A natureza e suas possibilidades. Vencedor do Leão de Prata no Festival de Veneza do ano passado, o novo trabalho do excelente cineasta japonês Ryusuke Hamaguchi, bem longe de ser um filme comercial, opta por uma narrativa densa onde apresenta confrontos que envolvem o meio ambiente e seu equilíbrio. A partir de uma pequena aldeia, onde a água é muito importante, e os prováveis impactos de um empreendimento criado por gestores ignorantes sobre a região, O Mal não Existe apresenta fortes argumentos com inúmeros paralelos com a realidade construindo suas perspectivas através de olhares conflitantes.
Na trama, acompanhamos um homem que mora numa região gelada de apenas 6.000 habitantes no interior do Japão. Ele vive com sua filha e trabalha como uma espécie de faz tudo da região, além de ser um grande conhecedor do lugar. Quando uma empresa de Glamping (algo como um acampamento confortável) resolve criar um empreendimento no lugar, uma área para turistas vindos principalmente de Tóquio, o protagonista e moradores entram em desacordo com a empresa.
A relação dos seres humanos com a natureza é algo bem explorável nesse roteiro contemplativo. É preciso paciência, as peças vão se montando aos poucos e cada detalhe é fundamental. As pausas para o refletir se somam às reflexões em relação a ação do homem na natureza e os impactos disso em uma sociedade. Muitas variáveis dão a sensação de comporem um enorme tabuleiro, um jogo da vida onde o capitalismo sempre arranja força para derrubar o que sempre esteve presente. Mas aqui, a luz chega com a resistência.
De um lado famílias que vivem do que a natureza produz, do outro ações desenfreadas, no caso, atrás de subsídios do governo pós-pandemia. Mesmo num dos países mais desenvolvidos do planeta, a ação do homem abraçado à ganância tira da zona de conforto qualquer resolução trivial. Pensando como obra cinematográfica, há uma ponte que pode gerar reações diversas, que liga o certeiro discurso até a concepção audiovisual. A mensagem está nítida mas a maneira como se entrega ela vai depender da paciência do espectador.
Com uma impactante trilha sonora composta pela artista Eiko Ishibashi, que já trabalhara com o diretor no sucesso mundial Drive my Car, o cinema como crítica social alcança sua força através do olhar sensível de um dos cineastas japoneses mais elogiados da atualidade.