quarta-feira , 20 novembro , 2024

Crítica | ‘Sete Verbos para Manter Corpo Viva’ explora as angústias da própria existência

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Nascer é o primeiro trauma da vida do ser humano – mas o próprio viver estende-se como um contínuo vórtice de atribulações e problemas. E é sobre isso que a peça Sete Verbos para Manter Corpo Viva, apresentação que está em cartaz no Instituto de Artes da UNESP, discorre.

Com direção de Fab Trindad e Marcella Vicentini e com roteiro realizado em conjunto com nada menos que 39 pessoas (que também estrelam a produção), a narrativa posa como uma espécie de poema que se desenrola em inúmeros núcleos, assinalando o que significa viver e o que significa existir. É claro que encontrar uma sinopse para um projeto tão performático quanto este não é um trabalho fácil – e, talvez, esse arduidade seja um dos objetivos do que apenas podemos considerar como uma das maiores e melhores apresentações do ano, encontrando sucesso em elementos difíceis de serem trazidos aos palcos e em uma configuração simbiótica que nos envolve do começo ao fim.



Através de pouco mais de noventa minutos, os atores nos convidam a um pout-pourri cenográfico e artístico de tirar o fôlego. Logo ao entrar no Teatro Reynuncio Lima, o público é engolfado em um proposital caos em que cada um dos personagens realiza uma ação diferente, espalhando-se pelo local até que todos estejam prontos para uma profunda e enervante jornada. Não demora muito até que o enredo comece a tomar forma – explodindo em cores, sons e performances que mergulham de cabeça nas remodelações e nas transfigurações que a própria vida, impossível de ser atravessada em solidão.

Um dos aspectos que mais nos chamam a atenção é a forma como os temas delineados sequer pensam em tangenciar um didatismo cansativo. Afinal, não estamos lidando com uma palestra recheada de metáforas vencidas e de máximas novelescas, e sim com pulsões críticas que nos levam a desenterrar uma inebriante nostalgia que do que veio, do que há e do que virá. Todavia, nada nos é entregue de bandeja: dessa forma, as explicações existem em um âmbito mais intangível do que palpável, apostando fichas em construções cruas e viscerais que permeiam as histórias com uma violência nata do ser humano – entrando em conflito com a incessante busca pela empatia.

Em outras palavras, percebemos como a peça desmistifica ditos vencidos ao mostrar que o conceito de alteridade é justamente o que leva o ser humano a não saber em que direção seguir e a depositar suas frustrações e suas decepções em outrem – motivo pelo qual situações drásticas são narradas em cena. Ao longo dos blocos, temáticas que permanecem necessárias na conjuntura contemporânea ganham uma roupagem estilizada e que não parte de conjecturas conhecidas, mas sim utilizando o senso comum como forma de desmantelá-lo em construções mais densas e intrincadas.

Se o roteiro é fincado na renegação de uma cronologia como a conhecemos, as investidas técnicas fazem o máximo para materializar essa atemporalidade. De um lado, a sonoplastia de Trindad nos entranha em um microcosmos à parte, que traz referências como ‘Deus da Carnificina’ e ‘Édipo Rei’, passado por homenagens diretas a Pina Bausch e a ‘Paris Is Burning’; de outro, as épicas e instigantes coreografias partem de um irretocável trabalho em conjunto de Lilian Vilela, Laura Puche e Dante Morais – auxiliando a calcar o frenético ritmo que se apodera da produção e a garantir nossa total atenção ao espetáculo. Por fim, há uma dosagem certeira de drama e comédia que borra as fronteiras entre os gêneros e os amalgama em uma urgência quase antropológica.

A genialidade de Sete Verbos para Manter Corpo Viva está em cada uma das engrenagens, desde o título – que personifica o nome corpo em um organismo não apenas vivo, mas dotado de distinções que são encarnadas por artistas fabulosos. Um dos elementos de maior sucesso da obra, inclusive, é garantir que cada um dos 39 atores que permeiam o palco tenham seu momento de brilhar – movidos por monólogos perfurantes ou dominando o espaço com dinâmicas céleres. Eventualmente, a peça sagra-se uma das melhores de 2024, guiando os espectadores em um potente enredo que, com certeza, deixa marcas no momento em que as luzes se apagam e os aplausos irrompem.

Veja mais informações abaixo:

SERVIÇO
Teatro Reynuncio Lima (Instituto de Artes – Unesp)
Rua Jornalista Aloysio Biondi, s/n – Barra Funda – São Paulo, SP
De 18 de outubro a 10 de novembro
Sextas e sábados às 20h | Domingos às 18h*
Classificação Indicativa: 14 anos
Duração: 100 minutos
Gratuito
Reserva de ingressos on-line ou retirada 1 hora antes de cada sessão
*Não haverá espetáculo, especificamente, no domingo do dia 03/11

FICHA TÉCNICA
Direção: Fab Trindad e Marcella Vicentini
Preparação Corporal: Lilian Vilela, Laura Puche e Dante Morais
Direção Musical: Mau Machado
Preparação Vocal: Wânia Storolli e Isabella Bottan
Provocadores Cênicos: Dafne Michellepis e Daniel Gonzalez Alvarez
Dramaturgia: Criação Coletiva
Elenco: Alyce Luna, André Job, Anaí Cacilhas, Ariscia Yaari, Bea Pedroso, Beatriz
Petroni, Brenda Petronilho, Camilla Benitez, Carlinhos Domingos, Carol Medeiros,
Clara Toscano, Daniwel Trevo, Dante Morais, Emmanuelly Berbel, Flavia Mayumi,
Gian Vitor, Gustavo Nolla, Iça Simeão, Isabella Bottan, Júlia Merino, Karoline
Valença, Laura Aragão, Laura Puche, Lazuli Ansanelli, Letícia Karen, Lígia
Martarelli, Lu Sarrassini, Lulu (cachorro), Marcelo Tonini, Maria Eduarda Ferreira,
Matteo Lucca, Matheus Alves, Pedro Ludgi, Rafael Pira, Rafaela Gomes, Rafa
Jacomini, Rafa Cóssio, Victor Avlis, Thalita Navarro e Yasmin Moraes
Iluminação: Ton Ribeiro
Assistência e operação de iluminação: Mel Agripino, Pedro Alves, Thábs Sena e
Victor Costa
Sonoplastia: Fab Trindad
Operação de Som: Raquel Ramos, Luan Veraldi e Sassa Cauduro
Projeção de Vídeo: Fab Trindad e Abel De Espiritu Santo
Operação de Vídeo: Alex Castilho
Técnica: Dani Avilez
Cenotecnia: Ana Valim, AG d’Oliveira e Beatriz Souza
Produção: Alyce Luna, Beatriz Petroni, Camilla Benitez, Camilla Julie, Carol
Medeiros, Emmanuelly Berbel, Fab Trindade, Flávia Mayumi, Henrique Novarett,
Karoline Valença, Lazuli Ansanelli, Letícia Karen, Lígia Martarelli, Lilian Vilela, Luan
Veraldi, Marcella Vicentini, Matteo Lucca, Pedro Alves, Raquel Ramos, Thábs Sena
e Yasmin Moraes
Mídia: Carlinhos Domingos, Carol Medeiros, Karoline Valença e Victor Avlis
Design Gráfico: Victor Avlis
Bilheteria: Alexandre Ferreira, Beatriz Denoni e Vivian Deotti
Fotografia: Jenis Barcelar e Leonardo Saso
Agradecimentos: Dagoberto Feliz; Yuyachkani (Ana Correa, Augusto Casafranca);
Vanéssia Gomes; Rosanna Reátegui Nieto; Adryano Batista; corpo docente,
funcionários e equipe terceirizada do IA.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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Com direção de Fab Trindad e Marcella Vicentini e com roteiro realizado em conjunto com nada menos que 39 pessoas (que também estrelam a produção), a narrativa posa como uma espécie de poema que se desenrola em inúmeros núcleos, assinalando o que significa viver e o que significa existir. É claro que encontrar uma sinopse para um projeto tão performático quanto este não é um trabalho fácil – e, talvez, esse arduidade seja um dos objetivos do que apenas podemos considerar como uma das maiores e melhores apresentações do ano, encontrando sucesso em elementos difíceis de serem trazidos aos palcos e em uma configuração simbiótica que nos envolve do começo ao fim.

Através de pouco mais de noventa minutos, os atores nos convidam a um pout-pourri cenográfico e artístico de tirar o fôlego. Logo ao entrar no Teatro Reynuncio Lima, o público é engolfado em um proposital caos em que cada um dos personagens realiza uma ação diferente, espalhando-se pelo local até que todos estejam prontos para uma profunda e enervante jornada. Não demora muito até que o enredo comece a tomar forma – explodindo em cores, sons e performances que mergulham de cabeça nas remodelações e nas transfigurações que a própria vida, impossível de ser atravessada em solidão.

Um dos aspectos que mais nos chamam a atenção é a forma como os temas delineados sequer pensam em tangenciar um didatismo cansativo. Afinal, não estamos lidando com uma palestra recheada de metáforas vencidas e de máximas novelescas, e sim com pulsões críticas que nos levam a desenterrar uma inebriante nostalgia que do que veio, do que há e do que virá. Todavia, nada nos é entregue de bandeja: dessa forma, as explicações existem em um âmbito mais intangível do que palpável, apostando fichas em construções cruas e viscerais que permeiam as histórias com uma violência nata do ser humano – entrando em conflito com a incessante busca pela empatia.

Em outras palavras, percebemos como a peça desmistifica ditos vencidos ao mostrar que o conceito de alteridade é justamente o que leva o ser humano a não saber em que direção seguir e a depositar suas frustrações e suas decepções em outrem – motivo pelo qual situações drásticas são narradas em cena. Ao longo dos blocos, temáticas que permanecem necessárias na conjuntura contemporânea ganham uma roupagem estilizada e que não parte de conjecturas conhecidas, mas sim utilizando o senso comum como forma de desmantelá-lo em construções mais densas e intrincadas.

Se o roteiro é fincado na renegação de uma cronologia como a conhecemos, as investidas técnicas fazem o máximo para materializar essa atemporalidade. De um lado, a sonoplastia de Trindad nos entranha em um microcosmos à parte, que traz referências como ‘Deus da Carnificina’ e ‘Édipo Rei’, passado por homenagens diretas a Pina Bausch e a ‘Paris Is Burning’; de outro, as épicas e instigantes coreografias partem de um irretocável trabalho em conjunto de Lilian Vilela, Laura Puche e Dante Morais – auxiliando a calcar o frenético ritmo que se apodera da produção e a garantir nossa total atenção ao espetáculo. Por fim, há uma dosagem certeira de drama e comédia que borra as fronteiras entre os gêneros e os amalgama em uma urgência quase antropológica.

A genialidade de Sete Verbos para Manter Corpo Viva está em cada uma das engrenagens, desde o título – que personifica o nome corpo em um organismo não apenas vivo, mas dotado de distinções que são encarnadas por artistas fabulosos. Um dos elementos de maior sucesso da obra, inclusive, é garantir que cada um dos 39 atores que permeiam o palco tenham seu momento de brilhar – movidos por monólogos perfurantes ou dominando o espaço com dinâmicas céleres. Eventualmente, a peça sagra-se uma das melhores de 2024, guiando os espectadores em um potente enredo que, com certeza, deixa marcas no momento em que as luzes se apagam e os aplausos irrompem.

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Teatro Reynuncio Lima (Instituto de Artes – Unesp)
Rua Jornalista Aloysio Biondi, s/n – Barra Funda – São Paulo, SP
De 18 de outubro a 10 de novembro
Sextas e sábados às 20h | Domingos às 18h*
Classificação Indicativa: 14 anos
Duração: 100 minutos
Gratuito
Reserva de ingressos on-line ou retirada 1 hora antes de cada sessão
*Não haverá espetáculo, especificamente, no domingo do dia 03/11

FICHA TÉCNICA
Direção: Fab Trindad e Marcella Vicentini
Preparação Corporal: Lilian Vilela, Laura Puche e Dante Morais
Direção Musical: Mau Machado
Preparação Vocal: Wânia Storolli e Isabella Bottan
Provocadores Cênicos: Dafne Michellepis e Daniel Gonzalez Alvarez
Dramaturgia: Criação Coletiva
Elenco: Alyce Luna, André Job, Anaí Cacilhas, Ariscia Yaari, Bea Pedroso, Beatriz
Petroni, Brenda Petronilho, Camilla Benitez, Carlinhos Domingos, Carol Medeiros,
Clara Toscano, Daniwel Trevo, Dante Morais, Emmanuelly Berbel, Flavia Mayumi,
Gian Vitor, Gustavo Nolla, Iça Simeão, Isabella Bottan, Júlia Merino, Karoline
Valença, Laura Aragão, Laura Puche, Lazuli Ansanelli, Letícia Karen, Lígia
Martarelli, Lu Sarrassini, Lulu (cachorro), Marcelo Tonini, Maria Eduarda Ferreira,
Matteo Lucca, Matheus Alves, Pedro Ludgi, Rafael Pira, Rafaela Gomes, Rafa
Jacomini, Rafa Cóssio, Victor Avlis, Thalita Navarro e Yasmin Moraes
Iluminação: Ton Ribeiro
Assistência e operação de iluminação: Mel Agripino, Pedro Alves, Thábs Sena e
Victor Costa
Sonoplastia: Fab Trindad
Operação de Som: Raquel Ramos, Luan Veraldi e Sassa Cauduro
Projeção de Vídeo: Fab Trindad e Abel De Espiritu Santo
Operação de Vídeo: Alex Castilho
Técnica: Dani Avilez
Cenotecnia: Ana Valim, AG d’Oliveira e Beatriz Souza
Produção: Alyce Luna, Beatriz Petroni, Camilla Benitez, Camilla Julie, Carol
Medeiros, Emmanuelly Berbel, Fab Trindade, Flávia Mayumi, Henrique Novarett,
Karoline Valença, Lazuli Ansanelli, Letícia Karen, Lígia Martarelli, Lilian Vilela, Luan
Veraldi, Marcella Vicentini, Matteo Lucca, Pedro Alves, Raquel Ramos, Thábs Sena
e Yasmin Moraes
Mídia: Carlinhos Domingos, Carol Medeiros, Karoline Valença e Victor Avlis
Design Gráfico: Victor Avlis
Bilheteria: Alexandre Ferreira, Beatriz Denoni e Vivian Deotti
Fotografia: Jenis Barcelar e Leonardo Saso
Agradecimentos: Dagoberto Feliz; Yuyachkani (Ana Correa, Augusto Casafranca);
Vanéssia Gomes; Rosanna Reátegui Nieto; Adryano Batista; corpo docente,
funcionários e equipe terceirizada do IA.

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Thiago Nollahttps://www.editoraviseu.com.br/a-pedra-negra-prod.html
Em contato com as artes em geral desde muito cedo, Thiago Nolla é jornalista, escritor e drag queen nas horas vagas. Trabalha com cultura pop desde 2015 e é uma enciclopédia ambulante sobre divas pop (principalmente sobre suas musas, Lady Gaga e Beyoncé). Ele também é apaixonado por vinho, literatura e jogar conversa fora.

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