Bem-vindo ao Hotel Califórnia
Sempre reclamamos que ideias originais estão cada vez mais raras em Hollywood. Quando se trata de produções mais caras, com artistas de prestígio, realizadores de renome e ideias de alto conceito (como a ficção científica mirada a um grande público), a coisa se torna ainda mais escassa. Tudo o que é feito – e dá certo – são sequências intermináveis e adaptações. Ou seja, reciclagem de material.
Bem, podemos dizer que algumas premissas de grande qualidade, porém, arriscadas costumam passar em branco, justamente por oferecer algo fora da caixinha da qual o público está acostumado. Por outro lado, para não sermos completamente injustos, é preciso dizer também que nem tudo que é original e ponto fora da curva se traduz em longa-metragem bem sucedido ou que funcione. Daí chegamos exatamente no ponto onde se encaixa este Hotel Artemis.
Lançado com a promessa de trazer frescor ao cinema entretenimento, Hotel Artemis nasceu de uma ideia original do roteirista Drew Pearce, renomado escritor de Hollywood que confeccionou os textos de Homem de Ferro 3 (2013) e Missão: Impossível – Nação Secreta (2015). O filme marca seu debute na direção de um longa e foi produzido pela bagatela de US$15 milhões – orçamento do lanche de megaproduções do nível de Vingadores, da Marvel por exemplo. Apesar da quantia pequena para uma produção ambiciosa, Pearce, com seu prestígio, foi capaz de alistar um verdadeiro elenco de astros e estrelas.
Jodie Foster, atriz duas vezes vencedora do Oscar (Acusados e O Silêncio dos Inocentes), é quem comanda o elenco como a protagonista e nome mais suntuoso à frente dos créditos. Ter a estrela em seu filme não é feito para qualquer um. Foster não estrelava um projeto desde 2013, quando participou ao lado de Matt Damon da ópera espacial Elysium, de Neill Blomkamp. A atriz, que freou bruscamente sua participação no cinema, só apareceu em três longas nesta década, Hotel Artemis é o quarto.
O papel que fez Jodie Foster sair de sua autoimposta reclusão foi o da Enfermeira, personagem (quase) sem nome, responsável pela administração do Hotel Artemis. A esta altura devemos mencionar que o filme se passa num futuro não muito distante, no qual a tecnologia e o caos mundial estão um passo adiante de nossa realidade presente. Neste cenário, no centro de Los Angeles, no meio de conflitos intensos – muito similares a uma zona de guerra urbana – por água limpa (escassa nesta versão semi-apocalíptica), se encontra o Hotel título, erguido como uma fortaleza impenetrável em meio à desordem. O recado social nada sutil, mas muito urgente, sobre um tema imprescindível, muito atual e discutido, se faz presente como pano de fundo da obra. E este é mais um item que amontoa o já muito lotado roteiro.
A proposta de Hotel Artemis é funcionar como uma espécie de hospital para criminosos, para que estes não precisem ir aos convencionais e correr o risco de serem presos. No entanto, você só é bem-vindo se for membro do seleto clube, como aprende da pior maneira possível o personagem de Kenneth Choi. Esta premissa foi percebida pelos fãs e comparada por eles ao The Continental, hotel de serventia similar nos filmes de ação John Wick, protagonizados por Keanu Reeves.
Sem perder muito tempo, somos jogados dentro de um assalto comandado por Sterling K. Brown (da fantástica minissérie The People VS O.J. Simpson) que dá errado e logo ele precisa se abrigar com os amigos feridos no local citado. Lá temos ainda a companhia de um almofadinha traficante de armas (Charlie Day) e uma exímia assassina, papel da sexy Sofia Boutella, além do enfermeiro grandalhão vivido por Dave Bautista (o Drax de Guardiões da Galáxia). A situação se agrava com a chegada de um poderoso rei da máfia (Jeff Goldblum) e uma policial ferida (Jenny Slate).
Parafraseando o grande e saudoso crítico Roger Ebert ao comentar sobre um filme do passado, Hotel Artemis é como jogar uma máquina de pinball com todas as bolas de uma vez só. A ideia para o projeto é interessante e criativa, mas o resultado fica parecendo que o longa passou por inúmeros cortes no estúdio para uma maior coesão e facilidade de compreensão, além de eventuais problemas de narrativa – sempre visando o ritmo mais acelerado.
São personagens demais, subtramas demais e muita coisa acontecendo em apenas 1h34min de projeção. Fora isso, nenhum dos personagens é desenvolvido de forma satisfatória, permanecendo no estágio da profundidade de pires e estereótipos. As cenas igualmente são pouco inspiradas e tudo caminha de uma forma imutável para a previsibilidade. Infelizmente é o tipo de filme cujas conclusões podemos perceber com bastante antecedência. Em sua segunda metade, Hotel Artemis joga fora qualquer elemento de seriedade, maturidade ou qualquer proposta de discutir temas relevantes, para se tornar apenas um veículo de ação. Estas duas ideias nunca conseguem coexistir, já que esta não era inicialmente a intensão. Existe um filme bacana escondido em algum lugar de Hotel Artemis, mas que, provavelmente, foi deixado na mesa de operação e faleceu.