A LONGA NOITE, É SÉRIO?!
Para ser justo nesta crítica, fiz questão de rever partes deste último episódio de Game of Thrones – GoT em uma plataforma diferente. No domingo, vi pela televisão. Depois, revi os primeiros 40 minutos pelo celular, via HBO Go. A esta altura, já está bem claro que muito da escuridão do 3º episódio foi resultado da sua compressão para transmissão nas TVs e no streaming. É surreal que a HBO não tenha conseguido solucionar os problemas do seu serviço de streaming. Infelizmente, falhas como esta prejudicam o brilho do seu produto mais importante. E a fala de um dos membros da equipe, dizendo que a culpa estava nos televisores, só torna tudo mais constrangedor.
Tentando colocar de lado isso, percebe-se que a direção de Miguel Sapochnik pecou em alguns pontos essenciais. A fotografia muito escurecida (mesmo pessoas que baixaram o episódio e viram em HD reconheceram pouca luz) somado à edição com muitos cortes, tornou o confronto dos primeiros 30 minutos quase ilegível. A ideia era de imergir o público na longa noite. A escuridão excessiva da fotografia (somado aos problemas de transmissão) dificultaram a compreensão da cena. A edição com muitos cortes apenas reforçou a dificuldade de compreensão. Durante a batalha, fiquei mais tentando compreender o que ocorria do que sentindo a emoção do combate. Com o voo dos dragões não foi muito diferente. Apenas quando eles estavam acima das nuvens era possível compreender a geografia da cena. Voltando para a terra, o momento que os humanos retornavam para dentro de Winterfell foi extremamente confuso, com uma imensa dificuldade de localizar o espectador na cena.
Claro que não se trata de uma opção errada. O uso da escuridão era inevitável, ora pois, a longa noite havia chegado! Imagens escurecidas são, normalmente, uma forma de desnortear o espectador. O incômodo poderia ter colocado o público na ação, fazendo-o se sentir como um nortenho. Contudo, o público ser tirado da narrativa para reclamar das imagens escuras é a prova de que a opção foi excessiva. A questão é a dosagem. Talvez se em certos momentos a fotografia desse um tom mais claro, permitindo uma compreensão da cena, o público não seria desconectado da narrativa. Ou, o que seria a minha opção, uma edição com bem menos cortes, privilegiando pequenos planos-sequências, de forma que nosso olhar se acostumasse com a escuridão para, realmente compreender o que se passa, permitiria um envolvimento do público com a batalha.
A julgar pelo que falei até aqui, o episódio foi um horror. De forma nenhuma! Sapochnik e os roteiristas tiveram muito mais acertos do que erros. A estrutura de episódio concretiza a intenção do diretor de criar o terror de sobrevivência. O começo do episódio cria uma tensão genuína. Os Dothrakis com suas armas em chamas sumindo um a um na escuridão foi uma solução elegante e eficaz para criar a tensão e não se gastar tanto com o CGI. Infelizmente, a escuridão do episódio tirou a força dessa abertura. Acredito sinceramente que opção pela fotografia escura e edição com muitos cortes não foi apenas questão artística; ela traz a vantagem de disfarçar imperfeições da computação gráfica que, por limitações orçamentárias, certamente, não conseguiria ser ultrarrealista.
Passados aproximadamente 30 minutos de exibição, especialmente quando o fogo ilumina a cena, com a fotografia assumindo tons alaranjados, a batalha se torna mais compreensível, permitindo um envolvimento maior. Um elemento importante para isto foi a ordem em que as sequências foram montadas.
Em sequências de batalhas, se focar apenas no macro, rapidamente a ação se torna enfadonha. Focar em pequenos confrontos ou intercalar com cenas mais calmas – como os diálogos na cripta – engaja o público e permite que ele respire. Neste ponto, o episódio foi bem sucedido. Os diálogos de Tyrion (Peter Dinklage) e Sansa (Sophie Turner), além de um respiro, expuseram os laços que os dois ainda possuem. Os diálogos mais tocantes do episódio foram entre Theon (Alfie Allen) e Bran (Isaac Hempstead Wright), sem dúvida, um belo desfecho para o personagem. Mas, as duas figuras que mais se destacaram foram Melisandre (Carice van Houten) e Arya (Maisie Williams).
Melisandre, odiada por muitos, deu uma de salvadora da pátria e resolve até as pixeladas da HBO! A personagem teve um percurso trágico ao longo da série. Pela sua real aparência, percebemos o quanto ela se dedicou para combater a escuridão. Ficou devastada com os seus erros. Neste episódio, víamos uma figura alquebrada, que sabia que sua jornada estava no fim, mesmo sem saber qual seria. O poético plano da sua morte foi a coroação da sua trajetória.
A grande figura do episódio foi a Arya! Da luta ao stealth, todas as cenas tiveram um duplo sentido: mostrar o amadurecimento da pequena Stark e a evolução artística da atriz Maisie Williams. O auge foi quando ela bancou o Azor Ahai e matou o Rei da Noite (Vladimir Furdik). Este, aliás, é outro ponto sensível do episódio.
Embora a série tenha falado muito pouco da lenda do Azor Ahai, a tese de que Jon Snow (Kit Harington) seria o escolhido ganhou força com a sua ressurreição. Era uma das teorias mais fortes. E o seu arco dramático é uma jornada do herói. Além disso, também reforçou as expectativas a forte ligação dele com a trama envolvendo os caminhantes brancos. No entanto, inverter expectativas é especialidade de GoT, e a ação da Arya foi mais uma. E foi uma quebra coerente. Não importa se você concorda ou não, a jornada da Arya fundamenta a sua ação: ela fez toda a lição de casa, ao ponto de sermos capazes de imaginá-la se esgueirando entre os mortos vivos.
Não tão coerente foi a quebra de expectativa em relação à longa noite. Desde a primeira cena, a ameaça dos caminhantes brancos paira sobre Westeros. Pouco importa o título que a série adotou, o roteiro colocou fermento nessa trama durante todas as temporadas. O Rei da Noite figurava como uma força capaz de bagunçar o jogo dos tronos – cheguei até a me preocupar que a sua chegada tornasse nula tudo aquilo que aconteceu antes na série. A Longa Noite prometia ser um inverno gélido. O público esperava o pior dos cenários. E como uma loja que promete o maior Black Friday do mundo e dá no máximo 3% de desconto, o Rei da Noite sequer deu frete grátis!
Ok! que tudo acabasse em um episódio. Isto já seria inverter as expectativas. Mas, sequer sentimos o peso dele na trama. Não se trata de explicar seus objetivos (que foram esboçados na série), nem sua origem (que foi explicada). Estou falando de relevância para os acontecimentos da narrativa. Ora, não estamos aqui tratando de um filme iraniano todo desconstruidão, mas de uma série que, sim, quebra expectativas, mas que obedece a estrutura clássica de narrativa.
É fácil seguir padrões. É mais difícil quebrar todos os padrões. Mas, é muito difícil, quebrar alguns padrões e nisto ser inovador. Você mantém a base, mas faz inovações pontuais que são incríveis. GoT fez isso ao longo das temporadas. Se tivesse dado mais peso ao Rei da Noite, somado ao desfecho dessa trama no terceiro episódio pelas mãos da Arya, a série teria mais uma vez feito algo dificílimo. Infelizmente, a falta de impacto do Rei da Noite deixou tudo no meio do caminho. Resta agora aguardar que Bran nos fale mais sobre ele e que a guerra contra a Cersei (Lena Headey) seja pela manhã…
E aí, o que achou deste episódio? Conseguiu ver alguma coisa? Curtiu o fatality da Arya? Também achou que o Rei da Noite entregou menos do que um marido no dia dos namorados? Ficou confuso com quem morreu? Sua TV também ficou com a imagem pixelada?
Durante toda a temporada, ao final de cada episódio, eu, Bruno Fai e Rafa Gomes estaremos conversando ao vivo sobre a série. O bate papo do terceiro episódio vocês podem conferir aqui. E não deixem de comentar, compartilhar a resenha e curtir as nossas redes sociais:
Nossa página oficial no Facebook
Página oficial do CinePOP no Facebook