AFETOS E PODER
Já passando da metade da última temporada de Game of Thrones – GoT é preciso reconhecer que a série já não é mais a mesma. Estamos vendo, episódio depois de episódio, a qualidade do roteiro cair. Não falo dos teletransportes que já ocorriam na temporada passada. O que se nota é uma falta de esmero e paciência na construção dos acontecimentos, algo que já se evidenciou na sétima temporada. Os fatos se sucediam muito rapidamente, os personagens passavam por uma situação e logo tinham mudado, ou acabavam de se conhecer e já rolava um namoro. A resolução do Rei da Noite no episódio 3 foi um exemplo recente: a rapidez não condiz com o terror que se anunciava ao longo da série. Até se analisarmos os eventos da batalha vamos notar que há incoerência e facilitações de roteiro: qual a função do Bran (Isaac Hempstead Wright) usar os corvos na batalha, por exemplo?!
Neste 4º episódio o roteiro produziu alguns dos diálogos mais constrangedores de toda série. A ruindade era tão grande, que custei a acreditar que escutava aquelas frases saindo da boca dos personagens. O mais emblemático foi Jaime (Nikolaj Coster-Waldau) usando a justificativa do “tá calor aqui” para tirar a roupa na frente da Brienne (Gwendoline Christie). Pô, 01, oito anos de curso, pra isso?! Sério?!
Os vários diálogos que buscavam comentar os eventos que acabavam de ocorrer sintetizam bem os problemas do roteiro de GoT. Há uma regra de ouro no cinema que as séries adotaram muito bem: mostre ao invés de falar. Por mais de uma vez, Tyrion (Peter Dinklage) deu uma de comentador de cena. Exemplo: após sagrar Gendry (Joe Dempsie) como Lorde, Daenerys (Enukau Clarke) comenta com Tyrion que ela também sabe fazer uma jogada estratégica. Sério?! Nossa, eu nem percebi! Pensar que em temporadas passadas, GoT conseguia expor a queda de braço entre os irmãos Lannister apenas com troca de cadeiras ao redor da mesa do conselho.
Comentar e verbalizar ao invés de expor a ação pode ser muito bem usado – o filme Tropa de Elite é um caso – mas, em geral é uma forma de acelerar os acontecimentos ou não deixar o espectador com dúvidas. Por conta da redução dos episódios, o que diminuiu o tempo da série, os roteiristas usam os diálogos expositivos como muleta, implicando no sacrifício da qualidade estabelecida pela própria série.
Este episódio foi o que teve as maiores maquinações políticas desta temporada. Com a resolução relâmpago do Rei da Noite e sua curta madrugada, os bastidores da política (marca registrada de GoT) voltaram a se movimentar em torno do trono de ferro. A questão central do episódio foi saber quem deve subir ao trono no caso de uma eventual vitória contra Cersei (Lena Headey). Alguns dos melhores momentos do episódio envolveram Tyrion e Varys (Conleth Hill) discutindo quem teria mais condições de governar Westeros, Daenerys ou Jon Snow (Kit Harington). Mesmo longe do debate político que a série já entregou no passado, mesmo por vezes sendo muito direto, o episódio conseguiu transmitir o impasse em que os seguidores de Daenerys e Jon Snow se encontram.
O episódio focou, por um lado, em fechar alguns arcos, como o de Gendry, e direcionar personagens importantes rumo aos episódios finais, como Jaime e Arya. Também foi destaque a angústia psicológica de Daenerys. Todo o episódio é construído ao redor dessa questão: estaria ela sucumbindo à loucura Targaryen?
O melhor do episódio foi como ele expôs a degradação psicológica da Mãe dos Dragões. Na festa, ela estava deslocada, não se encaixando naquele mundo nortenho. O close com uma lente angular, com Varys ao fundo, foi a tradução visual do quanto a personagem não aguenta o fardo de ter outro legítimo ao trono. E, sinceramente, acho que o menos importante para ela é o romance entre os dois. Ela já mostrou ser capaz de renunciar ao coração em nome do poder, quanto mais renunciar a um lance… Na parte final, o episódio impôs duas perdas que deixaram Dany devastada: seu filho dragão e sua amiga Missandei (Nathalie Emmanuel).
A série vem desenhando uma derrocada psicológica da personagem desde a temporada passada, especialmente quando ela matou os Tarly. Se o roteiro decidir seguir por torná-la uma espécie de vilã, certamente vão fundamentar essa escolha na loucura Targaryen. Embora esse elemento esteja presente e possa justificar ações impulsivas dela, é preciso entender como essa loucura foi alimentada.
Entre os muitos assuntos de GoT, poder e relações familiares foram dois temas recorrentes. Daenerys não criou muitos laços. Seu irmão a vendeu para conseguir um exército, o homem que ela amou e seu filho morreram. O poder acabou sendo a forma dela conseguir reconstruir a glória da sua família. Porém, essa cegueira pelo poder (ou por reconstruir a sua família) nunca permitiu que ela formasse laços duradouros. E, os poucos que ela tinha, o Deus da Morte levou! A cena da comemoração em Winterfell é emblemática desse vazio da personagem: todos comemoram com alguém ou algum familiar, enquanto ela estava isolada, tendo como única companhia o seu copo da Starbucks.
Acho pouco provável que o roteiro transforme ela em uma vilã. Mas, tudo aponta para que Dany sucumba e faça gestos violentos, como tocar fogo na capital. E, se o fizer, gostaria que fosse trabalhado esse vazio afetivo da personagem.
E aí, o que achou deste episódio? Gostaram das intrigas de bastidores? Também acharam os diálogos fracos? Sentiu a dor de Brienne?
Durante toda a temporada, ao final de cada episódio, eu, Bruno Fai e Rafa Gomes estaremos conversando ao vivo sobre a série. O bate papo do quarto episódio vocês podem conferir aqui. E não deixem de comentar, compartilhar a resenha e curtir as nossas redes sociais:
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