sexta-feira , 22 novembro , 2024

Crítica | ‘Midnights’ funciona como uma culminação testamentária da carreira de Taylor Swift

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Taylor Swift é uma das artistas de maior renome do cenário fonográfico contemporâneo – e uma das mais prolíficas também. Desde 2020, por exemplo, ela lançou o aclamado álbum folklore, que lhe rendeu sua terceira estatueta de Álbum do Ano do Grammy Awards, o impecável evermore e duas regravações de produções antigas, Fearless (Taylor’s Version)’ e ‘Red (Taylor’s Version)’ (todos conquistando o público e a crítica mundiais). Agora, Swift retorna para o mundo da música com mais um compilado de originais conhecido como Midnights, cuja nostalgia não se restringe apenas à estética visual, como a uma divulgação em peso que incluiu o anúncio de cada uma das faixas em um especial intitulado Midnights Mayhew with Me.

A cantora e compositora sempre teve uma mente mercadológica bastante aguçada – e isso é refletido na composição e na arquitetura de cada disco que ela venha a lançar. Aqui, a ideia principal por trás das 13 faixas inéditas é mergulhar no intimismo das noites em claro que Swift passou, que serviram inclusive de ápice catártico e criativo, como ela comentou em postagens promocionais. No final das contas, entre altos e baixos, o resultado é o que poderíamos esperar de uma incursão da incrível discografia de Taylor, consagrando-se como uma culminação testamentária de todas as experiências pelas quais passou em sua vida.



Em Midnights, a barreira entre imagem e som é diluída como nunca antes dentro das produções de Swift: a visão setentista não aparece apenas nas fotos de divulgação, mas na construção das canções, adotando uma persona propositalmente anacrônica ao tempo e à sucessão dos eventos e gestando um universo único que abarca as outras eras da artista. Temos uma remodelação do glam-rock e do art rock, aglutinados à supressão terminológica do dream-pop, do pop-rock e do new wave: isso significa que o principal elemento que vem com urgência nas músicas é um potente e dissonante sintetizador que serve como ponto de apoio para que as narrativas convirjam em um canal em comum – que é explorar sentimentos particular e espontâneos, desde uma espécie de síndrome de impostor até o significado de estar apaixonado.

A obra não tem o melhor dos começos, por assim dizer, mas é feita com inteligência o suficiente para não estragar a surpresa das faixas seguintes: “Lavender Haze” almeja pelo minimalismo, principalmente por dar espaço para a rendição de Swift tomarem forma, porém, a progressão repetitiva deixa a desejar, enquanto a superposição de camadas vocais parece destoar do restante. Além disso, a estrutura instrumental e a cadência dos versos parecem homenagear demais artistas que já fizeram isso antes – como Lana Del Rey, que participa de uma das tracks, Selena Gomez e a recém-estreada Olivia Rodrigo. Em relação à composição não há muito o que falar: Taylor sempre foi uma força incomparável em relação à lírica (“eu fiquei sob escrutínio, você lidou com isso lindamente” é uma das várias entradas que nos chamam a atenção).

Logo na primeira metade, temos inflexões poéticas aplaudíveis e que se configuram como algumas das melhores da carreira da performer. “Maroon”, em contraposição à faixa anterior, mergulha na repetição tonal de modo evocativo, nos levando de volta para 1989 e ‘Lover’ (em especial a faixa “The Archer”, que grita synth-dream com todas as forças) e guiada por uma espécie de teoria de cores que dialoga com sensações e com a realidade percebida pela cantora; “Anti-Hero”, uma grata surpresa do álbum, parte de uma configuração similar sem perder uma idiossincrasia interessante (a profunda aliteração) e servindo como um discurso confessional de autossabotagem, marcado por “sou eu… Oi… Eu sou o problema, sou eu”. Ambas as canções são irretocáveis, envolventes e ecoantes, dialogando com qualquer um que já tenho passado por qualquer uma das situações acima delineadas.

Há outras iterações que merecem atenção dos ouvintes e que estão lado a lado com as supracitadas. “Question…?”, ainda que recicle progressões do mesmo álbum e de anteriores, se vale bastante do saudosismo que se inicia logo no refrão, com os versos “posso lhe fazer uma pergunta? Você já foi beijado em uma multidão? E todos os seus amigos zombavam de você?” infundidos com uma retórica apaixonante e explosiva; “Vigilant Shit”, sem sombra de dúvida a faixa mais original, puxa aspectos de ‘Reputation’ para um electro-synth comedido e uma história de vingança arrepiante (“eu não me visto para mulheres, não me visto para homens; ultimamente, me visto para vingança”), arrancando semelhanças de “Look What You Made Me Do” e pincelando com pulsões à la Charli XCX.

A coesão é algo que não falta em Midnights – e, justaposta à composição, essa é a maior conquista do álbum. Todavia, é necessário mencionar os deslizes cometidos por Taylor e pelo colaborador de longa data Jack Antonoff, também responsável pela produção. Tudo o que ouvimos aqui não traz nada de novo à discografia de Swift, representando, talvez, uma emulação do que ela já nos entregou. Para além das repetições mencionadas nos parágrafos acima, os problemas se estendem para a temática, que não foge muito do convencionalismo, apesar de descrita com maestria; “Snow On The Beach” desperdiça um dos maiores talentos da atualidade, colocando Del Rey em versos longínquos e que não representam suas habilidades; “Midnight Rain” se inicia com um autotune desnecessário e que funciona como coadjuvante da música seguinte; e “Sweet Nothing” parece uma música descartada de evermore.

Não posso tirar mérito, entretanto, de referências inesperadas que aparecem no álbum. O art rock, mesmo não esquadrinhado em sua totalidade, é fruto de emulações que provém de atos como Triumvirat e Wallenstein, seja na confecção das vibrantes notas, seja na amálgama entre o sintetizador, a guitarra, o baixo e a bateria; já a universalização conceitual permite que Swift mantenha-se fiel ao que fazia desde sua estreia no cenário fonográfico – que é conquistar o público pelo que sabe fazer de melhor: enredar coisas comuns a todos nós.

Midnights é uma boa obra e funciona na maior parte, mesmo não tendo o frescor de títulos predecessores. No final das contas, a produção funciona como uma culminação testamentária do que Swift foi, é e continuará a ser décadas depois de ter nos deixado – uma jornada breve no tempo e permanente no impacto, que, de fato, não pensa duas vezes antes de fazer o que bem entender.

Nota por faixa:

1. Lavender Haze – 2,5/5
2. Maroon – 5/5
3. Anti-Hero – 5/5
4. Snow on the Beach, feat. Lana Del Rey – 2/5
5. You’re on Your Own, Kid – 4/5
6. Midnight Rain – 3/5
7. Question…? – 4,5/5
8. Vigilante Shit – 5/5
9. Bejeweled – 3/5
10. Labyrinth – 3/5
11. Karma – 4/5
12. Sweet Nothing – 3/5
13. Mastermind – 4,5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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A cantora e compositora sempre teve uma mente mercadológica bastante aguçada – e isso é refletido na composição e na arquitetura de cada disco que ela venha a lançar. Aqui, a ideia principal por trás das 13 faixas inéditas é mergulhar no intimismo das noites em claro que Swift passou, que serviram inclusive de ápice catártico e criativo, como ela comentou em postagens promocionais. No final das contas, entre altos e baixos, o resultado é o que poderíamos esperar de uma incursão da incrível discografia de Taylor, consagrando-se como uma culminação testamentária de todas as experiências pelas quais passou em sua vida.

Em Midnights, a barreira entre imagem e som é diluída como nunca antes dentro das produções de Swift: a visão setentista não aparece apenas nas fotos de divulgação, mas na construção das canções, adotando uma persona propositalmente anacrônica ao tempo e à sucessão dos eventos e gestando um universo único que abarca as outras eras da artista. Temos uma remodelação do glam-rock e do art rock, aglutinados à supressão terminológica do dream-pop, do pop-rock e do new wave: isso significa que o principal elemento que vem com urgência nas músicas é um potente e dissonante sintetizador que serve como ponto de apoio para que as narrativas convirjam em um canal em comum – que é explorar sentimentos particular e espontâneos, desde uma espécie de síndrome de impostor até o significado de estar apaixonado.

A obra não tem o melhor dos começos, por assim dizer, mas é feita com inteligência o suficiente para não estragar a surpresa das faixas seguintes: “Lavender Haze” almeja pelo minimalismo, principalmente por dar espaço para a rendição de Swift tomarem forma, porém, a progressão repetitiva deixa a desejar, enquanto a superposição de camadas vocais parece destoar do restante. Além disso, a estrutura instrumental e a cadência dos versos parecem homenagear demais artistas que já fizeram isso antes – como Lana Del Rey, que participa de uma das tracks, Selena Gomez e a recém-estreada Olivia Rodrigo. Em relação à composição não há muito o que falar: Taylor sempre foi uma força incomparável em relação à lírica (“eu fiquei sob escrutínio, você lidou com isso lindamente” é uma das várias entradas que nos chamam a atenção).

Logo na primeira metade, temos inflexões poéticas aplaudíveis e que se configuram como algumas das melhores da carreira da performer. “Maroon”, em contraposição à faixa anterior, mergulha na repetição tonal de modo evocativo, nos levando de volta para 1989 e ‘Lover’ (em especial a faixa “The Archer”, que grita synth-dream com todas as forças) e guiada por uma espécie de teoria de cores que dialoga com sensações e com a realidade percebida pela cantora; “Anti-Hero”, uma grata surpresa do álbum, parte de uma configuração similar sem perder uma idiossincrasia interessante (a profunda aliteração) e servindo como um discurso confessional de autossabotagem, marcado por “sou eu… Oi… Eu sou o problema, sou eu”. Ambas as canções são irretocáveis, envolventes e ecoantes, dialogando com qualquer um que já tenho passado por qualquer uma das situações acima delineadas.

Há outras iterações que merecem atenção dos ouvintes e que estão lado a lado com as supracitadas. “Question…?”, ainda que recicle progressões do mesmo álbum e de anteriores, se vale bastante do saudosismo que se inicia logo no refrão, com os versos “posso lhe fazer uma pergunta? Você já foi beijado em uma multidão? E todos os seus amigos zombavam de você?” infundidos com uma retórica apaixonante e explosiva; “Vigilant Shit”, sem sombra de dúvida a faixa mais original, puxa aspectos de ‘Reputation’ para um electro-synth comedido e uma história de vingança arrepiante (“eu não me visto para mulheres, não me visto para homens; ultimamente, me visto para vingança”), arrancando semelhanças de “Look What You Made Me Do” e pincelando com pulsões à la Charli XCX.

A coesão é algo que não falta em Midnights – e, justaposta à composição, essa é a maior conquista do álbum. Todavia, é necessário mencionar os deslizes cometidos por Taylor e pelo colaborador de longa data Jack Antonoff, também responsável pela produção. Tudo o que ouvimos aqui não traz nada de novo à discografia de Swift, representando, talvez, uma emulação do que ela já nos entregou. Para além das repetições mencionadas nos parágrafos acima, os problemas se estendem para a temática, que não foge muito do convencionalismo, apesar de descrita com maestria; “Snow On The Beach” desperdiça um dos maiores talentos da atualidade, colocando Del Rey em versos longínquos e que não representam suas habilidades; “Midnight Rain” se inicia com um autotune desnecessário e que funciona como coadjuvante da música seguinte; e “Sweet Nothing” parece uma música descartada de evermore.

Não posso tirar mérito, entretanto, de referências inesperadas que aparecem no álbum. O art rock, mesmo não esquadrinhado em sua totalidade, é fruto de emulações que provém de atos como Triumvirat e Wallenstein, seja na confecção das vibrantes notas, seja na amálgama entre o sintetizador, a guitarra, o baixo e a bateria; já a universalização conceitual permite que Swift mantenha-se fiel ao que fazia desde sua estreia no cenário fonográfico – que é conquistar o público pelo que sabe fazer de melhor: enredar coisas comuns a todos nós.

Midnights é uma boa obra e funciona na maior parte, mesmo não tendo o frescor de títulos predecessores. No final das contas, a produção funciona como uma culminação testamentária do que Swift foi, é e continuará a ser décadas depois de ter nos deixado – uma jornada breve no tempo e permanente no impacto, que, de fato, não pensa duas vezes antes de fazer o que bem entender.

Nota por faixa:

1. Lavender Haze – 2,5/5
2. Maroon – 5/5
3. Anti-Hero – 5/5
4. Snow on the Beach, feat. Lana Del Rey – 2/5
5. You’re on Your Own, Kid – 4/5
6. Midnight Rain – 3/5
7. Question…? – 4,5/5
8. Vigilante Shit – 5/5
9. Bejeweled – 3/5
10. Labyrinth – 3/5
11. Karma – 4/5
12. Sweet Nothing – 3/5
13. Mastermind – 4,5/5

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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