segunda-feira , 23 dezembro , 2024

Crítica | Meu Anjo – Marion Cotillard em visceral drama de mãe e filha

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Vício Inerente

A dura realidade que não nos condiz soa muitas vezes tão surreal e estridente, ao ponto de ser desacreditada por completo. A vida real constantemente desafia a ficção, se sobrepondo a ela, inúmeras vezes nos fazendo reavaliar o que é ou não capaz de ocorrer factualmente. Pense bem, filme algum havia previsto um atentado terrorista tão grave no coração dos EUA quanto o que de fato recebemos. Neste aspecto, a forma que nós vivemos ao longo deste vasto globo não deveria seguir nos impressionando – mas continua.

Conforme mais velhos ficamos, mas proferimos frases do tipo: “jamais pensei que viveria para ver isso”, ou “agora já vi de tudo”, em nosso repertório. E uma mãe desqualificada para a criação de sua pequena filha existe aos montes. Crianças tendo que se criar sozinhas igualmente não é novidade. Tudo o que precisamos fazer é dar um pulo no centro do Rio de Janeiro para notarmos uma imensa quantidade de menores de idade se adaptando à sua própria realidade, afastados da família, sem qualquer amparo – e ao serem questionados pelas autoridades, todos exibirão seus progenitores facilmente.



Essa realidade existe pelo mundo e na França não é diferente. Por mais dura, incrível e revoltante que seja, o adjetivo menos aplicável talvez seja inverossímil. Mesmo que saibamos de cor e salteado o que deve (ou deveria) ser feito, esta não é uma história sobre isso. Sobre mundos perfeitos ou utopias. Esta é uma história sobre nosso mundo. Sobre os erros e não os acertos. Assim, desde os primeiros minutos de Meu Anjo, nova produção francesa estrelada pela musa vencedora do Oscar, Marion Cotillard, sabemos estar diante de um desastre de trem esperando para acontecer. Tudo que nos resta é acompanhar aflitos por tal momento.

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Na trama, Marlène é a mãe da pequena Elli. No entanto, o prêmio de mãe do ano passa bem longe da casa da mulher constantemente ao longo dos poucos anos de vida de sua cria. Marlène não pensa duas vezes antes de deixar a menina só e ir a uma festa em busca de um pretendente. Ou quem sabe arrasta a criança para um ambiente nada propício se der na telha, deixando a garota exposta a todo tipo de experiência imprópria para sua idade, como álcool, drogas e libertinagem. Quando arruma de fato alguém para passar a noite, não hesita em colocar Elli sozinha num táxi e a mandar para casa. E quando tira a sorte grande de encontrar alguém que queira se casar com ela, Marlène trai o sujeito na própria festa de casamento.

Marlène não é apenas a “mãe do ano”, é também a “cidadã do ano”. Ei, mas quem somos nós para julgar, certo? Que tipo de autoritarismo ditatorial iria querer tirar uma filha de sua mãe. Bem, existem muitas Marlènes no mundo. E pobres Ellis também. Saindo do conteúdo psicológico do texto, Marlène é também um presentaço da roteirista e diretora Vanessa Filho para sua estrela Marion Cotillard – que como esperado, brilha em seu retrato virtuoso de uma personagem detestavelmente humana e repleta de falhas. É um prato cheio para qualquer grande ator. E as últimas grandes obras da atriz em seu país de origem são justamente isso. Aqui, no entanto, Cotillard exprime sua personagem mais odiosa do repertório.

Se a potência de Cotillard é contínua e esperada, quem surpreende no terreno da interpretação é a jovem Ayline Aksoy-Etaix, estreante na carreira em seu primeiro trabalho, que vive Elli. Um misto de carisma e força performática, Etaix foi escolhida a dedo e entrega cenas difíceis com bastante propriedade. A diretora Filho, igualmente em seu debute em longas, ajuda com o encaixe das peças certeiras em seus lugares – como o trecho no qual filha adoradora percebe que sua vida estará melhor sem a mãe, e se esconde num armário. É de partir o coração e recheado de significado. Meu Anjo é assim, a cada novo momento oferecendo análises que vão além do aprofundamento psicológico e relacional até questões filosóficas. E se o indicado ao Oscar Projeto Flórida é uma ida a Disney, Meu Anjo é um tour desamparado por ruelas escuras de uma metrópole.

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A dura realidade que não nos condiz soa muitas vezes tão surreal e estridente, ao ponto de ser desacreditada por completo. A vida real constantemente desafia a ficção, se sobrepondo a ela, inúmeras vezes nos fazendo reavaliar o que é ou não capaz de ocorrer factualmente. Pense bem, filme algum havia previsto um atentado terrorista tão grave no coração dos EUA quanto o que de fato recebemos. Neste aspecto, a forma que nós vivemos ao longo deste vasto globo não deveria seguir nos impressionando – mas continua.

Conforme mais velhos ficamos, mas proferimos frases do tipo: “jamais pensei que viveria para ver isso”, ou “agora já vi de tudo”, em nosso repertório. E uma mãe desqualificada para a criação de sua pequena filha existe aos montes. Crianças tendo que se criar sozinhas igualmente não é novidade. Tudo o que precisamos fazer é dar um pulo no centro do Rio de Janeiro para notarmos uma imensa quantidade de menores de idade se adaptando à sua própria realidade, afastados da família, sem qualquer amparo – e ao serem questionados pelas autoridades, todos exibirão seus progenitores facilmente.

Essa realidade existe pelo mundo e na França não é diferente. Por mais dura, incrível e revoltante que seja, o adjetivo menos aplicável talvez seja inverossímil. Mesmo que saibamos de cor e salteado o que deve (ou deveria) ser feito, esta não é uma história sobre isso. Sobre mundos perfeitos ou utopias. Esta é uma história sobre nosso mundo. Sobre os erros e não os acertos. Assim, desde os primeiros minutos de Meu Anjo, nova produção francesa estrelada pela musa vencedora do Oscar, Marion Cotillard, sabemos estar diante de um desastre de trem esperando para acontecer. Tudo que nos resta é acompanhar aflitos por tal momento.

Na trama, Marlène é a mãe da pequena Elli. No entanto, o prêmio de mãe do ano passa bem longe da casa da mulher constantemente ao longo dos poucos anos de vida de sua cria. Marlène não pensa duas vezes antes de deixar a menina só e ir a uma festa em busca de um pretendente. Ou quem sabe arrasta a criança para um ambiente nada propício se der na telha, deixando a garota exposta a todo tipo de experiência imprópria para sua idade, como álcool, drogas e libertinagem. Quando arruma de fato alguém para passar a noite, não hesita em colocar Elli sozinha num táxi e a mandar para casa. E quando tira a sorte grande de encontrar alguém que queira se casar com ela, Marlène trai o sujeito na própria festa de casamento.

Marlène não é apenas a “mãe do ano”, é também a “cidadã do ano”. Ei, mas quem somos nós para julgar, certo? Que tipo de autoritarismo ditatorial iria querer tirar uma filha de sua mãe. Bem, existem muitas Marlènes no mundo. E pobres Ellis também. Saindo do conteúdo psicológico do texto, Marlène é também um presentaço da roteirista e diretora Vanessa Filho para sua estrela Marion Cotillard – que como esperado, brilha em seu retrato virtuoso de uma personagem detestavelmente humana e repleta de falhas. É um prato cheio para qualquer grande ator. E as últimas grandes obras da atriz em seu país de origem são justamente isso. Aqui, no entanto, Cotillard exprime sua personagem mais odiosa do repertório.

Se a potência de Cotillard é contínua e esperada, quem surpreende no terreno da interpretação é a jovem Ayline Aksoy-Etaix, estreante na carreira em seu primeiro trabalho, que vive Elli. Um misto de carisma e força performática, Etaix foi escolhida a dedo e entrega cenas difíceis com bastante propriedade. A diretora Filho, igualmente em seu debute em longas, ajuda com o encaixe das peças certeiras em seus lugares – como o trecho no qual filha adoradora percebe que sua vida estará melhor sem a mãe, e se esconde num armário. É de partir o coração e recheado de significado. Meu Anjo é assim, a cada novo momento oferecendo análises que vão além do aprofundamento psicológico e relacional até questões filosóficas. E se o indicado ao Oscar Projeto Flórida é uma ida a Disney, Meu Anjo é um tour desamparado por ruelas escuras de uma metrópole.

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