Apontando o dedo para o alto da pirâmide da criminalidade, o novo trabalho do cineasta Fernando Coimbra – também diretor do excelente O Lobo Atrás da Porta – é um ousado passeio por ações violentas, tramoias sangrentas, tendo no centro das atenções um casal inescrupuloso que entra numa espiral de ascensão e queda na organização criminosa familiar que fazem parte. Selecionado para o Festival do Rio 2024, o projeto tem uma narrativa pulsante, encostando no tragicômico e mantendo-se firme no discurso que logo se mostra uma contundente crítica social com mais que respingos na atualidade.
Na trama, ambientada no Rio de Janeiro atual dominado pelo poder de criminosos, conhecemos Regina (Leandra Leal) e Valério (Irandhir Santos), um casal, parceiros de planos, que vivem abraçados a uma família de crime, ligada ao jogo do bicho e lavagem de dinheiro. Quando resolvem dar um passo nessa hierarquia, cruzando uma série de limites, planejam o que acham ser um plano perfeito. Só que uma série de consequências desse ato tomam conta dos próximos passos desse recorte rumo ao caos.
Coimbra não alivia ao mostrar os detalhes dessa caminhada rumo à ruína, se joga numa reta de ousadia quebrando os paradigmas familiares, adicionando a crítica social focada no poder corrupto, usando o chocar para criar a tensão e reflexão. Um dos elementos importantes, é a composição e desenvolvimento dos personagens, que encontram suas camadas em um tour pelo psicológico dominados pela inconsequência, envoltos num estado de alerta constante chegando até a validação da iminência onde a ciranda do poder pode girar a qualquer momento.
Para validar o forte impacto das cenas, uma direção de arte impecável se torna quase um personagem, um espelho complementar do que vivem e sentem os personagens – brilhantemente interpretados por Irandhir Santos e Leandra Leal. Sem alívio para as ações inescrupulosas e batendo forte na tecla de uma elite corrupta que se acha intocável, toda essa atmosfera criada deixa o público atento e surpreso ao longo das duas horas de projeção.
Exibido pela primeira vez no Festival de Cinema de Toronto, Os Enforcados tem como carta na manga a imprevisibilidade, algo que soma demais à narrativa, se consolidando através do caos de ações desenfreadas e do minucioso olhar para quem comanda o crime como um forte retrato de nossa sociedade. Saímos da sessão com uma certeza: os vivos assustam muito mais que os mortos!