Você provavelmente já viu o clipe da música ‘Vogue’, da Madonna, em que diversas pessoas dançam com o corpo todo, jogando os braços para frente e para trás em movimentos quase de alongamento. E muitos de nós já até dançou imitando esses movimentos porque o impacto do clipe da rainha do pop foi e é imenso na indústria do pop e do entretenimento. Porém, ao contrário do que muita gente pensa, Madonna não inventou o estilo vogue, e nem toda aquela performance do clipe; na verdade, ela bebeu na fonte de um movimento chamado Ballroom, que ocupa espaços em muitas cidades no mundo todo, inclusive no Brasil. E a partir do próximo dia 5 de dezembro os espectadores poderão conhecer um pouquinho de como é esse cenário no Rio de Janeiro, através do ótimo documentário ‘Salão de Baile’, que teve exibições prévias no Festival do Rio e na Mostra de Cinema de São Paulo.
Às margens da icônica Baía de Guanabara, grupos e coletivos LGBTQIAPN+ se reúnem para exercitar seus potenciais artísticos, competindo entre si em diversas modalidades ao longo dessa celebração. E, enquanto performam, cada competidor(a/e) vai se relacionando com o próprio movimento do Ballroom, identificando-se em uma ou mais formas de expressão, ao mesmo tempo em que são avaliados (as/es) por um júri especializado composto por convidados (as/es). Em paralelo, cada um dos personagens divide com a câmera elementos de suas origens, de suas batalhas pessoais, de suas lutas diárias e, claro, também das rivalidades que ocorrem no cenário.
Ao contrário do que qualquer sinopse possa tentar antecipar, verdadeiramente o maior trunfo de ‘Salão de Baile’ é a vitalidade que os/es diretores conseguem capturar em suas câmeras. Tudo é muito vívido, cheio de energia, pulsante, energizante. E esse turbilhão de sensações é totalmente envolvente, como se pegasse na mão do espectador sentado e o puxasse para o meio da pista.
Outro grande mérito do documentário é ter entendido que para atingir o grande público é preciso ter paciência e ser didático. Assim, ao longo de todos os depoimentos de ‘Salão de Baile’ os/es diretores Juru e Vitã, que também são roteiristas, fazem a gentileza de montar um glossário para o público leigo, de modo que todos os termos referentes à cena, às performances, à cultura sempre aparecem na tela com uma explicação, um significado. Nesse sentido, o longa presta um grandíssimo serviço à sociedade, que precisa, quer e urge em ser educada sobre a cultura de pessoas LGBTQIAPN+.
A seleção das personagens é feita com delicadeza, de modo a contemplar pessoas que se identificam com diferentes modalidades de expressão corporal. Personagens estas que fazem parte de Casas e Houses, como são chamados os coletivos. Dentre as quais estão a House of Alafia, House of Blyndex, House of Bushidö, House of Cabal, The Royal Pioneer Kiki House of Cazul, Casa de Cosmos, Casa de Dandara, Casa dy Fokatruá, House of Império, Casa de Laffond, House of Mamba Negra, House of Raabe, e pessoas 007 (como são chamadas as pessoas que não fazem parte de nenhuma casa).
Temos vitalidade. Temos depoimentos emocionantes e hilários. Temos glossário para leigos. E ‘Salão de Baile’ ainda faz um belíssimo trabalho trazendo contexto histórico, ilustrando todo um panorama desde o primeiro baile (organizado pela queen insurgente Crystal LaBeija, que começa a criar os bailes para queens não brancas) e trazendo todo esse background para a cena carioca – representada pelos bailes de São Gonçalo, Niterói e Rio de Janeiro.
‘Salão de Baile’ é uma verdadeira aula, e das boas! Ensina, diverte, entretém, emociona e mostra todas as cores e histórias da monarquia das queens fluminenses. Dá vontade de ver mais!