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Crítica | Soundtrack – filme brasileiro é cinema de pompa e selo de qualidade internacional


A Insustentável Leveza do Não Ser

Longe de ser atrativo para todos os gostos, ou vendável para as massas, Soundtrack é uma investida do cinema nacional com cara de produção internacional renomada. Falado em inglês na maior parte de sua projeção, o longa acompanha os passos do brasileiro Cris (Selton Mello), um fotógrafo que viaja para uma estação de pesquisa polar com o propósito de um projeto único e desafiador.

O introspectivo protagonista, que intensamente busca o isolamento do mundo (ele não levou qualquer equipamento para a comunicação exterior, vide computador ou celular, como revela em determinado momento), é um novo passo na carreira de Selton Mello. O ator abraça o personagem e lhe dá as boas vindas, aos poucos se assentando na pele de Cris, pronto para entregar um desempenho memorável, sutil, porém, com bastante fervor e força equilibrando.



Seus anfitriões no local são outros quatro homens, com os quais precisará dividir não apenas a hospedagem, mas relações de confiança e intimidade como talvez nunca antes em sua vida. Mark, vivido pelo ótimo Ralph Ineson (o patriarca do notável A Bruxa), é seu contato direto e com quem irá conviver no alojamento. Um britânico de personalidade forte, que talvez já tenha passado mais tempo do que deveria no local. Com um filho por nascer, o sujeito trabalha num projeto científico envolvendo balões meteorológicos, que precisam ser lançados diariamente.

Fora Mark, o local conta com o líder da equipe, o asiático Huang (Thomas Chaanhing), o médico dinamarquês Rafnar (Lukas Loughan) e outro conterrâneo, o botânico Cao (Seu Jorge). Com estes desconhecidos, Cris irá compartilhar questões existenciais, alegrias, sofrimento e tragédias, nesta aventura extrema e desafiadora da vida humana. No entanto, não deixe que esta sinopse em algum momento o iluda. Este é essencialmente um drama adulto, com ritmo deliberadamente lento, como a maioria dos filmes feitos fora de Hollywood.

O roteiro e direção de Soundtrack são assinados pela dupla Manitou Felipe e Bernardo Moura, conhecidos pela alcunha 300ml. Os cineastas acertam em cheio o clima claustrofóbico e criam boas interações humanas entre os personagens. Também saem de forma bem resolvida dos conflitos criados com esmero na trama, como o momento em que Cris enfrenta a morte. O melhor do trabalho da dupla estreante é desenvolver um longa bem estruturado, sério e de conteúdo, sem apelar recaindo na pretensão do pseudointelectualismo. Apesar de poder ser encaixado como cinema de arte, Soundtrack não é enfadonho ou pretensioso, acessível e compreensível a todo público.

Além dos temas oferecidos claramente, Soundtrack ainda reserva discussões nas entrelinhas. Uma das mais interessantes é no âmbito profissional, aonde através de alguns diálogos, 300ml apresenta o embate dos profissionais que se autointitulam donos de trabalhos mais importantes, sendo eles cientistas, menosprezando e falhando em compreender o investimento de profissionais como Cris, antes da conclusão e relevância. Artistas como  300ml e sua criação fictícia se mostram espelhos um do outro e suas obras, intencionalmente mescladas, importantes passos em suas respectivas áreas.

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Pablo R. Bazarello
Crítico, cinéfilo dos anos 80, membro da ACCRJ, natural do Rio de Janeiro. Apaixonado por cinema e tudo relacionado aos anos 80 e 90. Cinema é a maior diversão. A arte é o que faz a vida valer a pena. 15 anos na estrada do CinePOP e contando...
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