Nicole Kidman é uma das atrizes de maior prestígio do cenário do entretenimento – e já eternizou diversos papéis ao longo de sua prolífica carreira. E, continuando a expandir a própria filmografia, a atriz é protagonista de ‘Holland’, recente suspense do Prime Video que, apesar das ótimas intenções, não foge muito dos convencionalismos e desperdiça o talento de um elenco estelar em meio a uma trama tétrica e formulaica demais para ser levada a sério.
Na trama, Kidman dá vida a Nancy, uma professora da pequena cidade titular que fica no estado do Michigan, nos Estados Unidos. Nancy é a encarnação da classe média estadunidense, vivendo um dia de cada vez ao lado do marido, Fred (Matthew Macfadyen) e do filho de treze anos, Harry (Jude Hill), mantendo a classe e a compostura em um cotidiano que beira o idílico – mas que logo vira de cabeça para baixo. Após perceber certas incongruências entre as viagens do marido, que trabalha como optometrista, e alguns recibos que encontrou em seus casacos, bem como fotos Polaroid que ficam guardadas mesmo quando ninguém da família possui uma câmera desse tipo, Nancy começa a acreditar que Fred está tendo um caso.
Ela, então, se alia a um amigo que trabalha com ela na escola, o professor Dave (Gael García Bernal), para descobrir o que está acontecendo, dando início a um relacionamento de confidência entre os dois. É claro que a presença charmosa e cativante de Dave dá início a um caso romântico que Nancy não encara apenas como vingança, crente de que Fred está sendo infiel, mas como uma camada a mais em sua monótona vida de que não sabia que precisava até se lançar ao perigo. Contudo, segredos começam a ganhar espaço entre Nancy, Fred e Dave – e o trio se vê engolfado em uma perigosa artimanha que poderá terminar em grande tragédia.
Toda a estrutura cênica do longa-metragem é impecável e, de fato, esse é seu melhor aspecto. O design de produção assinado por JC Molina transforma Holland e a própria cronologia da narrativa, ambientada em meados dos anos 2000 considerando alguns aparelhos tecnológicos que aparecem aqui e ali, em uma espécie de cosmos anacrônico, em que tons exagerados e conflitantes permeiam sequências de “espionagem” e de melodrama. Há um uso convincente de objetos de cores esverdeadas, cuja escolha certeira dialoga com o perigo e a corrupção pelas quais todos os personagens passam – Fred envolto em obscuridades que se concretizam no terceiro ato do filme, Nancy e Dave mantendo um affair que vai de encontro às defesas da moral e dos bons costumes que são estandarte da cidade.
Até mesmo a direção de Mimi Cave, que alcançou enorme sucesso com o slasher ‘Fresh’, delineia-se de forma caprichosa e claustrofóbica, jogando-nos no mesmo labirinto moral de Nancy – à medida que abre espaço para outras incursões que, apesar de bem-vindas para compreendermos o arco dos personagens, não influenciam no andamento da trama principal. Em meio a breves acertos, o roteiro de Andrew Sodorski não tem ideia de qual caminho seguir, abrindo plots secundários que se espalham profusamente através de pouco mais de uma hora e quarenta de duração, culminando em erros crassos de ritmo que quebram toda a magia por trás do projeto.
A ideia principal é muito interessante e parte de uma premissa muito clássica na contação de histórias que é induzir o espectador a duvidar de tudo o que é contado em virtude da perspectiva: ao acompanharmos o vórtice de desconfiança em que Nancy se encontra, não sabemos, ao certo, se ela é confiável por completo ou se só deseja que tudo aquilo seja verdade para se libertar de uma vida que não tem muito mais a lhe oferecer – afinal, Fred a “salvou” e a levou para Holland para que ela finalmente se encontrasse. E o que acontece quando suas realizações não passam de projeções de outrem? Dentro desse espectro, Kidman nos entrega mais uma ótima performance, nutrindo de química aplaudível com Bernal e Macfadyen; porém, nem ela é forte o suficiente para salvar diálogos exauríveis e redundantes que mais preenchem lacunas do que, de fato, cumprem com seu objetivo.

‘Holland’ tem seus pontos altos, mas, infelizmente, os deslizes falam mais alto e transformam o que poderia ser um suspense interessante e instigante em uma bola de neve de convencionalismos que culmina em explicações ocasionais e uma conclusão previsível – que nos deixa com um gostinho agridoce de frustração.

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