Um médico desesperado para salvar sua filha por meio de um composto químico é interceptado pela polícia. Porém, durante a detenção, um terremoto brutal destrói toda a Coreia do Sul. Neste cenário, os sobreviventes formam uma sociedade sem leis, em que os répteis que serviram de cobaia para os experimentos do doutor passaram a se regenerar com extrema velocidade e viraram uma praga ‘urbana’. Lutando para sobreviver, um caçador e seu garoto se especializam em acabar com essas pragas e transformá-las em alimento. A vida parece fluir em meio a desgraça, até o dia em que um grupo de pessoas aparentemente ‘mais civilizadas’ surge dos escombros prometendo uma vida melhor para os adolescentes e suas famílias. Eles levam uma amiga da dupla, que logo descobre que a promessa utópica não passava de uma mentira para encobrir um plano grotesco. Partindo dessa premissa, Em Ruínas chegou à Netflix fazendo muito sucesso.
Nos últimos dez anos, a franquia John Wick conseguiu revitalizar o nicho de ‘filmes do Liam Neeson’, aqueles em que o protagonista vê um membro de sua família ser levado e embarca em uma jornada de vingança para matar os responsáveis e seus associados. Trazendo doses de humor, a franquia conseguiu trazer esse nicho para o mainstream, fazendo com que diversos estúdios tentassem emplacar o seu próprio ‘John Wick’. Como de costume em Hollywood, a maioria não prestou.
No entanto, a Coreia do Sul tem seu próprio astro desse estilo de filme ‘porradeiro’, capaz de imprimir carisma e muita pancadaria a seus personagens, por mais que sejam essencialmente a mesma persona. Seu nome é Don Lee, um verdadeiro fenômeno da arte de quebrar bandido com as próprias mãos. Neste filme, que estreou em primeiro nos mais vistos da Netflix, Don presenteia o público com seu maior talento e consegue se diferenciar de seus trabalhos anteriores, porque agora ele não resolve os problemas apenas no soco. Ele também usa armas.
E não pense que o filme busca qualquer coisa além disso. A direção de Heo Myeong Haeng, que trabalhou por anos com Lee como coreógrafo de dublês, sabe do potencial do astro e potencializa isso ao máximo. Os melhores momentos do longa são quando a câmera foca no protagonista para derrubar exércitos sozinho, das formas mais criativas possíveis. Isso dá ao longa uma sensação quase nostálgica dos grandes heróis de ação dos anos 80, já que tudo gira ao redor de Don Lee e seus golpes e piadocas.
Entretanto, essa opção de potencializar ao máximo o astro deixa os outros personagens com a sensação de serem descartáveis – e são mesmo. Não dá para saber como seria o longa se houvesse um maior desenvolvimento dos coadjuvantes, mas a verdade é que a única personagem que ganha um background é tão desinteressante que talvez nem tenha sido um problema focar exclusivamente em um boneco só.
Se o lado do herói diverte, o vilão da história enoja. O médico/ cientista megalomaníaco é desprezível, como um malfeitor deve ser. É engraçado que todos os seus trejeitos e histórias de fundo parecem ter saído diretamente dos quadrinhos dos anos 1960 do Homem-Aranha. Ele é bem cliché, caricato, mas funcional. Seu papel causa repulsa, enquanto ele se deixa ser levado pela loucura de seu plano sem nem perceber – ou se importar – com as consequências.
No fim das contas, o embate entre o médico louco e o herói renegado carismático cumpre bem seu papel de divertir nesse cenário pós-apocalíptico. Mesmo com uma computação gráfica abaixo dos padrões dos filmes de Lee, o longa compensa com um grande trabalho de maquiagem. Há algumas reviravoltas que flertam com ser interessantes, mas nada que supere o carisma e o talento pra descer a porrada nos outros de seu protagonista. Em Ruínas é um filme que não ‘reinventa a roda’ e nem se propõe a isso. Ele quer divertir o público e consegue fazer isso. Talvez conseguisse ainda mais se reduzisse um pouco o tempo de tela, porque há momentos em que dá uma cansadinha. Ainda assim, é garantia de puro entretenimento.
Em Ruínas está disponível na Netflix.