
17. Mad World – 5/5
18. Butterfly – 3/5
19. Good Place – 4/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Agora, em 2021, Lovato mostrou-se pronta para compartilhar com o mundo a jornada mais íntima de sua carreira, cujos capítulos foram pacientemente escritos para realizar uma autocrítica e convidar o público a conhecer a própria aventura na qual se lançou. O resultado, acompanhado de um aclamado documentário seriado homônimo, tomou forma em Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’, literalmente mergulhando num fenício renascimento não só de sua carreira, mas de como enxerga a si mesma. E é nessa nova empreitada que a performer reencontra a voz que, anteriormente, havia lhe dado voz para entender o que de errado existia no mundo e de que forma ela se deixou levar por presenças tóxicas que a impediam de ser quem realmente é.

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Além da já mencionada canção, dois outros singles se originaram para dar início ao álbum. Temos, de um lado, a profunda colaboração entre Demi e Sam Fischer, “What Other People Say”: a faixa havia sido escrita por Fischer há bastante tempo e, segundo ele mesmo, sempre soube que estava destinada a uma rendição em dueto. Tal foi sua sorte quando Lovato, uma das grandes cantoras de sua geração, cruzou com ele e resolveu emprestar seus belíssimos vocais a um enredo que fala, essencialmente, sobre ressentimento. “Pensei que, quando crescesse, seria igual àqueles que me deram meu sobrenome” é apenas o prólogo de uma reflexão sobre fazer escolhas erradas e deixar que outras pessoas te moldem, fazendo com se esqueça daqueles que sempre te apoiaram e abandonando uma personalidade que não tinha nada de errado para início de conversa.

A produção ganha força exponencial quando aliada a outras incursões elegíacas da década passada, nutrindo de similaridades com as faixas de Lucas Graham e Hozier enquanto marcha a um som único e acolhedor, dizendo, com todas as palavras, que não estamos sozinhos. E o mesmo estende-se para Dancing with the Devil, um soul-rock à la James Bond que mistura sensualidade e acidez em um único lugar. Flertando com o perigo narcótico daquilo que nos dá um pouco de tranquilidade, Demi pede desculpas da forma mais indesculpável possível por ter dançado com o diabo e ter se deixado levar pelo que lhe dava prazer.

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Antes de dar início oficial à trama que promove no breve prólogo, a cantora e compositora deixa claro que não trata de impessoalidade: em um processo de cura existencialista e bastante cautelosa, ela tem todas as cartas na mão para decidir como, quando e onde contar sua história, sem influências externas e sem cair nas armadilhas do sensacionalismo midiático. “ICU (Madison’s Lullabye)”, nesse contexto, transforma-se em um poderoso pedido de desculpas à meia irmã, Madison De La Garza, a qual não conseguiu reconhecer depois de acordar na cama do hospital – não chegando nem mesmo a compreender de quem era a voz que a acompanhava. Fazendo as pazes consigo mesma e deixando que os demônios de um passado não muito distante, ela agora pode contar aos fãs tudo que querem saber.

Mais incisivamente do que nunca, Demi une-se a diversas powerhouses da indústria musical para auxiliarem nesse heroico arco – acertando em grande parte, apesar de certos equívocos cometidos pelo caminho. Temos o supracitado dueto com Fischer; a elegíaca e evocativa “Easy”, dramatizada ao lado de Noah Cyrus em um turbilhão orquestral de piano e violinos; “My Girlfriends Are My Boyfriend”, que a une com a rapper Saweetie e dá espaço para construções feministas movidas pelo pop-noir e pelo rap; e a aguardada “Met Him Last Night” – aliando-se à Ariana Grande e aproveitando as conhecidas incursões da artista para arquitetar uma sólida, ainda que dissonante estrutura future-trap, que falha em encaixar-se com perfeição espontânea ao restante do álbum.

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É inegável dizer que a obra esbarra em alguns deslizes, principalmente pela exorbitante quantidade de faixas. “15 Minutes” se dispersa em uma zona de conforto repetitiva e levemente reciclada, como se tivesse sido aproveitada rapidamente das tracks antecessoras – e o mesmo ocorre com “California Sober” (uma canção que poderia ter sido retirada sem quaisquer perdas grandes). “Butterfly”, terminando um épico conto que começou ainda em suas primeiras inflexões, também falha ao esquecer-se de um crescendo catártico e se render à frustração comedida das obviedades instrumentais.

Felizmente, Lovato mostra que tem controle criativo, estético e crítico sobre as mensagens que deseja entregar a quem estiver disposto a ouvir. Suas obrigatoriedades passadas dão lugar a uma conhecida ironia que é traduzida na divertida “Melon Cake”, que retoma um infausto episódio de aniversário, enquanto o country-pop dá as caras na belíssima “The Way You Don’t Look At Me”. Apostando fichas no indie pop-rock e na folktronica, Demi nos presenteia com “Carefully” e “The Kind Of Lover I Am”, bem como uma coesa e mais teatral interpretação da clássica “Mad World”.

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Dizer que Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’ é o amadurecimento de Demi Lovato é criar um eufemismo barato que não explana a importância do álbum para sua própria vida. A cantora, entrando em consenso com todos os momentos pelos quais passou, abre-se como um livro, estampando cada página com uma frase avassaladora e humilde: “esta sou eu, nua e crua”.

Nota por faixa:

1. Anyone – 4,5/5
2. Dancing with the Devil – 5/5
3. ICU (Madison’s Lullabye) –  4,5/5
4. Intro – 5/5
5. The Art of Starting Over – 4,5/5
6. Lonely People – 4/5
7. The Way You Don’t Look at Me – 5/5
8. Melon Cake – 4,5/5
9. Met Him Last Night (com Ariana Grande) – 3,5/5
10. What Other People Say (com Sam Fischer) – 4,5/5
11. Carefully – 4,5/5
12. The Kind of Lover I Am – 4,5/5
13. Easy (feat. Noah Cyrus) – 5/5
14. 15 minutes – 3/5
15. Girlfriends Are My Boyfriends (feat. Saweetie) – 5/5
16. California Sober – 2/5
17. Mad World – 5/5
18. Butterfly – 3/5
19. Good Place – 4/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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