sexta-feira , 21 fevereiro , 2025

Crítica | O Menino que Descobriu o Vento – Drama africano possui mensagem fortíssima


Baseado na história real do malawiano William Kamkwamba, O Menino que Descobriu o Vento (The Boy Who Harnessed the Wind) tinha todos os elementos para ser uma obra de desespero e redenção. Nas mãos de Chiwetel Ejiofor (12 Anos de Escravidão), no entanto,  o roteiro constrói uma longa ponte de contextualização e explicações para que o título, enfim, torna-se uma realidade. Como o final da história não é a surpresa, o encantador do filme é mergulhar na discussão cultural, política e social do Malawi.

Para realizar este filme, Ejiofor dedicou alguns anos em conhecer a cultura e a língua local malawiana, tanto que 80% da obra é falada no idioma local, o nianja, e pontuada (principalmente em território escolar) em inglês. Logo no início, o filme apresenta a família orgulhosa de William (Maxwell Simba) por vestir o uniforme e ir à escola secundária da região. A educação e a sua importância transformadora é a grande mensagem do filme, sendo ressaltada sempre que possível.



The Boy Who Harnessed the Wind6

Partindo do microssistema da família Kamkwamba e o seu vilarejo, o diretor e roteirista estreante aborda as questões macros de exploração, democracia de fachada, mudanças climáticas e meio ambiente. Centrado na dinâmica familiar, o fazendeiro Trywell Kamkwamba (Chiwetel Ejiofor) tem que fazer a difícil escolha de abrir mão da educação dos filhos para preservar suas terras, meio de subsistência de todos. A temporada de chuvas, contudo, os deixam sem colheita e à mercê das companhias de tabaco, as quais assediam suas terras.

Em consequência de derrubada de árvores na região, as águas das chuvas inundam as plantações, devastando toda a colheita. Com a falta de previsão de chuvas e um sistema de irrigação, em conjunto com a política mundial externa, o povoado de Malawi vê-se perto da situação de fome. De forma brilhante e simples, o roteiro nos situa no tempo por meio da cena quando William demonstra como fazer o rádio voltar a funcionar através da geração de energia para os amigos, enquanto eles buscam escutar o futebol passa a notícia do atentado às Torres Gêmeas nos Estados Unidos.


The Boy Who Harnessed the Wind1

Essa questão não é apenas um marcador temporal, mas também mais um dos fatores de desespero da população sujeita ao descaso do governo. Cada cena é lapidada para apresentar o ambiente de opressão, desesperança e letargia em relação ao resto do mundo, nos transportando para a perspectiva de vida de William. Por exemplo, na ausência de luz, o menino não consegue estudar a noite e é obrigado a deixar a sala de aula por falta de pagamento. William reconhece a educação como um privilégio, a qual ele tenta alcançar por outros meios, como visitas à biblioteca.

Apesar de serem os coadjuvantes dessa narrativa, os pais Trywell e Agnes (Aïssa Maïga) são os pilares de cada linha traçada por William, desde a sua curiosidade até a sua aptidão de acreditar em suas ações. Uma das cenas mais emocionantes e bonitas ocorre já na parte final do longa, quando logo depois da filha mais velha Annie (Lily Banda) abandonar a família para ser uma boca a menos para alimentar, Agnes pergunta ao marido: “Quando vamos parar de perder?” e grossas lágrimas escorrem pelos olhos de ambos, enquanto o seu bebê permanece em suas costas seguro pelo sling.

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The Boy Who Harnessed the Wind3

O questionamento vem do confronto entre pai e filho baseado na descrença de um e na teimosia de outro, respectivamente. Após tentar construir um dínamo por conta própria sem sucesso, ele pede em desespero que a irmã peça ao professor Mike Kachigunda (Lemogang Tsipa) o dínamo da bicicleta dele. Ela entrega e vai embora com o professor para viver romance escondido deles.

Com o dínamo em mãos, William começa a sua trajetória para convencer os amigos que ele é capaz de trazer água para região por meio dos ventos. Primeiro, ele constrói um pequeno projeto para provar o seu ponto de vista e os amigos passam a apoiá-lo logo que veem o rádio tocar através das correntes geradas do vento em uma pequeno catavento. Para fazer a bomba d’água funcionar, entretanto, ele precisa de um moinho, ou seja, muito mais material e, principalmente, trabalho em conjunto.

The Boy Who Harnessed the Wind4

Quando já passou mais de um uma hora e meia de filme, William ainda está em busca de construir o seu projeto. A narrativa detalhista evidencia as relações familiares e principalmente a estima de perseverança independente da pouca credibilidade de um menino de 13 anos perante os adultos. Seu próprio pai recusa o desmonte da sua bicicleta para construir um moinho, afinal ele não conhece nada sobre eletricidade e o projeto pode parecer impossível aos leigos.

Com vigorosas atuações, O Menino que Descobriu o Vento apresenta reflexões avassaladoras de como a gente lida com o privilégio do conhecimento e as condições de vida adversas de forma banalizada. Quantas vezes lemos sobre o Malawi, sobre a sua gente e os seus problemas? Chiwetel Ejiofor faz os espectadores pararem de olhar para o próprio umbigo por duas horas e reconhecer os méritos de William Kamkwamba, além de como um ato de persistência pode mudar a vida de milhares.


IMPERDÍVEL! Você vai VICIAR nessa história de Vingança à moda antiga....

Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Para realizar este filme, Ejiofor dedicou alguns anos em conhecer a cultura e a língua local malawiana, tanto que 80% da obra é falada no idioma local, o nianja, e pontuada (principalmente em território escolar) em inglês. Logo no início, o filme apresenta a família orgulhosa de William (Maxwell Simba) por vestir o uniforme e ir à escola secundária da região. A educação e a sua importância transformadora é a grande mensagem do filme, sendo ressaltada sempre que possível.

The Boy Who Harnessed the Wind6

Partindo do microssistema da família Kamkwamba e o seu vilarejo, o diretor e roteirista estreante aborda as questões macros de exploração, democracia de fachada, mudanças climáticas e meio ambiente. Centrado na dinâmica familiar, o fazendeiro Trywell Kamkwamba (Chiwetel Ejiofor) tem que fazer a difícil escolha de abrir mão da educação dos filhos para preservar suas terras, meio de subsistência de todos. A temporada de chuvas, contudo, os deixam sem colheita e à mercê das companhias de tabaco, as quais assediam suas terras.

Em consequência de derrubada de árvores na região, as águas das chuvas inundam as plantações, devastando toda a colheita. Com a falta de previsão de chuvas e um sistema de irrigação, em conjunto com a política mundial externa, o povoado de Malawi vê-se perto da situação de fome. De forma brilhante e simples, o roteiro nos situa no tempo por meio da cena quando William demonstra como fazer o rádio voltar a funcionar através da geração de energia para os amigos, enquanto eles buscam escutar o futebol passa a notícia do atentado às Torres Gêmeas nos Estados Unidos.

The Boy Who Harnessed the Wind1

Essa questão não é apenas um marcador temporal, mas também mais um dos fatores de desespero da população sujeita ao descaso do governo. Cada cena é lapidada para apresentar o ambiente de opressão, desesperança e letargia em relação ao resto do mundo, nos transportando para a perspectiva de vida de William. Por exemplo, na ausência de luz, o menino não consegue estudar a noite e é obrigado a deixar a sala de aula por falta de pagamento. William reconhece a educação como um privilégio, a qual ele tenta alcançar por outros meios, como visitas à biblioteca.

Apesar de serem os coadjuvantes dessa narrativa, os pais Trywell e Agnes (Aïssa Maïga) são os pilares de cada linha traçada por William, desde a sua curiosidade até a sua aptidão de acreditar em suas ações. Uma das cenas mais emocionantes e bonitas ocorre já na parte final do longa, quando logo depois da filha mais velha Annie (Lily Banda) abandonar a família para ser uma boca a menos para alimentar, Agnes pergunta ao marido: “Quando vamos parar de perder?” e grossas lágrimas escorrem pelos olhos de ambos, enquanto o seu bebê permanece em suas costas seguro pelo sling.

The Boy Who Harnessed the Wind3

O questionamento vem do confronto entre pai e filho baseado na descrença de um e na teimosia de outro, respectivamente. Após tentar construir um dínamo por conta própria sem sucesso, ele pede em desespero que a irmã peça ao professor Mike Kachigunda (Lemogang Tsipa) o dínamo da bicicleta dele. Ela entrega e vai embora com o professor para viver romance escondido deles.

Com o dínamo em mãos, William começa a sua trajetória para convencer os amigos que ele é capaz de trazer água para região por meio dos ventos. Primeiro, ele constrói um pequeno projeto para provar o seu ponto de vista e os amigos passam a apoiá-lo logo que veem o rádio tocar através das correntes geradas do vento em uma pequeno catavento. Para fazer a bomba d’água funcionar, entretanto, ele precisa de um moinho, ou seja, muito mais material e, principalmente, trabalho em conjunto.

The Boy Who Harnessed the Wind4

Quando já passou mais de um uma hora e meia de filme, William ainda está em busca de construir o seu projeto. A narrativa detalhista evidencia as relações familiares e principalmente a estima de perseverança independente da pouca credibilidade de um menino de 13 anos perante os adultos. Seu próprio pai recusa o desmonte da sua bicicleta para construir um moinho, afinal ele não conhece nada sobre eletricidade e o projeto pode parecer impossível aos leigos.

Com vigorosas atuações, O Menino que Descobriu o Vento apresenta reflexões avassaladoras de como a gente lida com o privilégio do conhecimento e as condições de vida adversas de forma banalizada. Quantas vezes lemos sobre o Malawi, sobre a sua gente e os seus problemas? Chiwetel Ejiofor faz os espectadores pararem de olhar para o próprio umbigo por duas horas e reconhecer os méritos de William Kamkwamba, além de como um ato de persistência pode mudar a vida de milhares.

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Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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