quinta-feira, abril 25, 2024

Crítica| Sem Rastros – Um Capitão Fantástico mais cru e melancólico

Depois do movimento ‘Me Too’ e da indicação de Greta Gerwig por Lady Bird no Oscar 2018, filmes mais sérios dirigidos por mulheres passaram a ficar no radar das premiações – afinal, depois das críticas feitas a Hollywood, todo mundo espera ao menos uma indicação feminina na categoria. Neste ano, após aparecer no Spirit Awards – considerado o Oscar do cinema independente – , parte da crítica aposta em Debra Granik, que também dirigiu Inverno da Alma, o responsável por colocar Jennifer Lawrence nos holofotes da mídia em 2011.

Desta vez, o filme que leva sua assinatura é Sem Rastros (Leave No Trace) – que, assim como Capitão Fantástico (2016) também questiona como seria a vida fora do sistema capitalista e das tecnologias que quase ninguém consegue viver sem. Mas, diferentemente do primeiro longa, a produção de Granik tem um ritmo mais lento, menos personagens e apresenta essa dicotomia de um modo mais intimista, realista e cru. O foco aqui não é mostrar qual meio de vida funciona melhor – nem chocar com as habilidades da menina que teve uma educação fora de colégios – e sim revelar como ele afeta de diferentes maneiras seus protagonistas: Will (Ben Foster) e sua filha Tom (Thomasin McKenzie).

Sem explicar como e o porquê, a história já começa mostrando os dois em uma vasta reserva na fronteira de Portland, Estados Unidos. Lá, usufruindo do que a natureza dá, eles seguem suas vidas apenas com o que precisam – e o pai, inclusive, repete essa filosofia diversas vezes para a filha ao longo do filme (“Fique apenas com o que precisa” ou “Sim, isso parece justo“). No entanto, ainda que siga as ideias de seu progenitor, desde o início fica claro que Tom tem vontade de conhecer a chamada “civilização” e ter acesso às tecnologias que não fazem parte do universo que criou com Will.

Por isso, quando eles são retirados do acampamento em que vivem e colocados em uma casa pelo serviço social, a adolescente parece encontrar um novo mundo. Seus olhos brilham ao ter acesso a uma cama de verdade e por estar perto da tecnologia – como se, finalmente, estivesse livre -, enquanto seu pai se sente em uma verdadeira prisão longe da reserva. “Ainda poderemos ter nossas opiniões”, ele diz em vários momentos. Mas os muros de concreto e as obrigações sociais parecem sufocá-lo, ao mesmo tempo que a filha finalmente parece ter encontrado seu lugar no mundo.

E ao longo de tudo isso, Ben Foster e Thomasin McKenzie compartilham uma química incrível em cena. Só com o olhar, transmitem muito bem o estado de espírito dos dois personagens quando aparecem onde realmente querem estar. McKenzie mostra que tem um futuro promissor pela frente e que, em uma premiação não muito distante, talvez possa ser mais um nome a ser lançado em uma produção de Granik, como Jennifer Lawrence foi. Já Foster, conhecido por trabalhos como Os Indomáveis (2007) e A Qualquer Custo (2016), também entrega uma atuação consistente como um “Capitão Fantástico” menos utópico, e emociona, principalmente, na reta final (você vai saber qual é a cena quando estiver assistindo).

Para alguns, Leave No Trace pode carecer de um maior aprofundamento dos personagens para que o envolvimento com a história seja maior. No entanto, olhos mais atentos irão perceber que a mise-en-scène da cineasta e o olhar dos atores é suficiente para passar o que eles estão sentindo no momento, sem a necessidade de didatismo. Para uma maior discussão sobre esses dois mundos que dividem pai e filha – metaforicamente e em uma das cenas mais tocantes do longa -, basta ver como o “mundo real” parece assustador para quem quer fugir das marcas deixadas por ele e como é uma jornada de descoberta para quem está só começando – como a vida fora da ficção. Assim, muito mais que uma discussão política, de ideologia e do relacionamento entre pai e filha, Sem Rastros vai além e traz uma tocante trajetória de desencontro entre gerações. Atual e necessário.

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