Chegou a época do ano mais badalada para os fãs de terror – e aqui, no Cinepop, não seria diferente, já que nós também somos fãs do gênero. Esse ano, como uma grata surpresa, tivemos em seções antecipadas do Festival do Rio 2023 (inclusive durante a repescagem do Festival) algumas exibições do filme de terror ‘Não Abra!’, que chega a partir desta semana ao circuito nacional. E que bom poder ter essa movimentação de distribuição no circuito, pois demonstra que o público consumidor brasileiro está interessado e aberto as novas produções no gênero do terror.
Samidha (Megan Suri) é uma jovem adolescente de ascendência indiana que tem apenas um desejo: ser aceita na escola, tal qual qualquer outra adolescente. A questão é que, morando nos Estados Unidos, seus traços fenotípicos indianos são evidentes. Embora seus amigos não a tratem com diferenciação e Russ (Gage Marsh) esteja interessado nela, Sam sente vergonha de sua família, que participa de eventos culturais tradicionais de sua comunidade, e de sua melhor amiga de infância, também indiana, Tamira (Mohana Krishnan), que, de uns tempos pra cá, tem andado bastante esquisita pelos cantos da escola. Porém, quando Tamira desaparece e Sam passa a sentir que está sendo perseguida por algo ou alguém, ela terá que buscar na sua origem as respostas para sobreviver à uma criatura maligna.
‘Não Abra!’ é um filme de terror produzido pelos mesmos produtores de outro longa do gênero que fez muito sucesso recentemente na cultura pop: ‘Corra!’. Para quem viu o filme anterior, dá para enxergar semelhanças entre ambos os projetos: os dois têm como pano de fundo o choque cultural de pessoas racializadas que, em um contexto majoritariamente branco dos Estados Unidos, tentam se relacionar e se encaixar no grande dilema entre assimilação cultural e a valorização dos próprios raízes. Além disso, a última cena de ‘Não Abra!’ lembra muito uma cena clássica de ‘Corra!’, à qual os fãs vão reconhecer facilmente.
O roteiro de Bishal Dutta e Ashish Mehta é basicamente a história padrão de uma adolescente sendo assombrada por uma entidade do além e tentando sobreviver a qualquer custo a esta ameaça. Esse é o argumento de muitos filmes de terror, mas a diferença reside no contexto em que se insere este mote: a protagonista não é uma mera adolescente mimada, mas sim uma jovem em crise de identidade entre as suas raízes culturais e o mundo ocidental capitalista no qual está inserida junto com seus amigos; ao mesmo tempo, a grande ameaça em nada tem a ver com os conceitos já trabalhados em outros filmes – aqui a protagonista precisa assumir sua identidade para conseguir lidar com a ameaça. Nesse sentido, o roteiro vai trabalhando essa construção gradualmente, em um primeiro momento nos deixando com raiva da protagonista mimada e, aos poucos, moldando-a e organicamente dando visibilidade aos elementos que, de primeira, dão a impressão apenas de estarem compondo o cenário.
O jovem diretor Bishal Dutta dialoga bem com a geração millenial, imprimindo as angústias sociais identitárias num dos gêneros queridinhos dos jovens. ‘Não Abra!’ surpreende com boas cenas de terror em uma história coerente e possível de acontecer, deixando uma porta aberta para uma possível continuação. Um dos melhores de terror desse ano.