O estado alarmante de vigilância permanente que o terrorismo proporcionou no mundo, desde os atentados de 11 de setembro, já se tornou tão parte fundamental da indústria do entretenimento como a Guerra Fria assim o fez no cinema dos anos 70 e 80. E como um reflexo natural da realidade, o universo hollywoodiano não poupou os roteiristas, usou e reutilizou a temática, esgotou as abordagens e entregou produções que vão desde novos clássicos como A Hora Mais Escura, passando pelos filmes pipocas que recriam alguns casos, como As Torres Gêmeas, O Dia do Atentado e Voo United 93. E em 2018, o assunto que – independente da opinião alheia – continuará estampando as manchetes de jornais, ganha uma nova abordagem, em uma trama em que um guarda-costas se torna o peão de uma conspiração política tão real quanto se poderia imaginar. O tema pode até ser o mesmo, mas a série original da Netflix, Segurança em Jogo, é tudo menos previsível.
Criada e roteirizada por Jed Mercurio, a produção da BBC conquistou o público britânico e irlandês por seu ritmo acelerado, em uma trama onde política nacional e externa colidem entre si, à medida que antagonicamente caminham em direções opostas. Em uma rede intrínseca onde conluios são práticas tão naturais quanto o chá das 17h, Segurança em Jogo constrói uma tensão enérgica em torno de seu personagem principal, o sargento David Budd, vivido por Richard Madden (sim, o Rob Stark de Game of Thrones).
Com Transtorno Pós-Traumático, fruto de seu período como combatente no Afeganistão, ele é apresentando como uma figura chave que parece estar à frente nesta grande partida de xadrez. Mas assim como as audiências são ludibriadas com arcos e personagens de motivações dúbias, a trama se apropria da mesma fragilidade de seu protagonista, em um roteiro que promove questionamentos tanto dentro como fora das telas, evidenciando o quão complexo é o esquema de tráfico de informações e disputa por território e poder quando se trata do futuro de uma nação.
Se esquivando de nacionalismos enfadonhos e cansativos, a série é perfeita para os amantes da boa ação. Como um thriller que mescla o suspense e o gênero em questão, ela conta com episódios intensos, cujos momentos de sobriedade e calmaria nada mais são que arquiteturas da dramaticidade e da construção da celeridade dos fatos. Com um roteiro bem ajustado que evita andar em círculos ou produzir a falsa sensação de tensão, Segurança em Jogo é prática ao mostrar a que veio, sabe utilizar a ação como fundamento de uma trama inteligente e faz dessa mesma narrativa uma história madura que vai muito além da comercialização do petróleo ou brigas de ego entre regentes de Estado.
Transformando alguns personagens em bodes expiatórios e acrescentando um toque de sensualidade aos protagonistas principais, papéis se confundem, casos amorosos se transformam em fragmentos de obras de Sidney Sheldon e o inesperado acontece, em plot twists bem arquitetados e consumados. Com grande investimento na produção, que se revela em boas explosões (salvo uma exceção) e cenas de perseguição que percorrem os pontos turísticos mais famosos de Londres, a série conquistou – por meio de um acordo feito com a Netflix – a chance de cativar novos públicos, ultrapassando seu efêmero alcance para mais de 190 países. E talvez seja essa a tacada certeira que faltava para transformar Segurança em Jogo na sua próxima série favorita e, porque não, em uma tendência generalizada.
Com apenas seis episódios dinâmicos e um final que une as pontas soltas, apara as arestas e concede ares de encerramento permanente, Segurança em Jogo é aquela série que tem um potencial colossal para seguir em frente e manter seu novo e fiel público. Mas superar as expectativas da impecável primeira temporada pode ser também um desafio tão árduo quanto desarmar um colete recheado de explosivos. Mas quem sabe não valha a pena correr esse risco, certo?