quinta-feira , 26 dezembro , 2024

Crítica TIFF | Uncut Gems – Adam Sandler caminha para o Oscar em filme insano

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Filme Assistido durante o Festival de Toronto 2019

O silêncio das tradições religiosas do Yom Kipur se perde em uma disrupção sonora ensurdecedora. Intensidade a plenos pulmões, gritaria e confusão se mesclam em diálogos inaudíveis de tão caóticos, mas completamente compreensíveis dados ao seu contexto. Em uma Nova York barulhenta, transações financeiras, o mundo das apostas e a velocidade em absolutamente tudo ditam o ritmo de mais uma narrativa completamente autoral. Uncut Gems é exatamente como seu próprio título: uma joia bruta, grosseira e hipnotizante que nos leva aos picos mais intensos de um Adam Sandler para o qual nenhum de nós estávamos preparados. E é exatamente por seu fator surpresa que o novo drama dos Irmãos Safdie é uma das melhores coisas que o cinema nos proporcionou em 2019.



Se há o selo da produtora A24, paira também uma serenidade em relação ao que está por vir. Como a galinha dos ovos de ouro, o pequeno estúdio começou sua jornada timidamente em 2012, com seu primeiro filme distribuído sendo As Loucuras de Charlie, em 2013. Desde então, a empresa já acumulou 25 indicações ao Oscar, com várias vitórias em seu currículo. Em 2019, ela veio disposta a novamente tomar os holofotes para si, entregando o aclamado O Farol, o inesperado e estarrecedor drama familiar Waves e, obviamente, Uncut Gems. E com Martin Scorsese como um dos produtores, estava formada a combinação cinematográfica mais inimaginável, que jamais soubemos que precisávamos: Sandler-Scorsese.

O aroma de Scorsese permeia Uncut Gems com leveza, deixando sua marca sem comprometer a autenticidade e originalidade que os Irmãos Safdie sustentam à sua maneira. Como um cineasta que emana suas raízes de Little Italy em praticamente tudo que produz, ele traz um pouco da essência vigarista do universo da agiotagem e das máfias contemporâneas, orbitando ao redor de uma trama onde o vício por jogatina e apostas rege os tumultos do nosso protagonista. Neste contexto, Sandler é Howard Ratner, um joalheiro trambiqueiro, que dá nó no vento e não sabe administrar sua vida, deixando que seus vícios pautem uma exaustiva rotina que gira em torno de escapes sorrateiros, desvio de dinheiro, apostas descabidas e negociações histéricas.

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E com a histeria plena sendo o termômetro da intensidade da narrativa, Uncut Gems se torna uma experiência sinestésica alucinante, como se a audiência fosse absorvida pela intensa corrente sanguínea de uma figura que aparenta respirar pela pele, tamanha voracidade. Entre uma direção ágil e agitada, que opera em cortes secos e aceleração de imagens, e constantes diálogos amontoados e incompletos, a produção é uma descarga elétrica compulsiva, que nos leva a percorrer os dissabores de uma vida admirável, porém frágil, de um homem que não teme a morte, embora confronte ela a cada esquina em que se encontra. E aqui, Sandler entrega uma atuação que mescla Joe Pesci com Robert DeNiro em Touro Indomável, se tornando um equilíbrio impecável entre o caos e a sofreguidão.

Intenso e unapologetic, o ator – mais conhecido por suas extensas comédias de humor duvidoso e que geralmente são os prazeres culposos de metade dos cinéfilos – apresenta um lado seu até então inexistente. Com boca suja e com uma certa sexualidade aflorada, ele é o avesso de todas as suas caracterizações caricatas e é um banquete impressionante do que uma boa atuação precisa ter. De maneira surpreendente, Adam Sandler arrebata o público com seu jeitão de judeu nada ortodoxo e leva a audiência ao delírio a cada escapada que – milagrosamente – ele consegue dar. Sob uma trilha sonora que faz do synthpop um constante alerta de possíveis ataques cardíacos, passeamos por Uncut Gems sentindo as vibrações do corpo do ator, ficamos aflitos em virtude das consequências de seus atos incoerentes e nos entregamos à trama afoitos para que Ratner encontre aquela versão melhor e mais sadia de si mesmo. Ao seu lado, LaKeith Stanfield entrega mais uma bela atuação, sendo um coadjuvante que sabe brilhar em seus momentos de destaque, nos lembrando porque seu rosto é sempre tão cotado no cinema independente.

E como era de se imaginar, os Irmãos Safdie estendem suas surpresas até o último fôlego de vida da produção, com aquela direção insana e precisa que é capaz de promover todas as sensações citadas. Construindo uma trama que promete um encerramento mais acalentador, Uncut Gems é de fato aquela promessa não cumprida, para o deleite de um bom cinéfilo. Inesperado, o seu final foge às regras de apego afetivo, entregando um desfecho surpreendente e coerente, que segue à risca o mesmo grau de intensidade de todo o seu clímax. Ao som de um intenso synthpop, que não cede nem nos momentos de maior calmaria do filme, o drama produzido por Martin Scorsese é a garantia de que aquele Adam Sandler que um dia sonhamos conhecer é real e oficial. Aleluia!

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Se há o selo da produtora A24, paira também uma serenidade em relação ao que está por vir. Como a galinha dos ovos de ouro, o pequeno estúdio começou sua jornada timidamente em 2012, com seu primeiro filme distribuído sendo As Loucuras de Charlie, em 2013. Desde então, a empresa já acumulou 25 indicações ao Oscar, com várias vitórias em seu currículo. Em 2019, ela veio disposta a novamente tomar os holofotes para si, entregando o aclamado O Farol, o inesperado e estarrecedor drama familiar Waves e, obviamente, Uncut Gems. E com Martin Scorsese como um dos produtores, estava formada a combinação cinematográfica mais inimaginável, que jamais soubemos que precisávamos: Sandler-Scorsese.

O aroma de Scorsese permeia Uncut Gems com leveza, deixando sua marca sem comprometer a autenticidade e originalidade que os Irmãos Safdie sustentam à sua maneira. Como um cineasta que emana suas raízes de Little Italy em praticamente tudo que produz, ele traz um pouco da essência vigarista do universo da agiotagem e das máfias contemporâneas, orbitando ao redor de uma trama onde o vício por jogatina e apostas rege os tumultos do nosso protagonista. Neste contexto, Sandler é Howard Ratner, um joalheiro trambiqueiro, que dá nó no vento e não sabe administrar sua vida, deixando que seus vícios pautem uma exaustiva rotina que gira em torno de escapes sorrateiros, desvio de dinheiro, apostas descabidas e negociações histéricas.

E com a histeria plena sendo o termômetro da intensidade da narrativa, Uncut Gems se torna uma experiência sinestésica alucinante, como se a audiência fosse absorvida pela intensa corrente sanguínea de uma figura que aparenta respirar pela pele, tamanha voracidade. Entre uma direção ágil e agitada, que opera em cortes secos e aceleração de imagens, e constantes diálogos amontoados e incompletos, a produção é uma descarga elétrica compulsiva, que nos leva a percorrer os dissabores de uma vida admirável, porém frágil, de um homem que não teme a morte, embora confronte ela a cada esquina em que se encontra. E aqui, Sandler entrega uma atuação que mescla Joe Pesci com Robert DeNiro em Touro Indomável, se tornando um equilíbrio impecável entre o caos e a sofreguidão.

Intenso e unapologetic, o ator – mais conhecido por suas extensas comédias de humor duvidoso e que geralmente são os prazeres culposos de metade dos cinéfilos – apresenta um lado seu até então inexistente. Com boca suja e com uma certa sexualidade aflorada, ele é o avesso de todas as suas caracterizações caricatas e é um banquete impressionante do que uma boa atuação precisa ter. De maneira surpreendente, Adam Sandler arrebata o público com seu jeitão de judeu nada ortodoxo e leva a audiência ao delírio a cada escapada que – milagrosamente – ele consegue dar. Sob uma trilha sonora que faz do synthpop um constante alerta de possíveis ataques cardíacos, passeamos por Uncut Gems sentindo as vibrações do corpo do ator, ficamos aflitos em virtude das consequências de seus atos incoerentes e nos entregamos à trama afoitos para que Ratner encontre aquela versão melhor e mais sadia de si mesmo. Ao seu lado, LaKeith Stanfield entrega mais uma bela atuação, sendo um coadjuvante que sabe brilhar em seus momentos de destaque, nos lembrando porque seu rosto é sempre tão cotado no cinema independente.

E como era de se imaginar, os Irmãos Safdie estendem suas surpresas até o último fôlego de vida da produção, com aquela direção insana e precisa que é capaz de promover todas as sensações citadas. Construindo uma trama que promete um encerramento mais acalentador, Uncut Gems é de fato aquela promessa não cumprida, para o deleite de um bom cinéfilo. Inesperado, o seu final foge às regras de apego afetivo, entregando um desfecho surpreendente e coerente, que segue à risca o mesmo grau de intensidade de todo o seu clímax. Ao som de um intenso synthpop, que não cede nem nos momentos de maior calmaria do filme, o drama produzido por Martin Scorsese é a garantia de que aquele Adam Sandler que um dia sonhamos conhecer é real e oficial. Aleluia!

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