domingo , 29 dezembro , 2024

Crítica | O Mensageiro – Lúcia Murat Traz Outro Olhar sobre a Ditadura em Filme com Valentina Herszage

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Lúcia Murat é uma diretora e roteirista que, em sua trajetória no cinema, quase sempre abordou o tempo da ditadura militar brasileira como cenário de boa parte de seus filmes. Tendo a própria diretora sido presa pelos militares na época, aos poucos, em seus filmes, a diretora vai tecendo episódios e temáticas que costuram uma cortina que busca trazer um panorama para o espectador do que teria sido a vivência de alguém naquela época, fosse de que lado fosse. Se em boa parte dos filmes o olhar sempre foi sobre o cidadão comum que sofre nas mãos dos militares (como abordado no documentário ‘Que Bom Te Ver Viva!’, de 1989), dessa vez a diretora oferece um olhar diferenciado sobre os algozes, no filme de ficção ‘O Mensageiro’, que chega essa semana aos cinemas brasileiros.

o mensageiro



Vera (Valentina Herszage, do inédito ‘As Polacas’) é uma jovem que acaba de ser presa pelos militares, trancafiada em uma cela minúscula em algum quartel em algum lugar do Brasil. Ela passa os dias sendo machucada e ignorada pelos militares. Em paralelo, sua mãe, Maria (Georgette Fadel) não mede esforços e visita cada estabelecimento dos militares em busca de notícias de sua filha, enquanto Henrique (Floriano Peixoto), o pai da jovem, tenta seguir sua vida normalmente. Isolada de tudo e de todos, aos poucos Vera conquista a simpatia de Armando (Shi Menegat), um soldado inocente que começa a desconfiar das ordens que recebe de seus superiores. Nesse ambiente hostil, uma inesperada relação de pseudo-amizade surge entre eles.

Grandíssimo vencedor do Festival Internacional de Cinema de Paraty (tendo levado oito prêmios para casa, incluindo Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Direção e Melhor Roteiro), ‘O Mensageiro’ é um filme que, curiosamente, aposta no diálogo como principal ferramenta para construir um enredo de época que parte de elementos reais que se fundem dentro da ficção proposta pelo filme.

o mensageiro (1)

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Escrito pela própria diretora Lúcia Murat com Tunico Amâncio, o roteiro surpreende em focar o protagonismo da trama no soldado, e não na jovem estudante. Se de certa forma isso traz certa novidade às abordagens sobre o período da ditadura militar, por outro causa estranhamento, afinal, mesmo não intencionalmente, ao construir um soldado inocente e crédulo que é inserido num sistema cruel ao qual não escolheu e no qual é apenas uma peça, o filme faz uma escolha ousada e humaniza o algoz, oferecendo um olhar mais suavizado sobre essas figuras que causaram tanta dor à tantas famílias. Talvez o público não receba muito bem essa mudança de olhar.

Escolhas à parte, ‘O Mensageiro’ é um filme bem-produzido, especialmente no quesito de reprodução de arte para reconstruir uma época, com dedicação ao figurino, à estética e aos objetos de cena. Desse conjunto, destaca-se a atuação de Shi Menegat, com muitos closes que favorecem a construção da empatia no espectador a esse jovem soldado que, de tão ingênuo, parece perdido naquele ambiente duro e violento da ditadura. Destaca-se, também, a aparição da própria diretora ao final do longa, em uma cena como professora de história, em que conversa indiretamente com o público abrindo o caminho para o debate – e o diálogo – entre agredidos e agressores.

Corajoso e diferente, ‘O Mensageiro’ é um filme de drama que flerta com o documental, propondo um diálogo improvável dentro de um dos períodos mais doloridos da história contemporânea do Brasil.

o mensageiro filme b 2

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Janda Montenegrohttp://cinepop.com.br
Escritora, autora de 6 livros, roteirista, assistente de direção. Doutora em Literatura Brasileira Indígena UFRJ.

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Lúcia Murat é uma diretora e roteirista que, em sua trajetória no cinema, quase sempre abordou o tempo da ditadura militar brasileira como cenário de boa parte de seus filmes. Tendo a própria diretora sido presa pelos militares na época, aos poucos, em seus filmes, a diretora vai tecendo episódios e temáticas que costuram uma cortina que busca trazer um panorama para o espectador do que teria sido a vivência de alguém naquela época, fosse de que lado fosse. Se em boa parte dos filmes o olhar sempre foi sobre o cidadão comum que sofre nas mãos dos militares (como abordado no documentário ‘Que Bom Te Ver Viva!’, de 1989), dessa vez a diretora oferece um olhar diferenciado sobre os algozes, no filme de ficção ‘O Mensageiro’, que chega essa semana aos cinemas brasileiros.

o mensageiro

Vera (Valentina Herszage, do inédito ‘As Polacas’) é uma jovem que acaba de ser presa pelos militares, trancafiada em uma cela minúscula em algum quartel em algum lugar do Brasil. Ela passa os dias sendo machucada e ignorada pelos militares. Em paralelo, sua mãe, Maria (Georgette Fadel) não mede esforços e visita cada estabelecimento dos militares em busca de notícias de sua filha, enquanto Henrique (Floriano Peixoto), o pai da jovem, tenta seguir sua vida normalmente. Isolada de tudo e de todos, aos poucos Vera conquista a simpatia de Armando (Shi Menegat), um soldado inocente que começa a desconfiar das ordens que recebe de seus superiores. Nesse ambiente hostil, uma inesperada relação de pseudo-amizade surge entre eles.

Grandíssimo vencedor do Festival Internacional de Cinema de Paraty (tendo levado oito prêmios para casa, incluindo Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Direção e Melhor Roteiro), ‘O Mensageiro’ é um filme que, curiosamente, aposta no diálogo como principal ferramenta para construir um enredo de época que parte de elementos reais que se fundem dentro da ficção proposta pelo filme.

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Escrito pela própria diretora Lúcia Murat com Tunico Amâncio, o roteiro surpreende em focar o protagonismo da trama no soldado, e não na jovem estudante. Se de certa forma isso traz certa novidade às abordagens sobre o período da ditadura militar, por outro causa estranhamento, afinal, mesmo não intencionalmente, ao construir um soldado inocente e crédulo que é inserido num sistema cruel ao qual não escolheu e no qual é apenas uma peça, o filme faz uma escolha ousada e humaniza o algoz, oferecendo um olhar mais suavizado sobre essas figuras que causaram tanta dor à tantas famílias. Talvez o público não receba muito bem essa mudança de olhar.

Escolhas à parte, ‘O Mensageiro’ é um filme bem-produzido, especialmente no quesito de reprodução de arte para reconstruir uma época, com dedicação ao figurino, à estética e aos objetos de cena. Desse conjunto, destaca-se a atuação de Shi Menegat, com muitos closes que favorecem a construção da empatia no espectador a esse jovem soldado que, de tão ingênuo, parece perdido naquele ambiente duro e violento da ditadura. Destaca-se, também, a aparição da própria diretora ao final do longa, em uma cena como professora de história, em que conversa indiretamente com o público abrindo o caminho para o debate – e o diálogo – entre agredidos e agressores.

Corajoso e diferente, ‘O Mensageiro’ é um filme de drama que flerta com o documental, propondo um diálogo improvável dentro de um dos períodos mais doloridos da história contemporânea do Brasil.

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