Filme assistido durante o Festival de Sundance 2021
O peso e o amargor de uma juventude vivida à margem da sua própria existência fizeram de Masao um homem solitário. Como um imigrante oriental que cresceu e formou sua família no Havaí, ele parece jamais ter absorvido a essência dos valores familiares tradicionais da região. Agora idoso e em seus últimos dias, ele está diante da morte e se verá forçado a relembrar do passado e das escolhas ruins que lhe renderam uma vida solitária. I Was a Simple Man faz esse paralelo entre tempos, mostrando um presente em estado de decomposição, em contraste com as memórias antigas de um homem que viveu com medo. Fazendo uma profunda reflexão, o poderoso drama nos leva a ponderar sobre quem somos diante das circunstâncias da vida.
O cineasta Christopher Makoto Yogi retorna com seu segundo filme, que explora as belezas quase bucólicas do Havaí, em meio a um ar fúnebre e sombrio que cerca os últimos dias do seu protagonista. Trazendo a popular atriz Constance Wu como um quase fantasma do passado, o drama é repleto de metáforas sobre família, amor, erros e perdão, é sinestésico a plenos pulmões e busca fazer uma grandiosa simbologia do que é a morte para alguém que pouco soube viver. Com uma narrativa e estética autoral inspiradas no diretor Terrence Malick, o longa provavelmente não é para todos, mas conquista facilmente aqueles que sabem apreciar um cinema de caráter profundamente independente.
Com uma fotografia linda que se incorpora ao próprio roteiro, I Was a Simples Man é também um conto sobre ancestralidade racial, relações familiares e até mesmo traumas nascidos dentro deste contexto. De ritmo lento e com alegorias visuais das mais diversas, a produção traz Wu como uma narradora de poucas falas, que toma a audiência pela mão, levando-na por uma jornada inquietante sobre a despedida de um homem que nunca foi tudo o que poderia ter sido, tanto para si, como para sua família. E aqui, a atriz de As Golpistas brilha em uma doce e delicada performance, que revela um timbre suave e manso, que se comunica perfeitamente bem com a própria atmosfera havaiana do longa.
Trazendo um roteiro não linear, onde passado e presente se entrelaçam e se completam, o drama peca em seu primeiro ato, por ser lento e arrastado demais. No entanto, a trama cresce vertiginosamente, conforme o fragilizado quebra-cabeça da família de Masao vai tomando mais forma. E tentando expressar a máxima de que “morrer não é fácil“, como a própria Grace (Constance Wu) nos diz tão bem, I Was a Simple Man acaba se transformando em uma excelente tentativa de explicar o intangível, fazendo isso com delicadeza e com a doçura da certeza de que, mesmo em meio a tantos erros, é possível se redimir de um passado cheio de feridas não cicatrizadas.