Woody Allen é um dos maiores diretores de cinema do mundo. Não é mistério para ninguém que, tal como o espanhol Pedro Almodóvar, Woody faz com que seus filmes circulem sempre sobre o mesmo tema, e seus protagonistas invariavelmente se assemelham ao próprio diretor – seja na estética, na religião, na profissão, etc. Assim, não é nenhuma surpresa o mote de ‘O Festival do Amor’, seu mais novo filme com lançamento em território nacional, cujas sessões foram antecipadas no Festival do Rio 2021 e que entra no circuito das salas de cinema brasileiras na semana do Natal.
Mort (Wallace Shawn) está acompanhando sua esposa, Sue (Gina Gershon), no Festival de Cinema de San Sebastián, ao norte da Espanha. Sue é assessora de imprensa do famoso diretor Philippe (Louis Garrel), que é a mais nova sensação do momento, o diretor mais requisitado do evento. Enquanto Sue acompanha Phillippe para cima e para baixo, Mort tenta ocupar seu tempo passeando pela cidade, enquanto sua mente projeta mil e uma formas como sua esposa pode estar traindo-o com o diretor de cinema – e, a cada nova ideia, Mort sente um sintoma diferente de alguma doença. Até ele conhecer a Dra. Jo Rojas (Elena Anaya), que parece ter a solução de todos os seus problemas – de saúde e de amor.
Filmado na belíssima San Sebastián, um dos pontos altos de ‘O Festival do Amor’ é justamente a locação. As tomadas com a praia paradisíaca ao fundo ou na entrada do charmosíssimo hotel onde se passa o tal festival são tão pulsantes, que faz qualquer um incluir a cidade praiana na lista de locais para conhecer antes de morrer. Entretanto, não estamos falando de um filme turístico, mas sim de uma ficção, e, portanto, a locação não deveria ser o ponto alto.
O protagonista Mort, como bem dito algumas vezes ao longo do filme (inclusive por ele mesmo), é um chato. Pior: é maçante, pedante, soberbo e paranoico. Bom, em se tratando de Woody Allen, um protagonista paranoico já é de se esperar, porém, Mort é simplesmente aquele cara com quem você não quer encontrar em um evento: nem ele gosta de si mesmo. Em sua crise existencial – o longa começa com ele em uma sessão de análise, refletindo sobre o ocorrido na viagem –, qualquer personagem se torna mais interessante que ele, incluindo o amigo Tomás Lopez (Enrique Arce, o Arturito de ‘La Casa de Papel’), que faz uma participação no longa. Aliás, a presença de Tomás e de Georgina Amorós, de ‘Élite’, no filme, mostra o quanto Woody Allen está antenado nas produções espanholas e na nova geração de atores oriundos do conteúdo pop da Netflix – iniciado em ‘Um Dia de Chuva em Nova York’, seu projeto anterior, com Timothée Chalamet, Selena Gomez e Elle Fanning. Pode ser um sinal de novos tempos na carreira do diretor, buscando cativar os novos espectadores.
Em mais um filme de ficção semibiográfico, ‘O Festival do Amor’ é agradável, ainda que com um protagonista nem um pouco cativante. É uma mostra de que Woody Allen continua contando a mesma história, tentando vencer fronteiras trazendo queridinhos da cultura pop para seu elenco e descentrando sua história de Nova York. Ainda assim, ‘O Festival do Amor’ faz bela homenagem a grandes mestres do cinema mundial, especialmente os europeus, com cenas recriadas e inspiradas em famosos filmes de Bergman e outros cineastas, e, portanto, se torna filme obrigatório para todo bom cinéfilo.