quarta-feira , 25 dezembro , 2024

Crítica | Estrada Sem Lei – Kevin Costner, Woody Harrelson e a Netflix caçam Bonnie & Clyde

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Assassinos por Natureza

É seguro dizer que o diretor John Lee Hancock se tornou um especialista em narrar dramas intimistas passados dentro de um contexto amplo e impactante da história recente americana. Todas ocorridas de verdade. Seja a socialite que mudou a vida de um rapaz negro e pobre, o relacionamento conturbado entre Walt Disney e a escritora do clássico Mary Poppins durante o processo de criação do filme ou a puxada de tapete que os irmãos McDonald´s levaram, perdendo os direitos sobre sua própria lanchonete icônica; o cineasta procura sempre injetar muitos elementos humanos em suas obras.

Juntando-se ao panteão das histórias interessantes (e quase incríveis) contadas por Hancock, chega este Estrada Sem Lei, produção original da Netflix que estreou ontem na plataforma. Aqui também temos o drama pessoal de dois homens, ambientado em meio a caçada à dupla Bonnie & Clyde – ainda hoje considerados dois dos criminosos mais famosos que já passaram pelos EUA. Uma das provas disso é que a dupla de amantes já foi assunto de todo tipo de produção audiovisual, desde séries até filmes – no cinema, a mais marcante segue sendo Bonnie & Clyde – Uma Rajada de Balas (1967), com Warren Beatty e Faye Dunnaway nos papeis principais, dirigida por Arthur Penn e indicado a melhor filme no Oscar.



Na década de 1990, o questionador Oliver Stone brincou com o tema, adaptando uma versão moderna em Assassinos por Natureza (1994), onde criticou a fama e popularização ao status de celebridade de criminosos e assassinos. Essa glamourização teve início com os mafiosos, ladrões de bancos e eventuais matadores nos primórdios da sociedade americana – voltando diretamente ao velho Oeste. O crime e a vida fácil seduzem o ser humano. É de nossa natureza tentar resgatar certa liberdade, o desejo de fazer o que quiser, na hora que quiser, livre das amarras sociais. A vida em sociedade exige, assim como o trabalho e as responsabilidades, ausentes no estilo de vida contraventor. E o cinema explora o tema de tal fascínio de forma única, que o digam os filmes de Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e Michael Mann, por exemplo.

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O que Hancock faz aqui com Estrada Sem Lei é o caminho inverso, ao centrar a trama nos homens responsáveis por colocar um fim ao reinado do casal. Escrito por John Fusco (da série Marco Polo, também da Netflix), o roteiro quase nem nos mostra Bonnie e Clyde, tratados com certo misticismo e o frenesi de celebridades. O longa fala mais sobre a sensação de histeria coletiva em torno da lenda dos criminosos, do que propriamente trata de humanizá-los – coisa que as demais produções que os usaram como tema fizeram.

Esse distanciamento casa bem com a visão do outro lado, dos homens da lei que estão em seu encalço. Em especial Frank Hamer, papel do veterano Kevin Costner, não consegue compreender e é repelido por esta inversão de valores. Bonnie e Clyde são considerados Robin Hood modernos, já que roubam dos bancos dos ricos – que roubam dos pobres, segundo a lógica de um frentista em um dos diálogos. O problema é que além de não dividir os lucros de seus roubos com a população, no caminho ainda faziam questão de deixar uma trilha de corpos de policiais – fato que somente remexia o caldeirão do ódio, deixando policiais em ponto de ebulição. Numa das melhores cenas do longa, o personagem de Costner perde a compostura com tal frentista citado, apontando o outro lado da moeda: a família do policial morto enquanto fazia seu trabalho, que ficará sem sustento.

Policial aposentado, depois da extinção da categoria dos Texas Rangers, o protagonista vivido por Costner é chamado às pressas e reinstituído na força, agora com o cargo de oficial das estradas (daí o Highwaymen do título original – algo como “homens da estrada”), a contragosto pela governadora Ma Ferguson (papel da vencedora do Oscar Kathy Bates), a primeira mulher a ocupar o cargo de governadora no país. Considerados caubóis que agiam por conta própria e não podiam ser controlados, agentes da lei como o vivido por Costner apresentavam um risco, mesmo assim era sabido que eram os únicos que poderiam dar conta do recado quando a missão era suja e pesada. Era imprescindível colocar um ponto final na trajetória de Bonnie e Clyde, mas ao mesmo tempo quase impossível. Nem mesmo J. Edgar Hoover, o braço forte da lei federal, era páreo para o casal inatingível. Até mesmo a revista Time fez uma matéria na época definindo Clyde Barrow como super-humano.

Estrada Sem Lei fala sobre homens perdidos no tempo, se deparando com um fenômeno que não conseguem compreender: a modernidade em plena década de 1930. Mudanças trazidas com as épocas e trocas de crenças e valores. Woody Harrelson vive outro homem da lei destituído e falido, que encontra uma nova chance na oferta de trabalho, voltando a fazer o que sabe bem: matar. Costner e Harrelson fazem um bom time e demonstram a química que somente os que possuem anos de estrada trazem atrelada.

O visual impressiona e nos faz desejar a maior tela possível a fim de saborear a pulsante exuberância da fotografia, da direção de arte e dos quesitos técnicos de forma geral. Estrada Sem Lei é uma produção de entretenimento adulto no melhor sentido da palavra – pondera inúmeras questões dignas de debate, e o faz na forma de um verdadeiro espetáculo cinematográfico.

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Juntando-se ao panteão das histórias interessantes (e quase incríveis) contadas por Hancock, chega este Estrada Sem Lei, produção original da Netflix que estreou ontem na plataforma. Aqui também temos o drama pessoal de dois homens, ambientado em meio a caçada à dupla Bonnie & Clyde – ainda hoje considerados dois dos criminosos mais famosos que já passaram pelos EUA. Uma das provas disso é que a dupla de amantes já foi assunto de todo tipo de produção audiovisual, desde séries até filmes – no cinema, a mais marcante segue sendo Bonnie & Clyde – Uma Rajada de Balas (1967), com Warren Beatty e Faye Dunnaway nos papeis principais, dirigida por Arthur Penn e indicado a melhor filme no Oscar.

Na década de 1990, o questionador Oliver Stone brincou com o tema, adaptando uma versão moderna em Assassinos por Natureza (1994), onde criticou a fama e popularização ao status de celebridade de criminosos e assassinos. Essa glamourização teve início com os mafiosos, ladrões de bancos e eventuais matadores nos primórdios da sociedade americana – voltando diretamente ao velho Oeste. O crime e a vida fácil seduzem o ser humano. É de nossa natureza tentar resgatar certa liberdade, o desejo de fazer o que quiser, na hora que quiser, livre das amarras sociais. A vida em sociedade exige, assim como o trabalho e as responsabilidades, ausentes no estilo de vida contraventor. E o cinema explora o tema de tal fascínio de forma única, que o digam os filmes de Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e Michael Mann, por exemplo.

O que Hancock faz aqui com Estrada Sem Lei é o caminho inverso, ao centrar a trama nos homens responsáveis por colocar um fim ao reinado do casal. Escrito por John Fusco (da série Marco Polo, também da Netflix), o roteiro quase nem nos mostra Bonnie e Clyde, tratados com certo misticismo e o frenesi de celebridades. O longa fala mais sobre a sensação de histeria coletiva em torno da lenda dos criminosos, do que propriamente trata de humanizá-los – coisa que as demais produções que os usaram como tema fizeram.

Esse distanciamento casa bem com a visão do outro lado, dos homens da lei que estão em seu encalço. Em especial Frank Hamer, papel do veterano Kevin Costner, não consegue compreender e é repelido por esta inversão de valores. Bonnie e Clyde são considerados Robin Hood modernos, já que roubam dos bancos dos ricos – que roubam dos pobres, segundo a lógica de um frentista em um dos diálogos. O problema é que além de não dividir os lucros de seus roubos com a população, no caminho ainda faziam questão de deixar uma trilha de corpos de policiais – fato que somente remexia o caldeirão do ódio, deixando policiais em ponto de ebulição. Numa das melhores cenas do longa, o personagem de Costner perde a compostura com tal frentista citado, apontando o outro lado da moeda: a família do policial morto enquanto fazia seu trabalho, que ficará sem sustento.

Policial aposentado, depois da extinção da categoria dos Texas Rangers, o protagonista vivido por Costner é chamado às pressas e reinstituído na força, agora com o cargo de oficial das estradas (daí o Highwaymen do título original – algo como “homens da estrada”), a contragosto pela governadora Ma Ferguson (papel da vencedora do Oscar Kathy Bates), a primeira mulher a ocupar o cargo de governadora no país. Considerados caubóis que agiam por conta própria e não podiam ser controlados, agentes da lei como o vivido por Costner apresentavam um risco, mesmo assim era sabido que eram os únicos que poderiam dar conta do recado quando a missão era suja e pesada. Era imprescindível colocar um ponto final na trajetória de Bonnie e Clyde, mas ao mesmo tempo quase impossível. Nem mesmo J. Edgar Hoover, o braço forte da lei federal, era páreo para o casal inatingível. Até mesmo a revista Time fez uma matéria na época definindo Clyde Barrow como super-humano.

Estrada Sem Lei fala sobre homens perdidos no tempo, se deparando com um fenômeno que não conseguem compreender: a modernidade em plena década de 1930. Mudanças trazidas com as épocas e trocas de crenças e valores. Woody Harrelson vive outro homem da lei destituído e falido, que encontra uma nova chance na oferta de trabalho, voltando a fazer o que sabe bem: matar. Costner e Harrelson fazem um bom time e demonstram a química que somente os que possuem anos de estrada trazem atrelada.

O visual impressiona e nos faz desejar a maior tela possível a fim de saborear a pulsante exuberância da fotografia, da direção de arte e dos quesitos técnicos de forma geral. Estrada Sem Lei é uma produção de entretenimento adulto no melhor sentido da palavra – pondera inúmeras questões dignas de debate, e o faz na forma de um verdadeiro espetáculo cinematográfico.

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