Crítica | Grande Sertão – Com Belíssima Fotografia, Filme é Versão DEFINITIVA da Obra de Guimarães Rosa

Guimarães Rosa escreveu importantíssimos livros que são considerados clássicos da literatura brasileira, como ‘Grande Sertão: Veredas’ e ‘Sagarana’. E uma de suas principais características – segundo os leitores e a crítica – é seu texto rebuscado, de altíssima qualidade gramatical, que deixava os professores de literatura em êxtase, e os alunos, em pânico. Tal dificuldade se estendeu quando foram adaptar suas obras para outros idiomas e, posteriormente, quando foram adaptá-las para outras linguagens, como o cinema. E apesar da enorme potência de sua obra, Guimarães continuava distante do cotidiano do brasileiro comum. Mas isto está prestes a mudar com a estreia nesse feriadão do filme ‘Grande Sertão’, a mais nova – e definitiva – adaptação do romance homônimo.

Grande Sertão
Créditos: Gustavo Hadba

Num território distópico atemporal, todo recortado por guetos, favelas e facções, o professor Riobaldo (Caio Blat) tenta sobreviver no Sertão, local dominado pelo bando de Joca Ramiro (Rodrigo Lombardi, o eterno Raj da novela ‘Caminhos das Índias’). Quando uma aluna sua é baleada na porta a escola, Riobaldo conhece Otacília (Mariana Nunes, de ‘Alemão’), mãe da menina, e reencontra Diadorim (Luisa Arraes, de ‘Transe’), seu antigo amigo de infância que lhe encorajara a não ter medo da vida. Dessa encruzilhada, Riobaldo repensará sua interpretação de mundo e os desdobramentos no Sertão. Porém, quando uma guerra explode encabeçada por Hermógenes (Eduardo Sterblitch, de ‘Dois é Demais em Orlando’) e revidada pelo comandante do exército, Zé Bebelo (Luís Miranda, de ‘Ó Paí Ó 2’), Riobaldo terá que colocar à tona a coragem que não sabe existir dentro de si, ao mesmo tempo em que tentará entender os motivos de seu peito bater de forma diferente por Diadorim.

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Grande Sertão’ tem muitos méritos por conseguir coisas “inconseguíveis”. A primeira delas, claro, é conseguir adaptar uma obra extensa (cerca de 740 páginas) para um formato fílmico, e com menos de duas horas! O longa também consegue traduzir a guerra do sertanejo, dos cangaceiros versus os jagunços, os coronéis, as milícias do imaginário comum do interior do país para uma linguagem contemporânea, urbana, traçando um paralelo com a violência que ocorre hoje nas capitais metropolitanas do país. Nesse sentido, não há diferença dos anos 1950 para o hoje, ou entre o sertão e o urbano, ou entre o cangaço e as periferias comandadas por poderes paralelos.

Grande Sertão

A caracterização dos personagens impressiona, tanto no figurino quanto na maquiagem/cabelo – setores comandados por Cao Albuquerque, Diana Leste e Rosemary Paiva. Esses departamentos conseguiram, inclusive, “enfeiar” Rodrigo Lombardi, vejam só! Brincadeiras à parte, além das indumentárias steampunk/industrial, a caracterização de Eduardo Sterblitch é chocante, um misto de Puck de ‘Sonho de Uma Noite de Verão’ com Gollum de ‘O Senhor dos Anéis’ e um vozeirão sintetizado meio Mr Catra. De longe é seu melhor papel e é também a melhor interpretação de todas de Hermógenes. Fosse vivo, até Guimarães ficaria bolado de vê-lo em cena.

Caio Blat volta a encarnar Riobaldo (depois da peça que saiu em turnê pelos CCBBs em 2017, com parte desse mesmo elenco, e depois de gravar esta peça encenada no filme ‘O Diabo na Rua no Meio do Redemunho’, que passou ano passado no Festival do Rio) e traz seu melhor para esta versão. São 7 anos co-vivendo com esse personagem e a sensação é que, com o tempo, Caio só o melhorou, só o entendeu mais em sua complexidade. Também Luisa Arraes entrega uma surpreendente versão de Diadorim (originalmente na peça feita por Luiza Lemmertz), demonstrando todo o seu potencial não só por anteriormente decorar todo o texto de Hermógenes, como, agora, entregar um Diadorim com sangue nos olhos. Aqui Luisa mostra que é uma atriz enorme, corajosa e que enfrenta tudo de frente, emprestando sua força feminil para trazer um Diadorim valente, líder, inspirador.

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Grande Sertão
Créditos: Helena Barreto

E tudo isso ganha uma roupagem de tirar o fôlego com a belíssima – belíssima mesmo – fotografia do diretor Gustavo Hadba (olho nele! que seus trabalhos são avassaladores!). A comunhão que o diretor encontra entre a iluminação perfeita, o posicionamento de câmera e ângulos absurdos (que encontra o melhor de seu elenco), somado a uma montagem agilíssima que imprime um ritmo frenético na produção, faz a gente ter vontade de chorar diante de tanta beleza. Ou falar um palavrão bem alto, tamanha a dificuldade para controlar as emoções.

Não deixe de assistir:

Sob a assinatura do diretor Guel Arraes (que volta ainda esse ano com ‘O Auto da Compadecida 2’), esse ‘Grande Sertão’ é uma obra-prima irretocável. A ferramenta que os professores precisavam para animar os estudantes a lerem Guimarães Rosa – que teria aprovado o resultado dessa adaptação. ‘Grande Sertão’ é cinema-arte melhor que muito embutido hollywoodiano, e demonstra a atemporalidade e a qualidade da literatura (e do cinema) brasileira.

Grande Sertão
Créditos: Gustavo Hadba

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