sexta-feira , 22 novembro , 2024

Crítica | Premissa interessante não é o suficiente para transformar ‘Escolha ou Morra’ em um filme assistível

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Nos últimos anos, os grandes estúdios parecem ter mergulhado de cabeça nas décadas finais do século passado para resgatar uma nostalgia há muito perdida na indústria audiovisual, talvez como forma de criar uma tendência nos dias de hoje, talvez para apresentar às novas gerações uma estética que não é mais relembrada. Como exemplo, tivemos a recente aventura futurista ‘Jogador Nº 1’, de Steven Spielberg, que construiu um aglomerado de referências à cultura pop, ou a ação retrô ‘Coquetel Explosivo’, que trouxe Karen Gillan, Lena Headey em um frenesi de lutas bastante divertido, apesar de pecar no roteiro. Agora, chegou a vez da Netflix em investir esforços em uma produção de terror intitulada Escolha ou Morra, que, como vários títulos da plataforma, se finca com tanta força nos convencionalismos que chega ser difícil a encontrar alguma coisa aproveitável.

Para ser justo, a premissa e a primeira metade do longa-metragem parte de um lugar familiar o suficiente para comprarmos a história e observar o que vai acontecer. O enredo é centrado Kayla (Iola Evans), uma jovem garota que tem muita habilidade com tecnologia e que abandonou a faculdade por uma série de razões familiares e pessoais. Agora, ela trabalha fazendo bicos como limpadora de janelas e, eventualmente, cruza caminho com um antigo jogo dos anos 1980 chamado‘CURS>R – encontrando a oportunidade para ganhar uma grana sólida e salvar ela e a mãe de serem despejadas. Mas, como podemos imaginar, as coisas não saem como o planejado e o jogo, na verdade, é um receptáculo de algo maligno que controla a realidade que conhece e a leva a tomar decisões trágicas para chegar ao final viva.



Se você achou a história similar a outras produções, não se assuste: afinal, parece que estamos lidando com uma mistura desnivelada de ‘Jogos Mortais’ e ‘Amizade Desfeita’ cuja única originalidade é se respaldar nas criações de entretenimento das décadas passadas – em uma nostalgia arquitetônica metadiegética que é marcada nas escolhas imagéticas e na condução do diretor Toby Meakins, por exemplo. Entretanto, as esparsas boas intenções de nada valem quando confrontadas com um roteiro péssimo que não faz jus a absolutamente nenhuma das tramas transpostas à tela; como se não bastasse, a personagem principal e a atuação de Evans soam desconexas, desencontrando-se em um ponto comum às duas e criando duas camadas diferentes entre si e que, no final das contas, não fazem sentido.

Kayla sofre por não saber o que fazer com a vida; porém, ela também enfrenta dilemas em casa, com a recente morte do irmão mais novo e a crescente dependência que a mãe nutre por drogas, bem como o abuso sexual e físico que sofre do cobrador do centro habitacional em que vivem. Como se isso já não fosse drástico demais, ela se vê refletindo sobre as escolhas que tomou (como sair da faculdade) e só encontra conforto na amizade que tem com Isaac (Asa Butterfield, cujo talento é desperdiçado nessa bagunça fílmica), um programador apaixonado por videogames.

A ideia de Meakins e do roteiro assinado por Simon Allen é seguir a tendência reflexiva de tantos outros títulos similares que saíram nos últimos anos – ou seja, apresentar certas críticas sociais metaforizadas por diálogos com o terror e o sobrenatural. O game obriga os jogadores a fazer escolhas impossíveis que lidam com os valores de cada um dos personagens – ou, nesse caso, apenas de Kayla -, como a sequência em que enfrenta o fantasma de seu falecido irmão e deve escolher em salvar ele ou Isaac. Todavia, se mensagens secundárias se escondiam por trás de uma fachada superexposta, definitivamente não apareceram como deveria e apenas deram margem para fracas pulsões metafísicas sobre a ambição humana. E as explicações superficiais fornecidas por Allen não nos ajudam a criar qualquer laço com a narrativa, o que culmina em personagens descartáveis e motivações impalpáveis.

Várias ocasiões são esquecidas em prol de um horror e de um gore que não funcionam: a morte de Isaac é risível e, combinada com a reação exagerada de Kayla, arremessam a dramaticidade para fora do longa e deixam um gostinho agridoce de vergonha alheia; a família que aparece no começo da história e que retorna para um medíocre final poderia ser mais bem aproveitada (ainda mais por representar a última fase do jogo), mas é movida por diálogos sem sentido e uma conclusão inexplicável dentro da debilitada mitologia criada. Tudo bem, há algumas cenas que realmente são bem coreografadas, como a do restaurante e a do ataque dos ratos – entretanto, não tão assim para ofuscarem os constantes deslizes.

Escolha ou Morra tinha todos os elementos para, ao menos, ser uma diversão barata para o fim de semana. O resultado rema contra a maré e entra para a interminável lista de títulos esquecíveis da Netflix, tangenciando uma espécie de pedantismo filosófico que não deveria nem ao menos existir e emulando tantas obras melhores que parece que estamos assistindo a um filme de baixo orçamento rodado como uma sátira indecifrável.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Para ser justo, a premissa e a primeira metade do longa-metragem parte de um lugar familiar o suficiente para comprarmos a história e observar o que vai acontecer. O enredo é centrado Kayla (Iola Evans), uma jovem garota que tem muita habilidade com tecnologia e que abandonou a faculdade por uma série de razões familiares e pessoais. Agora, ela trabalha fazendo bicos como limpadora de janelas e, eventualmente, cruza caminho com um antigo jogo dos anos 1980 chamado‘CURS>R – encontrando a oportunidade para ganhar uma grana sólida e salvar ela e a mãe de serem despejadas. Mas, como podemos imaginar, as coisas não saem como o planejado e o jogo, na verdade, é um receptáculo de algo maligno que controla a realidade que conhece e a leva a tomar decisões trágicas para chegar ao final viva.

Se você achou a história similar a outras produções, não se assuste: afinal, parece que estamos lidando com uma mistura desnivelada de ‘Jogos Mortais’ e ‘Amizade Desfeita’ cuja única originalidade é se respaldar nas criações de entretenimento das décadas passadas – em uma nostalgia arquitetônica metadiegética que é marcada nas escolhas imagéticas e na condução do diretor Toby Meakins, por exemplo. Entretanto, as esparsas boas intenções de nada valem quando confrontadas com um roteiro péssimo que não faz jus a absolutamente nenhuma das tramas transpostas à tela; como se não bastasse, a personagem principal e a atuação de Evans soam desconexas, desencontrando-se em um ponto comum às duas e criando duas camadas diferentes entre si e que, no final das contas, não fazem sentido.

Kayla sofre por não saber o que fazer com a vida; porém, ela também enfrenta dilemas em casa, com a recente morte do irmão mais novo e a crescente dependência que a mãe nutre por drogas, bem como o abuso sexual e físico que sofre do cobrador do centro habitacional em que vivem. Como se isso já não fosse drástico demais, ela se vê refletindo sobre as escolhas que tomou (como sair da faculdade) e só encontra conforto na amizade que tem com Isaac (Asa Butterfield, cujo talento é desperdiçado nessa bagunça fílmica), um programador apaixonado por videogames.

A ideia de Meakins e do roteiro assinado por Simon Allen é seguir a tendência reflexiva de tantos outros títulos similares que saíram nos últimos anos – ou seja, apresentar certas críticas sociais metaforizadas por diálogos com o terror e o sobrenatural. O game obriga os jogadores a fazer escolhas impossíveis que lidam com os valores de cada um dos personagens – ou, nesse caso, apenas de Kayla -, como a sequência em que enfrenta o fantasma de seu falecido irmão e deve escolher em salvar ele ou Isaac. Todavia, se mensagens secundárias se escondiam por trás de uma fachada superexposta, definitivamente não apareceram como deveria e apenas deram margem para fracas pulsões metafísicas sobre a ambição humana. E as explicações superficiais fornecidas por Allen não nos ajudam a criar qualquer laço com a narrativa, o que culmina em personagens descartáveis e motivações impalpáveis.

Várias ocasiões são esquecidas em prol de um horror e de um gore que não funcionam: a morte de Isaac é risível e, combinada com a reação exagerada de Kayla, arremessam a dramaticidade para fora do longa e deixam um gostinho agridoce de vergonha alheia; a família que aparece no começo da história e que retorna para um medíocre final poderia ser mais bem aproveitada (ainda mais por representar a última fase do jogo), mas é movida por diálogos sem sentido e uma conclusão inexplicável dentro da debilitada mitologia criada. Tudo bem, há algumas cenas que realmente são bem coreografadas, como a do restaurante e a do ataque dos ratos – entretanto, não tão assim para ofuscarem os constantes deslizes.

Escolha ou Morra tinha todos os elementos para, ao menos, ser uma diversão barata para o fim de semana. O resultado rema contra a maré e entra para a interminável lista de títulos esquecíveis da Netflix, tangenciando uma espécie de pedantismo filosófico que não deveria nem ao menos existir e emulando tantas obras melhores que parece que estamos assistindo a um filme de baixo orçamento rodado como uma sátira indecifrável.

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