terça-feira , 5 novembro , 2024

Crítica | Demi Lovato volta às origens com o ambicioso álbum ‘Holy Fvck’

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Posando deitada em uma cama no formato de uma cruz e fazendo referências às práticas BDSM, Demi Lovato anunciava o lançamento de seu oitavo álbum de estúdio, Holy Fvck. Diferente do escopo mais pautado no pop e no R&B dos títulos anteriores, a nova produção levaria Lovato de volta às suas raízes – um movimento interessante de recuperar o que já ficou no passado e de trazer à tona a nostalgia pop-rock de ‘Don’t Forget’ e Here We Go Again; entretanto, a cantora e compositora agora lida com uma fase de sua vida em que deixou de lado a figura imaculada da “estrela da Disney” e deu lugar a uma pessoa realizada por completo e que já teve experiências consideráveis para assinar suas faixas.

Holy Fvck parte de uma estética bastante interessante e que serve como renascimento de um dos maiores nomes do cenário contemporâneo – e que, a cada álbum, tem algo de novo para nos dizer. É quase emblemático que Demi tenha tratado a produção como um “funeral do pop”, renegando a imagem engessada que tinha nos anos anteriores em prol de uma ressurgência crítica e essencial para nos manter envolvidos em uma trajetória recheada de simbolismos e autorreferências que refletem a obrigatoriedade de um amadurecimento necessário. Não é surpresa, pois, que tenhamos uma produção infundida no propósito da dissonância, seja dos vocais enfurecidos, seja de instrumentos como guitarra, baixo e bateria. O resultado é aprazível em boa parte e reflete a versátil habilidade da performer em saber como se reinventar (seja para o bem ou para o mal).

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Já fazia um tempo desde que Lovato não se mantinha fiel à persona eternizada pela mídia – ou seja, dentro de um espectro açucarado e relacionável. Desde Tell Me You Love Me, em 2017, a artista vinha apostando fichas em letras mais pessoais e mais impactantes, falando abertamente sobre os problemas que tinha enfrentado e o espaço que ocupava em um mundo ainda marcado pelo conservadorismo e pelo preconceito. O mesmo ocorreu com Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’, uma ode ao empoderamento e a como a dor que sentiu durante tanto tempo a ajudou a superar vários obstáculos. Mas nada poderia nos preparar para a celebração pop-punk e hard-rock do que podemos apenas entender como uma das entradas mais ambiciosas de sua discografia.

Enquanto “Skin of My Teeth”, lançado como lead single, preparava os ouvintes para esse novo capítulo da carreira de Demi, é a faixa de abertura, “Freak”, performada ao lado de YUNGBLUD, que dita o tom da obra. Movida pelo hard rock conhecido e pincelado nas investidas iniciais da cantora, é notável como Lovato se desvencilha das restrições que carregava alguns anos atrás e aposta em narrativas pessoais e que demonstram sua raiva contra a execrável normatividade e o modo como deve se portar dentro de uma sociedade bem tradicionalista. É costumeiro que enxerguemos essa atitude da artista como enraivecida, mas, na verdade, ela só está colocando para fora o que sempre quis dizer (“eu sou o que sou, e o que sou é um pedaço de carne”).

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A temática de libertação e empoderamento se alastra para o restante das faixas, o que permite a criação de uma linha coesiva sólida e que nos mantém envolvidos do começo ao fim – e que, de maneira similar, vale-se exaustivamente de repetições um pouco cansativas, ofuscadas pelo poder da interpretação da vocalista. Em uma comparação estética, Holy Fvck carrega deslizes quase iguais a ‘Love Sux’, de Avril Lavigne, em que a produção sistemática e explosiva aproveita de todo o potencial o tempo inteiro, se esquecendo das nuances que gostaríamos para compreender a jornada completa. Entretanto, isso não significa que o resultado é ruim – muito pelo contrário: temos, aqui, uma pessoa que sabe que caminho seguir com sua carreira e que se livrou das amarras do que os outros querem que ela seja.

“Skin of My Teeth” mergulha de cabeça em uma reflexão sobre si mesma, em que viver se transformou numa sobrevivência fugaz; “Substance” aproveita para criticar a falta de profundidade das pessoas, tratando da triste efemeridade das relações humanas (ainda que a pungência seja, por vezes, crua demais e livre de metáforas); “29”, facilmente uma das melhores faixas do álbum, choca pela produção comedida e pelos potentes vocais da artista, infundida em uma história de disparidade etária, daddy issues e a tênue linha entre o consentimento e a manipulação; “4 Ever 4 Me” e “Happy Ending” insurgem na contraposição do hard rock em semi-baladas guiadas pela melodia do violão e que, ainda que com alguns defeitos, servem como uma proposital quebra de ritmo para o público.

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A obra é recheada de referências e homenagens que Lovato faz àqueles que a inspiraram ao longo da carreira: a adoção do pop-punk remete à imagem que Lavigne imortalizou desde seu début com ‘Let Go’, em 2002, enquanto a amálgama de subgêneros do rock e o tom confessional nos leva de volta ao último álbum da banda The Pretty Reckless, ‘Death by Rock and Roll’, ou ao contínuo impacto que Paramore teve no cenário fonográfico. Tudo sem drenar a identidade ou a performance de Demi e sem culminar numa bola de neve amorfa e sem vida.

Holy Fvck pode ter os seus problemas, mas isso não o faz um álbum menos brilhante. Esse novo capítulo da carreira de Demi Lovato é uma adição bem-vinda a uma carreira permeada por acontecimentos chocantes e que se consagra como uma imaculada reflexão sobre o que significa estar vivo. A ousadia ambicionada pela cantora é apaixonante e, no geral, encontra sucesso e merece ser revisitada em empreitadas futuras.

Nota por faixa:

1. Freak, feat. Yungblud – 4,5/5
2. Skin of My Teeth – 4/5
3. Substance – 4/5
4. Eat Me, feat. Royal & The Serpent – 5/5
5. Holy Fvck – 4,5/5
6. 29 – 5/5
7. Happy Ending – 3,5/5
8. Heaven – 4/5
9. City of Angels – 3,5/5
10. Bones – 4/5
11. Wasted – 4/5
12. Come Together – 4,5/5
13. Dead Friends – 4/5
14. Help Me, feat. Dead Sara – 4,5/5
15. Feed – 4/5
16. 4 Ever 4 Me – 3,5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Holy Fvck parte de uma estética bastante interessante e que serve como renascimento de um dos maiores nomes do cenário contemporâneo – e que, a cada álbum, tem algo de novo para nos dizer. É quase emblemático que Demi tenha tratado a produção como um “funeral do pop”, renegando a imagem engessada que tinha nos anos anteriores em prol de uma ressurgência crítica e essencial para nos manter envolvidos em uma trajetória recheada de simbolismos e autorreferências que refletem a obrigatoriedade de um amadurecimento necessário. Não é surpresa, pois, que tenhamos uma produção infundida no propósito da dissonância, seja dos vocais enfurecidos, seja de instrumentos como guitarra, baixo e bateria. O resultado é aprazível em boa parte e reflete a versátil habilidade da performer em saber como se reinventar (seja para o bem ou para o mal).

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Já fazia um tempo desde que Lovato não se mantinha fiel à persona eternizada pela mídia – ou seja, dentro de um espectro açucarado e relacionável. Desde Tell Me You Love Me, em 2017, a artista vinha apostando fichas em letras mais pessoais e mais impactantes, falando abertamente sobre os problemas que tinha enfrentado e o espaço que ocupava em um mundo ainda marcado pelo conservadorismo e pelo preconceito. O mesmo ocorreu com Dancing with the Devil… The Art of Starting Over’, uma ode ao empoderamento e a como a dor que sentiu durante tanto tempo a ajudou a superar vários obstáculos. Mas nada poderia nos preparar para a celebração pop-punk e hard-rock do que podemos apenas entender como uma das entradas mais ambiciosas de sua discografia.

Enquanto “Skin of My Teeth”, lançado como lead single, preparava os ouvintes para esse novo capítulo da carreira de Demi, é a faixa de abertura, “Freak”, performada ao lado de YUNGBLUD, que dita o tom da obra. Movida pelo hard rock conhecido e pincelado nas investidas iniciais da cantora, é notável como Lovato se desvencilha das restrições que carregava alguns anos atrás e aposta em narrativas pessoais e que demonstram sua raiva contra a execrável normatividade e o modo como deve se portar dentro de uma sociedade bem tradicionalista. É costumeiro que enxerguemos essa atitude da artista como enraivecida, mas, na verdade, ela só está colocando para fora o que sempre quis dizer (“eu sou o que sou, e o que sou é um pedaço de carne”).

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A temática de libertação e empoderamento se alastra para o restante das faixas, o que permite a criação de uma linha coesiva sólida e que nos mantém envolvidos do começo ao fim – e que, de maneira similar, vale-se exaustivamente de repetições um pouco cansativas, ofuscadas pelo poder da interpretação da vocalista. Em uma comparação estética, Holy Fvck carrega deslizes quase iguais a ‘Love Sux’, de Avril Lavigne, em que a produção sistemática e explosiva aproveita de todo o potencial o tempo inteiro, se esquecendo das nuances que gostaríamos para compreender a jornada completa. Entretanto, isso não significa que o resultado é ruim – muito pelo contrário: temos, aqui, uma pessoa que sabe que caminho seguir com sua carreira e que se livrou das amarras do que os outros querem que ela seja.

“Skin of My Teeth” mergulha de cabeça em uma reflexão sobre si mesma, em que viver se transformou numa sobrevivência fugaz; “Substance” aproveita para criticar a falta de profundidade das pessoas, tratando da triste efemeridade das relações humanas (ainda que a pungência seja, por vezes, crua demais e livre de metáforas); “29”, facilmente uma das melhores faixas do álbum, choca pela produção comedida e pelos potentes vocais da artista, infundida em uma história de disparidade etária, daddy issues e a tênue linha entre o consentimento e a manipulação; “4 Ever 4 Me” e “Happy Ending” insurgem na contraposição do hard rock em semi-baladas guiadas pela melodia do violão e que, ainda que com alguns defeitos, servem como uma proposital quebra de ritmo para o público.

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A obra é recheada de referências e homenagens que Lovato faz àqueles que a inspiraram ao longo da carreira: a adoção do pop-punk remete à imagem que Lavigne imortalizou desde seu début com ‘Let Go’, em 2002, enquanto a amálgama de subgêneros do rock e o tom confessional nos leva de volta ao último álbum da banda The Pretty Reckless, ‘Death by Rock and Roll’, ou ao contínuo impacto que Paramore teve no cenário fonográfico. Tudo sem drenar a identidade ou a performance de Demi e sem culminar numa bola de neve amorfa e sem vida.

Holy Fvck pode ter os seus problemas, mas isso não o faz um álbum menos brilhante. Esse novo capítulo da carreira de Demi Lovato é uma adição bem-vinda a uma carreira permeada por acontecimentos chocantes e que se consagra como uma imaculada reflexão sobre o que significa estar vivo. A ousadia ambicionada pela cantora é apaixonante e, no geral, encontra sucesso e merece ser revisitada em empreitadas futuras.

Nota por faixa:

1. Freak, feat. Yungblud – 4,5/5
2. Skin of My Teeth – 4/5
3. Substance – 4/5
4. Eat Me, feat. Royal & The Serpent – 5/5
5. Holy Fvck – 4,5/5
6. 29 – 5/5
7. Happy Ending – 3,5/5
8. Heaven – 4/5
9. City of Angels – 3,5/5
10. Bones – 4/5
11. Wasted – 4/5
12. Come Together – 4,5/5
13. Dead Friends – 4/5
14. Help Me, feat. Dead Sara – 4,5/5
15. Feed – 4/5
16. 4 Ever 4 Me – 3,5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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