terça-feira , 5 novembro , 2024

Crítica | Puro-Sangue – Suspense psicológico é o último filme de Anton Yelchin

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Duas das mais jovens e talentosas atrizes do cinema independente norte-americano se encontram em Puro-Sangue (Thoroughbreds), um drama meio suspense, meio psicótico, lançado diretamente em vídeo no Brasil. Dirigido e roteirizado pelo estreante Cory Finley, a obra possui uma ambientação intimista e um tempo de cena desacelerado, isto é, a câmera está sempre focada nas expressões e olhares de Olivia Cooke (Jogador Nº1) e Anya Taylor-Joy (Fragmentado).

Assim como o título, todo o filme faz uma analogia aos cavalos e a maneira de domá-los e abatê-los, isso porque ambas as meninas têm uma ligação com hipismo e a cena de abertura é exatamente Amanda (Olivia Cooke) encarando o animal e, em seguida, ela bate à porta da enorme casa de Lily (Anya Taylor-Joy). As duas costumavam ser amigas de infância, mas cresceram separadas. O reencontro ocorre plasticamente com um acordo de Lily ajudar Amanda nas aplicações para universidades.

A partir destes encontros, as meninas discutem sobre o estado mental de Amanda e os sentimentos de Lily. Assim, elas acabam por encontrar pontos em comum, como egocentrismo e antissociabilidade. De forma sempre distante, Amanda revela não sentir nada, nem dor, nem alegria, enquanto Lily sente-se aprisionada pelo padrasto Mark (Paul Sparks), o qual a jovem nutre uma aversão desmedida. Em uma cena simbólica, elas ensaiam o reinício de uma amizade em um abraço seco e desencontrado.

Como consequência desta reaproximação, Amanda e Lily começam a passar mais tempo juntas e as ideias de Amanda a levam insinuar que a morte de Mark poderia ser um alívio para Lily. Concentrada em suas próprias vontades e anseios, Lily acredita que a solução proposta é viável e elas começam a planejar como cometer o crime sem serem suspeitas. Em momentos, há um vislumbre do drama Almas Gêmeas (1994), de Peter Jackson, no qual a figura de autoridade representa uma ameaça a ser eliminada, no entanto, aqui de forma desapaixonada.

Em sua última aparição no cinema, Anton Yelchin – na pele de Tim –  serve de bode expiatório na história. Após cumprir uma pena, o desajustado rapaz é socialmente rejeitado nos subúrbios de Connecticut e, por isso, as jovens tentam chantageá-lo para resolver o problema delas. Apesar do pequeno papel, é possível apreciar o trabalho do jovem ator pouco antes do seu trágico falecimento em junho de 2016.

Como todo bom filme independente, a construção da trama e as atuações são os pontes fortes, com uma sofisticação de enquadramentos. Um dos personagens do filme é o ruído da máquina/ esteira/ aparelho de ginástica do padrasto que ecoa pela casa, trazendo um tom de desagrado somente pela sua presença em cena. O filme é todo sob a perspectiva das meninas, ou seja, as sensações comunicadas são as delas.

Por outro lado, a atenção do entorno de ambas mostra o quão doentias as adolescentes são e como os seus olhares são deturpados. Afinal, as adolescentes são ricas e mimadas, e suas desconexões com o mundo é fruto da falta de empatia pelos outros. Nesta linha, Puro-Sangue é um dos mais arrebatadores filmes de adolescência, em que a pulsão de morte e descontrole ecoa mais alto que a racionalidade. A cena ápice do filme, nos 10 minutos finais, é de um estarrecimento e, contraditoriamente, de um sutileza marcante também.

Para os apreciadores de pequenas obras de artes, o trabalho de estreia de Corey Finley merece ser prestigiado, assim como o trabalho dos jovens atores. Puro-sangue é um grito de desespero de uma geração letárgica perdida dentro do próprio umbigo e anestesiada por sintéticos. Apesar do filme não deixar nenhuma dessas ideias em evidência, ele constrói uma metáfora sobre as possibilidades de controle de um animal selvagem.

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Letícia Alassë
Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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Assim como o título, todo o filme faz uma analogia aos cavalos e a maneira de domá-los e abatê-los, isso porque ambas as meninas têm uma ligação com hipismo e a cena de abertura é exatamente Amanda (Olivia Cooke) encarando o animal e, em seguida, ela bate à porta da enorme casa de Lily (Anya Taylor-Joy). As duas costumavam ser amigas de infância, mas cresceram separadas. O reencontro ocorre plasticamente com um acordo de Lily ajudar Amanda nas aplicações para universidades.

A partir destes encontros, as meninas discutem sobre o estado mental de Amanda e os sentimentos de Lily. Assim, elas acabam por encontrar pontos em comum, como egocentrismo e antissociabilidade. De forma sempre distante, Amanda revela não sentir nada, nem dor, nem alegria, enquanto Lily sente-se aprisionada pelo padrasto Mark (Paul Sparks), o qual a jovem nutre uma aversão desmedida. Em uma cena simbólica, elas ensaiam o reinício de uma amizade em um abraço seco e desencontrado.

Como consequência desta reaproximação, Amanda e Lily começam a passar mais tempo juntas e as ideias de Amanda a levam insinuar que a morte de Mark poderia ser um alívio para Lily. Concentrada em suas próprias vontades e anseios, Lily acredita que a solução proposta é viável e elas começam a planejar como cometer o crime sem serem suspeitas. Em momentos, há um vislumbre do drama Almas Gêmeas (1994), de Peter Jackson, no qual a figura de autoridade representa uma ameaça a ser eliminada, no entanto, aqui de forma desapaixonada.

Em sua última aparição no cinema, Anton Yelchin – na pele de Tim –  serve de bode expiatório na história. Após cumprir uma pena, o desajustado rapaz é socialmente rejeitado nos subúrbios de Connecticut e, por isso, as jovens tentam chantageá-lo para resolver o problema delas. Apesar do pequeno papel, é possível apreciar o trabalho do jovem ator pouco antes do seu trágico falecimento em junho de 2016.

Como todo bom filme independente, a construção da trama e as atuações são os pontes fortes, com uma sofisticação de enquadramentos. Um dos personagens do filme é o ruído da máquina/ esteira/ aparelho de ginástica do padrasto que ecoa pela casa, trazendo um tom de desagrado somente pela sua presença em cena. O filme é todo sob a perspectiva das meninas, ou seja, as sensações comunicadas são as delas.

Por outro lado, a atenção do entorno de ambas mostra o quão doentias as adolescentes são e como os seus olhares são deturpados. Afinal, as adolescentes são ricas e mimadas, e suas desconexões com o mundo é fruto da falta de empatia pelos outros. Nesta linha, Puro-Sangue é um dos mais arrebatadores filmes de adolescência, em que a pulsão de morte e descontrole ecoa mais alto que a racionalidade. A cena ápice do filme, nos 10 minutos finais, é de um estarrecimento e, contraditoriamente, de um sutileza marcante também.

Para os apreciadores de pequenas obras de artes, o trabalho de estreia de Corey Finley merece ser prestigiado, assim como o trabalho dos jovens atores. Puro-sangue é um grito de desespero de uma geração letárgica perdida dentro do próprio umbigo e anestesiada por sintéticos. Apesar do filme não deixar nenhuma dessas ideias em evidência, ele constrói uma metáfora sobre as possibilidades de controle de um animal selvagem.

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Crítica de Cinema desde 2012, jornalista e pesquisadora sobre comunicação, cultura e psicanálise. Mestre em Cultura e Comunicação pela Universidade Paris VIII, na França e membro da Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine). Nascida no Rio de Janeiro e apaixonada por explorar o mundo tanto geograficamente quanto diante da tela.

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