Fazer comédia é uma arte que dá trabalho e talvez seja uma das mais difíceis de desenvolver, justamente pela importância de equilíbrio na tonalidade do humor. Em tempos em que fazer certas “gracinhas” já não mais são aceitáveis, acertar o timing, o gatilho cômico e a acidez de uma boa ironia é como desempenhar um extenso, intenso e delicado trabalho manual. E os dissabores do “fazer comédia” ganham caricaturas diversas na nova produção nacional intitulada Os Espetaculares, que tem seus tropeços, mas sabe entregar um humor que é mais simbólico do que inicialmente se esperaria.
Adotar a profissão de comediante é saber viver em uma espiral constante. Sem instabilidade e com muitos tropeços no início (ou meio) da jornada, essa é uma área para a qual se nasce. Tem que ser natural e instintivo. Humor forjado não funciona e não sustenta a carreira de ninguém. E indireta e diretamente, Os Espetaculares assume essa prazerosa característica metalinguística para fazer uma espécie de ode à comédia. Feito e estrelado por quem ama essa linda arte de fazer rir, a produção dirigida por André Pellenz (Minha Mãe é uma Peça) e estrelada por Rafael Portugal, Luísa Perissé e Paulo Mathias Jr., nos leva para os bastidores da vida nada glamurosa de quem insiste nessa desafiante jornada.
Explorando o desenvolvimento de seus personagens a partir do amor pela comédia, o longa original precisa ser percebido como muito mais do que uma sucessão de atos cômicos ou mirabolantes. A produção merece ser vista como uma aventura de autodescobertas de três comediantes que, inicialmente, jamais formariam uma equipe, mas que a cada camada particular revelada, mais eles caminham uns em direção aos outros. Contando pequenas histórias paralelas a partir da conexão do humor, Os Espetaculares se torna uma produção deliciosa de assistir por justamente conseguir muito além dos alívios cômicos.
Cheia de coração, a comédia ainda é uma reflexão que – ainda que seja curta e simplista, consegue permear assuntos valiosos como referências familiares, responsabilidade parental e identidade. Embora nem todas as piadas funcionem e algumas sejam exageradamente apelativas, Os Espetaculares caminha bem em seu ritmo, explora toda a nossa brasilidade em pequenos prazeres como uma coxinha gigante e conquista a empatia do seu público de forma progressiva.
Leve e dinâmico, a produção consegue gerar um nível de identificação com a audiência e sabe usar o seu tempo de tela de tal forma a passar diante dos olhos com avidez e agilidade. Divertido e adorável, Os Espetaculares ainda entrega um final todo delicado e especial, que salienta o quanto uma boa comédia feita de coração é capaz de impactar também uma futura geração de comediantes.