sábado , 16 novembro , 2024

Crítica | The Politician se ofusca na 2ª temporada

Durante os sete primeiros episódios da temporada inicial de The Politician, acompanhamos Payton (Ben Platt) disputando a presidência do Grêmio Estudantil de seu colégio em uma narrativa que funcionou como uma espécie de estufa para o que a série provavelmente investigaria mais a fundo em seus anos seguintes. A ideia era tratar, de uma forma irônica e espirituosa que reúne o melhor em potencial do trio Ryan Murphy, Ian Brennan e Brad Falchuk, dos caminhos tortuosos que levam ao poder. Além disso, era também abordar o interesse do jovem na política durante a atual conjuntura, sob a ótica de um protagonista cujo grande desafio é a sua própria jornada de autodescoberta e aceitação enquanto, de fato, um homem ambicioso. O episódio 8 daquele primeiro ano dá um salto para o futuro e promete uma temporada 2 ainda mais veloz e empolgante, dando a ideia de que a primeira temporada talvez tivesse sido apenas um preparatório.

Infelizmente, aquele 8º episódio promete algo maior e melhor do que a segunda temporada consegue de fato entregar. 

Neste novo ano, estamos um mês adentro da campanha de Payton para Senador de Nova York, um cargo que foi ocupado por Dede Standish (Judith Light) por três décadas e, agora, vê um novo pretendente. Ele está perdendo por 10 pontos nas pesquisas, e sua campanha é coordenada por Alice (Julia Schlaepfer), McAfee (Laura Dreyfuss), Skye (Rahne Jones), James (Theo Germaine) e (inexplicavelmente) Astrid (Lucy Boynton), um grupo que permanece em sua maioria escanteado durante boa parte da temporada, embora tivesse muito a oferecer. Eles decidem adotar uma estratégia que pode atrair a atenção de jovens eleitores, baseando a campanha na luta contra a mudança climática, algo que pode ou não ser do interesse real de Payton. 



O tema abre espaço para um debate bastante pertinente em tempos de Greta Thunberg, mas a série nunca vai além da superfície ao abordar a luta da Geração Z a favor do clima. É como se ela ficasse no meio do caminho entre realmente acreditar na causa ou querer ironizar a superficialidade de ações como banir canudos de plástico, e a abordagem inteira soa desconfortável e obsoleta. O único episódio que faz uma tentativa honesta de aprofundar o assunto com seriedade o faz através do conflito de gerações entre uma mãe e sua filha, o que nos dá prazerosas cenas com Robin Weigert mas entrega ainda assim um resultado simplista em sua mensagem pró-diálogo entre membros da família que acreditam em projetos políticos diferentes. A única conclusão é: ‘bem, talvez exista um meio termo e seja possível conviver em paz com seu sobrinho que votou no outro candidato’, uma conclusão pouco eficaz em uma série cujo público alvo é exatamente este sobrinho, e não o tio. 

Esta incongruência entre acreditar na causa e querer fazer piada com ela é algo que se estende para a narrativa principal da série e faz o trabalho de Ben Platt como Payton muito mais difícil do que provavelmente deveria. Payton é ao mesmo tempo alguém de quem todos que estão à sua volta gostam bastante, mas a série nunca se preocupa em dizer o porquê. Ele é raso e cego para seus próprios privilégios, e embora esta fosse a piada na primeira temporada, aqui é como se os roteiristas não soubessem mais como lidar com ele. Ela quer que acreditemos em sua humanidade e tenhamos simpatia por sua jornada, ao mesmo tempo em que nos lembra constantemente, com a própria sequência de abertura, que ele é um autômato movido a pouco mais do que apenas ambição. Algumas vezes seu egoísmo é a piada, e em outras ocasiões a sensação que fica é de que a série realmente acredita no altruísmo do personagem. Ela nunca encontrou uma forma adequada ilustrar o que sente por Payton, e o fato de Murphy não ter dirigido nenhum episódio desta temporada, e ser apenas coautor première, talvez seja uma pista dos motivos por que Hobart soa ainda mais inadequado. Se um dos grandes problemas da primeira temporada era a série se perder entre a ironia e o reforço cego de alguns de seus pontos de vista, o caso aqui só piora. 

O que a temporada traz de melhor está em seu elenco, com Judith Light e Bette Midler mais enérgicas e ativas que todo o elenco jovem. Ali, existe uma narrativa muito interessante e proveitosa, mas que jamais chegou a ser explorada com a profundidade que deveria. Dede Standish e Hadassah Gold (Midler) são duas das personagens mais críveis da temporada, e ali escondida está uma metáfora poderosa sobre a importância da experiência, a sabedoria da prática e o valor de olharmos para trás e entendermos que grandes líderes que vieram de gerações anteriores pavimentaram o caminho para que transformações possam continuar ocorrendo no presente e no futuro. Os episódios nunca tratam as personagens com condescendência, e a naturalidade com que aborda a sexualidade de pessoas mais velhas — e naturalidade aqui na medida do possível tratando-se de uma sátira dos criadores de Glee — mostra não apenas reverência mas uma maturidade que poderia ter sido melhor utilizada se estendida para outras partes da história. 

O que realmente não cai bem com esta segunda temporada de The Politician é como ela repete os mesmos temas que a primeira, porém com menos entusiasmo e sem o carnaval de cores e diálogos afiados que são a assinatura do prolífico showrunner. O mesmo Payton que estava em busca de seu “verdadeiro eu” na primeira temporada continua em busca do seu “verdadeiro eu” na segunda temporada, o que em termos de evolução de personagem nos deixa com pouco material para compreendê-lo. Politicamente, o que a série está dizendo soa deslocado da realidade e é uma mensagem que chega, talvez, dois anos atrasada. A investigação do interesse da juventude pela vida política aqui vai pouco além de “jovens se interessam, mas não votam e abraçam causas superficialmente”, enquanto o que acontece na realidade é muito mais complexo e dinâmico do que a série sequer tenta abraçar. Soa como uma geração mais velha tentando racionalizar os Zoomers sob óticas antiquadas, com simplificações excessivas que são transigentes e preguiçosas — como uma metáfora simples demais, que tenta resumir o todo quando leu apenas uma parte do material de base.

É uma pena a série deixar Laura Dreyfuss tão de lado, e praticamente esquecer que escalou a ótima Jackie Hoffman para interpretar a secretária de Hadassah. A forma como grande parte do elenco de apoio é ofuscada em favor de uma repetição perturbadora da palavra “trisal” — é para ser engraçado? desconfortável? absurdo? — tira de campo exatamente os desenvolvimentos paralelos que teriam enriquecido a forma como a série tenta abordar o interesse político como uma crítica ao revanchismo e à imaterialidade dos discursos de campanha. Aliás, é estranho o fato de personagens LGBTQ+ serem os mais escanteados enquanto relações poliamorosas são alardeadas em cada canto dos quatro primeiros episódios.

Por isso, a segunda temporada deThe Politician parece uma reprise menos entusiasmada da primeira, indecisa entre querer tratar das decisões pessoais de seu protagonista através da lente da política ou o inverso. Ela tenta ser mais séria, mas teria sido melhor se tivesse continuado brincando. Para uma temporada que estreia em ano de eleição nos Estados Unidos, sua falta do que falar a torna esquecível.

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Laysa Zanettihttps://cinepop.com.br
Repórter, Crítica de Cinema e TV formada em Twin Peaks, Fringe, The Leftovers e The Americans. Já vi Laranja Mecânica mais vezes que você e defendo o final de Lost.

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Infelizmente, aquele 8º episódio promete algo maior e melhor do que a segunda temporada consegue de fato entregar. 

Neste novo ano, estamos um mês adentro da campanha de Payton para Senador de Nova York, um cargo que foi ocupado por Dede Standish (Judith Light) por três décadas e, agora, vê um novo pretendente. Ele está perdendo por 10 pontos nas pesquisas, e sua campanha é coordenada por Alice (Julia Schlaepfer), McAfee (Laura Dreyfuss), Skye (Rahne Jones), James (Theo Germaine) e (inexplicavelmente) Astrid (Lucy Boynton), um grupo que permanece em sua maioria escanteado durante boa parte da temporada, embora tivesse muito a oferecer. Eles decidem adotar uma estratégia que pode atrair a atenção de jovens eleitores, baseando a campanha na luta contra a mudança climática, algo que pode ou não ser do interesse real de Payton. 

O tema abre espaço para um debate bastante pertinente em tempos de Greta Thunberg, mas a série nunca vai além da superfície ao abordar a luta da Geração Z a favor do clima. É como se ela ficasse no meio do caminho entre realmente acreditar na causa ou querer ironizar a superficialidade de ações como banir canudos de plástico, e a abordagem inteira soa desconfortável e obsoleta. O único episódio que faz uma tentativa honesta de aprofundar o assunto com seriedade o faz através do conflito de gerações entre uma mãe e sua filha, o que nos dá prazerosas cenas com Robin Weigert mas entrega ainda assim um resultado simplista em sua mensagem pró-diálogo entre membros da família que acreditam em projetos políticos diferentes. A única conclusão é: ‘bem, talvez exista um meio termo e seja possível conviver em paz com seu sobrinho que votou no outro candidato’, uma conclusão pouco eficaz em uma série cujo público alvo é exatamente este sobrinho, e não o tio. 

Esta incongruência entre acreditar na causa e querer fazer piada com ela é algo que se estende para a narrativa principal da série e faz o trabalho de Ben Platt como Payton muito mais difícil do que provavelmente deveria. Payton é ao mesmo tempo alguém de quem todos que estão à sua volta gostam bastante, mas a série nunca se preocupa em dizer o porquê. Ele é raso e cego para seus próprios privilégios, e embora esta fosse a piada na primeira temporada, aqui é como se os roteiristas não soubessem mais como lidar com ele. Ela quer que acreditemos em sua humanidade e tenhamos simpatia por sua jornada, ao mesmo tempo em que nos lembra constantemente, com a própria sequência de abertura, que ele é um autômato movido a pouco mais do que apenas ambição. Algumas vezes seu egoísmo é a piada, e em outras ocasiões a sensação que fica é de que a série realmente acredita no altruísmo do personagem. Ela nunca encontrou uma forma adequada ilustrar o que sente por Payton, e o fato de Murphy não ter dirigido nenhum episódio desta temporada, e ser apenas coautor première, talvez seja uma pista dos motivos por que Hobart soa ainda mais inadequado. Se um dos grandes problemas da primeira temporada era a série se perder entre a ironia e o reforço cego de alguns de seus pontos de vista, o caso aqui só piora. 

O que a temporada traz de melhor está em seu elenco, com Judith Light e Bette Midler mais enérgicas e ativas que todo o elenco jovem. Ali, existe uma narrativa muito interessante e proveitosa, mas que jamais chegou a ser explorada com a profundidade que deveria. Dede Standish e Hadassah Gold (Midler) são duas das personagens mais críveis da temporada, e ali escondida está uma metáfora poderosa sobre a importância da experiência, a sabedoria da prática e o valor de olharmos para trás e entendermos que grandes líderes que vieram de gerações anteriores pavimentaram o caminho para que transformações possam continuar ocorrendo no presente e no futuro. Os episódios nunca tratam as personagens com condescendência, e a naturalidade com que aborda a sexualidade de pessoas mais velhas — e naturalidade aqui na medida do possível tratando-se de uma sátira dos criadores de Glee — mostra não apenas reverência mas uma maturidade que poderia ter sido melhor utilizada se estendida para outras partes da história. 

O que realmente não cai bem com esta segunda temporada de The Politician é como ela repete os mesmos temas que a primeira, porém com menos entusiasmo e sem o carnaval de cores e diálogos afiados que são a assinatura do prolífico showrunner. O mesmo Payton que estava em busca de seu “verdadeiro eu” na primeira temporada continua em busca do seu “verdadeiro eu” na segunda temporada, o que em termos de evolução de personagem nos deixa com pouco material para compreendê-lo. Politicamente, o que a série está dizendo soa deslocado da realidade e é uma mensagem que chega, talvez, dois anos atrasada. A investigação do interesse da juventude pela vida política aqui vai pouco além de “jovens se interessam, mas não votam e abraçam causas superficialmente”, enquanto o que acontece na realidade é muito mais complexo e dinâmico do que a série sequer tenta abraçar. Soa como uma geração mais velha tentando racionalizar os Zoomers sob óticas antiquadas, com simplificações excessivas que são transigentes e preguiçosas — como uma metáfora simples demais, que tenta resumir o todo quando leu apenas uma parte do material de base.

É uma pena a série deixar Laura Dreyfuss tão de lado, e praticamente esquecer que escalou a ótima Jackie Hoffman para interpretar a secretária de Hadassah. A forma como grande parte do elenco de apoio é ofuscada em favor de uma repetição perturbadora da palavra “trisal” — é para ser engraçado? desconfortável? absurdo? — tira de campo exatamente os desenvolvimentos paralelos que teriam enriquecido a forma como a série tenta abordar o interesse político como uma crítica ao revanchismo e à imaterialidade dos discursos de campanha. Aliás, é estranho o fato de personagens LGBTQ+ serem os mais escanteados enquanto relações poliamorosas são alardeadas em cada canto dos quatro primeiros episódios.

Por isso, a segunda temporada deThe Politician parece uma reprise menos entusiasmada da primeira, indecisa entre querer tratar das decisões pessoais de seu protagonista através da lente da política ou o inverso. Ela tenta ser mais séria, mas teria sido melhor se tivesse continuado brincando. Para uma temporada que estreia em ano de eleição nos Estados Unidos, sua falta do que falar a torna esquecível.

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Repórter, Crítica de Cinema e TV formada em Twin Peaks, Fringe, The Leftovers e The Americans. Já vi Laranja Mecânica mais vezes que você e defendo o final de Lost.

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