segunda-feira , 23 dezembro , 2024

Crítica | ‘Halston’ investe em visuais estonteantes e se esquece do principal: a história

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A história é sempre a mesma – Ryan Murphy continua até hoje como um dos realizadores mais prolíficos da contemporaneidade, supervisionando ou comandando diversas produções seriadas e fílmicas desde o longínquo ‘Nip/Tuck’, em 2003. Mas exatamente a que custo?

Afinal, Murphy, conhecido por firmar parceria com diversas emissoras e delinear múltiplos projetos ao mesmo tempo, parece estar reciclando materiais de uma forma mais exaustiva do que o normal. Com talvez a exceção da antologia ‘American Crime Story’ e de ‘Pose’, que continuam apresentando originalidade e emocionantes tramas, as recentes incursões do diretor e roteirista não atingem todo o potencial que prometem. Apenas nos dois últimos anos, tivemos a desequilibrada ‘Ratched’, cuja força veio com a atuação impecável de Sarah Paulson como a enfermeira Mildred Ratched; o exagerado onirismo de ‘Hollywood’, que tentou reconstruir a história do cinema em detrimento da veracidade; e a 9ª ‘American Horror Story’, cuja homenagem ao subgênero slasher a transformou em um aglutinado de narrativas sem sentido que se valeram mais da nostalgia do que de algo sólido.



Agora, nos primeiros meses de 2021, Murphy está pronto para retornar com mais um projeto subsidiário da Netflix, com quem firmou acordo em 2018. A minissérie Halston, composta por apenas cinco episódios, já vinha demonstrando uma certa repaginação estética de obras similares, mergulhando de cabeça na segunda metade do século passado para explorar a complexa e apaixonante vida do estilista Roy Halston Frowick (aqui interpretado com maestria por Ewan McGregor). Para aqueles que não o conhecem, Halston nasceu em uma pequena cidade de Iowa, nos Estados Unidos, e ascendeu à fama após arquitetar o icônico chapéu pillbox da ex-primeira-dama Jacqueline Kennedy. Centro da indústria da moda dos anos 1970 e 1980, o designer tinha uma influência gigantesca na iconografia e era melhor amigo de nomes como Liza Minnelli, Andy Warhol e Bianca Jagger.

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É claro que, levando em consideração as lendárias personalidades que aqui aparecem, o mínimo que se poderia esperar era uma telebiografia competente e que respondesse a algumas questões não apenas do protagonista titular, mas também dos segredos por trás da intrincada engrenagem no cenário fashion. Enquanto nem tudo está perdido, principalmente no tocante à imagética da produção, aos exuberantes figurinos de caxemira e de ultrasuede e ao vibrante retrato da discoteca nova-iorquina, Murphy, isolando-se nos bastidores ao lado de Ian Brennan, Christina Vachon e tantos outros, deixa que Sharr White e Daniel Minahan tomem as rédeas da história e se esqueçam de, no final das contas, criar uma.

Após um interessante início, que explana a infância traumática e abusiva de Halston, os episódios parecem se valer muito do frenesi artístico do que de um enredo que realmente tenha começo, meio e fim. McGregor faz um trabalho excepcional ao incorporar os trejeitos marcantes do estilista, desde sua voz monotônica até seus bordões ácidos e irônicos – algo que também é visto na estupenda encarnação maior-que-a-vida de Krysta Rodriguez como Minnelli, até mesmo na rendição de “Liza with a Z”. Entretanto, performances à parte, White não tem ideia em qual direção deseja seguir – apenas que irá contar a ascensão, a queda e a ressurreição de um dos nomes mais controversos de todos os tempos. E, à medida que a obra se desenrola, novos personagens vão surgindo no horizonte para tornar as tramas ainda mais convulsionais.

É interessante notar de que forma Minahan tenta ao máximo se afastar da obviedade, por mais que respalde em algumas fórmulas dramáticas bastante vistas nas últimas décadas. O ponto mais atraente é, sem sombra de dúvida, a transposição cronológica às inflexões técnicas tanto dos enquadramentos de câmera quanto à fotografia de Tim Ives e William Rexer. O diretor acompanha a evolução (ou in-volução, se assim preferirem) da sociedade, mostrando todas as facetas de Halston através das roupas e de sua martirizada mente criativa, desde os enlaces românticos com os homens de Manhattan, as desavenças com Elsa Peretti (Rebecca Dayan) e Joe Eula (David Pittu) e a conquista de um mundo que, conforme ele mesmo diz, não estava preparado para o tinha a oferecer. A partir daí, nota-se uma afeição contraditória por uma atmosfera documental que aposta até mesmo numa reconstrução analógica ao mesmo tempo que abre espaço para a novelização.

O roteiro, por sua vez, tem como principal objetivo manter o público motivado e instigado por todos os eventos da vida de Halston, nos levando à Batalha de Versalhes com versões dos ilustres Oscar de la Renta e Anne Klein, mostrando o saudosismo narcótico do célebre Studio 54 e até mesmo calcando a tênue linha que separa a haute couture da produção em massa. O problema é que não há quaisquer explicações para a entrada e a saída de diversos coadjuvantes que, de fato, não têm nenhuma importância. O relacionamento de Halston com a magnata do jornalismo da moda ou com a própria mãe é jogado profusamente para aumentar a carga dramática, mas nunca sai da zona de conforto – pelo contrário, traz a personalidade do artista para uma superficialidade condenável. Em uma determinada sequência, há menção a bloqueios emocionais dos quais o estilista precisa se livrar – e ele faz isso com rapidez monumental demais para ser levado a sério.

Investindo esforços em um majestoso visual, Halston é familiar demais para representar alguma centelha de novidade nessa bolha de produções originais da Netflix e, eventualmente, nem os mais elegantes vestidos de tafetá e casacos trench coat são suficientes para desviar a atenção das múltiplas falhas que despontam na minissérie.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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A história é sempre a mesma – Ryan Murphy continua até hoje como um dos realizadores mais prolíficos da contemporaneidade, supervisionando ou comandando diversas produções seriadas e fílmicas desde o longínquo ‘Nip/Tuck’, em 2003. Mas exatamente a que custo?

Afinal, Murphy, conhecido por firmar parceria com diversas emissoras e delinear múltiplos projetos ao mesmo tempo, parece estar reciclando materiais de uma forma mais exaustiva do que o normal. Com talvez a exceção da antologia ‘American Crime Story’ e de ‘Pose’, que continuam apresentando originalidade e emocionantes tramas, as recentes incursões do diretor e roteirista não atingem todo o potencial que prometem. Apenas nos dois últimos anos, tivemos a desequilibrada ‘Ratched’, cuja força veio com a atuação impecável de Sarah Paulson como a enfermeira Mildred Ratched; o exagerado onirismo de ‘Hollywood’, que tentou reconstruir a história do cinema em detrimento da veracidade; e a 9ª ‘American Horror Story’, cuja homenagem ao subgênero slasher a transformou em um aglutinado de narrativas sem sentido que se valeram mais da nostalgia do que de algo sólido.

Agora, nos primeiros meses de 2021, Murphy está pronto para retornar com mais um projeto subsidiário da Netflix, com quem firmou acordo em 2018. A minissérie Halston, composta por apenas cinco episódios, já vinha demonstrando uma certa repaginação estética de obras similares, mergulhando de cabeça na segunda metade do século passado para explorar a complexa e apaixonante vida do estilista Roy Halston Frowick (aqui interpretado com maestria por Ewan McGregor). Para aqueles que não o conhecem, Halston nasceu em uma pequena cidade de Iowa, nos Estados Unidos, e ascendeu à fama após arquitetar o icônico chapéu pillbox da ex-primeira-dama Jacqueline Kennedy. Centro da indústria da moda dos anos 1970 e 1980, o designer tinha uma influência gigantesca na iconografia e era melhor amigo de nomes como Liza Minnelli, Andy Warhol e Bianca Jagger.

É claro que, levando em consideração as lendárias personalidades que aqui aparecem, o mínimo que se poderia esperar era uma telebiografia competente e que respondesse a algumas questões não apenas do protagonista titular, mas também dos segredos por trás da intrincada engrenagem no cenário fashion. Enquanto nem tudo está perdido, principalmente no tocante à imagética da produção, aos exuberantes figurinos de caxemira e de ultrasuede e ao vibrante retrato da discoteca nova-iorquina, Murphy, isolando-se nos bastidores ao lado de Ian Brennan, Christina Vachon e tantos outros, deixa que Sharr White e Daniel Minahan tomem as rédeas da história e se esqueçam de, no final das contas, criar uma.

Após um interessante início, que explana a infância traumática e abusiva de Halston, os episódios parecem se valer muito do frenesi artístico do que de um enredo que realmente tenha começo, meio e fim. McGregor faz um trabalho excepcional ao incorporar os trejeitos marcantes do estilista, desde sua voz monotônica até seus bordões ácidos e irônicos – algo que também é visto na estupenda encarnação maior-que-a-vida de Krysta Rodriguez como Minnelli, até mesmo na rendição de “Liza with a Z”. Entretanto, performances à parte, White não tem ideia em qual direção deseja seguir – apenas que irá contar a ascensão, a queda e a ressurreição de um dos nomes mais controversos de todos os tempos. E, à medida que a obra se desenrola, novos personagens vão surgindo no horizonte para tornar as tramas ainda mais convulsionais.

É interessante notar de que forma Minahan tenta ao máximo se afastar da obviedade, por mais que respalde em algumas fórmulas dramáticas bastante vistas nas últimas décadas. O ponto mais atraente é, sem sombra de dúvida, a transposição cronológica às inflexões técnicas tanto dos enquadramentos de câmera quanto à fotografia de Tim Ives e William Rexer. O diretor acompanha a evolução (ou in-volução, se assim preferirem) da sociedade, mostrando todas as facetas de Halston através das roupas e de sua martirizada mente criativa, desde os enlaces românticos com os homens de Manhattan, as desavenças com Elsa Peretti (Rebecca Dayan) e Joe Eula (David Pittu) e a conquista de um mundo que, conforme ele mesmo diz, não estava preparado para o tinha a oferecer. A partir daí, nota-se uma afeição contraditória por uma atmosfera documental que aposta até mesmo numa reconstrução analógica ao mesmo tempo que abre espaço para a novelização.

O roteiro, por sua vez, tem como principal objetivo manter o público motivado e instigado por todos os eventos da vida de Halston, nos levando à Batalha de Versalhes com versões dos ilustres Oscar de la Renta e Anne Klein, mostrando o saudosismo narcótico do célebre Studio 54 e até mesmo calcando a tênue linha que separa a haute couture da produção em massa. O problema é que não há quaisquer explicações para a entrada e a saída de diversos coadjuvantes que, de fato, não têm nenhuma importância. O relacionamento de Halston com a magnata do jornalismo da moda ou com a própria mãe é jogado profusamente para aumentar a carga dramática, mas nunca sai da zona de conforto – pelo contrário, traz a personalidade do artista para uma superficialidade condenável. Em uma determinada sequência, há menção a bloqueios emocionais dos quais o estilista precisa se livrar – e ele faz isso com rapidez monumental demais para ser levado a sério.

Investindo esforços em um majestoso visual, Halston é familiar demais para representar alguma centelha de novidade nessa bolha de produções originais da Netflix e, eventualmente, nem os mais elegantes vestidos de tafetá e casacos trench coat são suficientes para desviar a atenção das múltiplas falhas que despontam na minissérie.

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